Este blog, sempre interessado em aprofundar o estudo e o debate sobre as questões locais e regionais, entrevistou o professor Renato Barreto, professor convidado da UENF/LESCE e doutorando em Ciência Política pelo IUPERJ.
Renato tem pesquisado e se aprofundado no conhecimento do processo eleitoral e sobre a política em Campos e este foi o principal tema da entrevista a seguir. Leia abaixo:
Blog - Qual a perspectiva que você vê sobre o futuro dos grupos políticos existentes em Campos? Crê que a polarização entre os dois grupos vista nas últimas eleições poderá acabar?
Prof. Renato Barreto: Acredito que o grupo do Deputado Federal Arnaldo Vianna vai sofrer um processo de desidratação. No meu entendimento isso se explica por três motivos:
- Primeiro por que ocorrerá um “natural” alinhamento de lideranças ligadas ao deputado em direção ao governo municipal.
- Segundo por que deve haver um forte movimento organizado pelo PMDB no sentido de cooptar determinados indivíduos e grupos ligados ao líder do PDT.
- Terceiro por que o Deputado sempre teve seu desempenho eleitoral alicerçado pela máquina da prefeitura, sem ela, dificilmente conseguirá manter aliados. Somado a isso deve-se acrescentar que o deputado não tem o perfil de um líder capaz de organizar uma oposição orgânica. Sua estratégia e seus resultados em 2010 serão um bom termômetro para medir o nível de sua desidratação.
Blog - Não há como fugir, pelo menos da hipótese, de que o que fez o grupo político de Garotinho voltar a disputar a prefeitura de Campos teria sido o extraordinário orçamento do município que poderia alimentar interesses eleitorais mais amplos do ex-governador. Como avalia a hipótese?
Prof. Renato Barreto: Penso que o ex-governador entendeu bem seu nível de desgaste. Quando se compara sua estratégia e resultados em 2004 e 2008, isso fica muito claro. Em 2004, Garotinho apoiava candidatos em praticamente todas as cidades do estado e seus aliados venceram na grande maioria delas. Em 2008, sem mandato, o ex-governador reduziu drasticamente suas expectativas. Centrou fogo em duas eleições: a eleição da filha Clarissa vereadora no Rio e a eleição da esposa em Campos.
A vitória em Campos tem um aspecto fortemente simbólico, significa uma retomada de suas origens, uma espécie de recomeço, dando ao ex-governador a chance de refazer a imagem de sua liderança na cidade, que está muito desgastada. É bom lembrar que, considerando os votos válidos no primeiro turno, em 2004 o candidato a prefeito do ex-governador teve apenas 33% dos votos, sendo que em 1996 Garotinho teve mais de 70% das preferências. Naturalmente essa diferença não se deve apenas ao desgaste, mas é prova da perda de seu capital político.
Blog - Qual será, no seu ponto de vista, o maior desafio da próxima prefeitura e qual poderia ser uma proposta inicial de governo?
Prof. Renato Barreto: Acho que o principal problema é a privatização da prefeitura. O poder público municipal foi assaltado por interesses privados dos mais variados quilates. É enorme a quantidade de novas “empresas” que foram criadas para “prestar serviços” à prefeitura. Existe na cidade uma espécie de corrente de opinião que vê os cofres municipais como um butim que deve ser partilhado entre aqueles que têm condições de estabelecer relações promiscuas com os detentores do poder local. Costumo chamar esse fenômeno de conspiração patrimonialista, uma elite que está dentro e fora do aparato administrativo e que considera os bens públicos como propriedade pessoal. É uma atitude extremamente anti-republicana e que conspira contra todos os avanços alcançados pela recente experiência democrática brasileira.
