65 anos, professor titular "sênior" do IFF (ex-CEFET-Campos, RJ) e engenheiro. Pesquisador atuante nos temas: Capitalismo de Plataformas; Espaço-Economia e Financeirização no Capitalismo Contemporâneo; Circuito Econômico Petróleo-Porto; Geopolítica da Energia. Membro da Rede Latinoamericana de Investigadores em Espaço-Economia: Geografia Econômica e Economia Política (ReLAEE). Espaço para apresentar e debater questões e opiniões sobre política e economia. Blog criado em 10 agosto de 2004.
quarta-feira, junho 11, 2008
O que é uma cidade?
O texto abaixo é de um artigo publicado pelo blogueiro há quase cinco anos no jornal Folha da Manhã. A aproximação de mais uma eleição municipal talvez sirva como reflexão.
O que é uma cidade?
O que é uma cidade? Por que e para que ela existe? O francês Jacques Lê Goff em seu livro “Por amor às cidades” diz que as funções essenciais de uma cidade são a troca, a informação, a vida cultural e o poder. Bela conceituação que se contrapõe a outra do mesmo autor que afirma que as funções de produção constituem apenas um momento da história das cidades.
O fenômeno da urbanização é crescente em todo o mundo. Em 1500, quando o Brasil foi descoberto, em torno de 25% da população mundial residia nas cidades. Este fato ajuda a abortar o entendimento de que a mecanização seria nos dias atuais, aliados à preocupação patrimonialista da manutenção da posse das propriedades rurais, fator essencial neste movimento da humanidade.
A cidade e seu centro urbano é um atrativo permanente para o homem porque se constitui em um ambiente que concentra os prazeres das festas, das conversas nas ruas, nas praças, nas escolas, nas igrejas e nos bares. É a troca entre pessoas que marca o ambiente de uma cidade.
A cidade existe enquanto relação entre os diferentes grupos que se interagem em um dado sistema de produção. Cada grupo, com seu modo de ver o mundo ou com interesses voltados para questões específicas, pode construir e reconstruir a cidade criativamente a partir de relações de poder que podem ser repartidas em amplas negociações ou impostas a partir de um poder outorgado por representação de seus moradores.
O italiano Ítalo Calvino, em seu “fabuloso” (com duplo sentido) livro “Cidades Invisíveis”, afirmou que as cidades como os sonhos, são construídas por desejos e medos. Desde a antiguidade, passando pela idade média chegando aos tempos modernos, ou “pós-modernos”, as cidades ou parte delas como os atuais condomínios, continuam a construir os muros como reflexos do medo. Segundo Tarso Genro, o sonho da liberdade é superado pelo medo do inimigo que está do outro lado do muro, sempre reinventado, para garantir os que podem transformar o medo em necessidade e o desejo em separação.
Volto ao francês Lê Goff, para verificar as semelhanças entre a cidade antiga e medieval e a cidade contemporânea lembrando o movimento iniciado pela igreja, partir do ano 1000, que incentivava a paz, a não violência, buscando dar resposta às aspirações das massas submetidas à violência feudal, que gerou a noção e a necessidade de policiamento que hoje conhecemos. Desde essa época “a segurança passa a ser uma obsessão urbana e paradoxalmente confia-se o cuidado de fazer o policiamento a pessoas a certa medida menosprezadas”. Em Atenas os “citas” são os bárbaros, na Inglaterra na Idade Média os arqueiros são os galeses, postos como hoje, a defender duas coisas: as pessoas e os bens. Também daí se originou a noção de serviço público.
Lefebvre definiu a cidade como a projeção da sociedade sobre um dado território. Porém, sabe-se mais, que a cidade é sempre uma diversidade. Pode-se ampliar a rima ao lembrar a desigualdade, da mesma forma que é possível construir versos incorporando o inverso da competitividade que é a solidariedade, que resume o sonho daqueles que querem uma cidade para todos. Que as reflexões deste texto, salpicadas de pontos diversos, nos permita, como a Calvino, ver e entender a cidade que temos e a que queremos para além dos dias atuais.
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