Nascimento e morte a maior das contradições. Comemora-se o nascimento de Cristo e a morte do ano que se vai. Celebram-se as compras e o aumento do seu índice, como um bom indicador da economia, ao mesmo tempo em que se deseja um consumo, menos irresponsável com quinquilharias que servem mais para poluir e encher os lixões, que satisfazer necessidades.
Sonha-se com um ano pródigo em boas notícias sabendo que a vida é feita de luta, onde vitórias e derrotas são meras conseqüências.
Solidariedade aparece nos sentimentos, mas a disputa por maiores vendas, luxo e poder continuam a repartir os espaços, porque ninguém muda o seu jeito de ser, pelo simples fato de ser Natal. A hipocrisia talvez aumente, mas não em proporção diferente à gorjeta que de forma indiferente deixamos para o lixeiro ou entregamos aos porteiros.
Porque nesta época, ou só nela, procura-se a miséria e os miseráveis para dardes de comer e de vestir, quando há outros tantos dias aguardando benevolência semelhante? A contradição não está na procura e sim na exclusividade da época.
Por que nos reunimos, se o que muitas vezes o que desejamos é nos aproximar de quem, pelo menos fisicamente, já não se faz presente?
Não são poucos os que reclamam da ansiedade com que certas pessoas vão às ruas sem saber por quê e nem para quê e que acabam por repetir, de forma quase autômata, gesto idêntico?
Por que procuramos a miséria longe, quando perto, ela lhe acena sem que você se aperceba? Miséria vista nas suas mais diferentes formas, desde a mais conhecida e evidenciada nesta época, como a da falta de pão ou, sob sintomas menos identificável como a da falta de carinho e consideração, quase sempre escondidos no fundo d’alma, escamoteadas nas compras e nos preparos das comidas e bebidas para a farta ceia vazia de significados e sentimentos.
Nesta época gosto do significado do balanço, sem a simples interpretação dos saldos, mas dos ganhos e perdas em todos os sentidos. O que efetivamente teve sentido no ano prestes a passar? Sentido amplo de resultados que ficam, que reproduzem, que fazem bem e não àqueles que aumentam as poupanças nas mesmas proporções das preocupações.
Aqui mais um paradoxo: se o que vale a pena, não cabe numa simples operação aritmética, porque não vivemos a somar significados, a multiplicar apoios, a diminuir as vaidades e as superficialidades e a dividir o pão nosso de cada dia? A contradição se amplia quando se verifica, que mais uma vez, só nos fazemos estas perguntas nesta época do ano.
A vida é simples e seu significado complexo. Descobrimos isso, ao ver que os verdadeiros religiosos são ateus ou agnósticos, que não vivem a comprar, um lugar no céu porque não acreditam nele, e só fazem o que fazem, pelo simples e significativo gesto de amor à humanidade.
Imagino que por conta destas coisas, o poeta pediu, que parassem o mundo para ele descer. Não sou poeta, mas também guardo este desejo. Porém, se já percebemos que não é possível parar o mundo, que paremos a nós mesmos, para pensar e lembrar que a Vida é simples e assim devíamos vivê-la. Peço desculpas, se eventualmente atrapalho o seu sentimento de festa, porque na verdade, aqui escrevo para você, como se comigo conversasse como amigo. Feliz Natal!
65 anos, professor titular "sênior" do IFF (ex-CEFET-Campos, RJ) e engenheiro. Pesquisador atuante nos temas: Capitalismo de Plataformas; Espaço-Economia e Financeirização no Capitalismo Contemporâneo; Circuito Econômico Petróleo-Porto; Geopolítica da Energia. Membro da Rede Latinoamericana de Investigadores em Espaço-Economia: Geografia Econômica e Economia Política (ReLAEE). Espaço para apresentar e debater questões e opiniões sobre política e economia. Blog criado em 10 agosto de 2004.
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