Penso que precisa haver uma revisão geral de todos os convênios e contratos. É preciso fiscalizar as empresas que prestam serviços ao poder municipal, elas precisam demonstrar que têm condições de prestar os serviços para os quais são contratados. Têm que estar em dia com suas obrigações trabalhistas e fiscais. As licitações precisam ser públicas e a internet deve ser o meio para viabilizar essa transparência. Se essas relações não forem alvo de meticulosa revisão, vamos apenas trocar seis por meia dúzia.
"Penso que a futura prefeita precisa dizer a sociedade qual é o tamanho ótimo do funcionalismo."
Blog - A discussão sobre a contratação dos terceirizados caminha para um novo acordo do tipo TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) com o MP do Trabalho, em que a futura prefeita tentaria acordos temporários, enquanto assumiria um compromisso de crescer a receita própria para poder ampliar o leque paulatino das vagas a serem oferecidas em Concurso Público. Isso seria um engodo eleitoral ou a confirmação de proximidade de métodos entre os dois pólos?
Professor Renato Barreto: Penso que a futura prefeita precisa dizer a sociedade qual é o tamanho ótimo do funcionalismo. Qual deve ser a relação habitantes/funcionários? Se pensarmos em São Paulo, por exemplo, em 2001 a cidade tinha aproximadamente 10 milhões de habitantes e a prefeitura contava com 110 mil funcionários. Ou seja, um funcionário para cada 90 mil habitantes. Se isso fosse aplicado aqui a prefeitura deveria ter 4.800 funcionários. Naturalmente esse número é inadequado, pois não temos a presença de serviços estaduais e federais que uma capital possui. Mas deve haver o compromisso de fixar um teto que esteja balizado nos números de cidades do mesmo porte de Campos.
Podemos, no entanto, tratar essa questão de um ângulo diferente. Vamos raciocinar em termos substantivos. Deixemos de lado todos os critérios éticos que devem nortear o trato da coisa pública. Imaginemos que um político que detenha o poder executivo municipal deseje apenas manter o poder e mais nada. Fará somente aquilo que colaborar para esse propósito. As escolhas então seriam assim ordenadas: quais as ações que vão mais seguramente se transformar em votos? É certo que garantir empregos dá votos. Mas é bom a gente lembrar que políticas públicas bem realizadas também dão votos. Só para ficarmos em um exemplo: um DAS 9 o cargo de confiança mais baixo na hierarquia dos salários, custa hoje, aos cofres municipais algo em torno de R$ 1.250,00. Se multiplicarmos por 48 meses correspondentes aos quatro anos de mandato, teremos R$ 60.000,00. Ora, com menos que isso se entrega uma casa popular. E eu pergunto. Entregar uma casa popular não dá tantos votos quanto dá um emprego? Pensemos nas pessoas que vão trabalhar nas obras, pensemos que as casas estarão lá e o prefeito vai poder sempre dizer que foi uma realização de sua gestão. Quer dizer, mesmo sob a ótica mais instrumental e nada republicana seria muito mais lógico realizar boas políticas públicas que iludir pessoas necessitadas de emprego com promessas que não podem e não devem ser cumpridas. Além do mais devemos lembrar o efeito nocivo que a patronagem exerce sobre os funcionários de carreira que realmente querem trabalhar.
Blog - A dependência e a ameaça sobre os critérios de divisão para o pagamento dos royalties continuarão rondando o cenário. Como julga que a Rosinha lidará com a questão? Qual seria sua sugestão diante da situação?
Prof. Renato Barreto: Campos precisa de um modelo de desenvolvimento. Qualquer pessoa interessada em pensar essa questão deveria ler o que escreve o Prof. José Luiz Viana da Cruz. É um especialista no assunto e tem tese de doutorado sobre o tema. Precisamos urgentemente desenvolver iniciativas que beneficiem as pequenas e médias empresas por que são elas que mais garantem emprego na região. A prefeitura pode e deve incentivar as instituições que qualificam mão de obra e assim colaborar para que os cidadãos possam disputar seu espaço no mercado de trabalho. O FUNDECAM precisa ter sua estrutura modificada, mais transparência, participação de organizações da sociedade e acima de tudo uma priorização do pequeno e médio empreendedor.
"Uma sociedade alerta e exigente obriga o governante a ter mais cuidado com o que faz e diz"
Blog - Acredita em uma organização maior da sociedade para acompanhar e controlar o novo governo?
Prof. Renato Barreto: Acredito que uma sociedade vigilante e propositiva melhora o governo em qualquer canto do mundo, desde que este tenha disposição para o diálogo. Governantes erram, precisam corrigir rumos e reformular ações, uma sociedade ativa tem a capacidade de identificar com mais rapidez esses erros que muitas vezes não são detectados por aqueles que estão comprometidos com o poder e que tendem a se fixar nos aspectos positivos da gestão. Além do mais uma sociedade alerta e exigente obriga o governante a ter mais cuidado com o que faz e diz. Acho que neste sentido a internet vai continuar sendo uma ferramenta importante e agregadora de propostas e ações.
Blog - Fora dos dois pólos de poder, que muitos afirmam ser oriundos da mesma costela, haverá alternativas na política municipal?
Prof. Renato Barreto: Sobre esse ponto gosto de lembrar da eleição de eleição de 2004. Nunca na história deste município uma disputa eleitoral foi tão crivada de intervenções das máquinas estadual e municipal. O abuso foi tanto que as eleições foram anuladas. Mas mesmo neste cenário a soma dos votos dos candidatos do PSDB e do PT ultrapassavam os votos obtidos pelo PMDB, primeiro colocado. Isso indica que há espaço para candidaturas desvinculadas de máquinas executivas.
Sobre 2012 é muito prematuro fazer qualquer prognóstico. Temos quatro anos pela frente, muito vai depender do desempenho da futura prefeita Rosinha. É bom lembrar que ela vai ser comparada com um governo desastroso e com forte rejeição.
Penso que os partidos alternativos ao PMDB e ao PDT precisam agir de modo sistemático se quiserem ter alguma perspectiva de poder. A oposição ao governo Rosinha vai existir, mas ainda não sabemos quem será seu (s) líder (es). Torcemos para que seja uma oposição responsável que qualifique o debate e recoloque a política no nível do conflito de idéias. Que entenda, como ensina Maquiavel, que denúncia é diferente de calúnia, a primeira exige provas exatas e fatos concretos a segunda é arma dos argilosos sempre movidos pela má fé e pelo rancor. Por outro lado, será muito melhor para a cidade ter uma prefeita capax de dialogar com os setores organizados da sociedade, em que pese não sesta sua tradição. É bom lembrar que a prefeita foi a única candidata que não compareceu aos encontros promovidos pelo SEPE durante a eleição para discutir a educação no município.
Blog - No blog Outros Campos, você postou uma nota sobre Barack Obama e o inovador uso da internet na transição de governo. Como historiador, como define o que representou para o mundo essa vitória de Obama?
Prof. Renato Barreto: A vitória de Obama tem significados multidimensionais, impossível falar de todos eles aqui. Vou ficar com um dos significados que acredito ser, com outros, muito relevante. Acredito que a eleição de Obama dá um forte impulso para recuperação do prestígio da democracia americana, desde a eleição de 2000 a imagem da democracia dos EUA estava muito abalada tanto interna quanto externamente. Vale lembrar que Bush foi eleito com 271 cadeiras e Al Gore obteve 266. Mas Bush perdeu as eleições populares por cerca de 500 mil votos, além disso a eleição foi roubada. A vitória de Obama que contou com grande e entusiasmada participação voluntária de eleitores revigorou a democracia do país. Provou que as instituições norte-americanas são sólidas e capazes de resistir a grandes desgastes.
8 comentários:
Caro Roberto,
Não sei se o erro foi seu ou do entrevistado, quando da resposta da penúltima pergunta, ou seja, usaram o termo "argiloso" quando deveria usar "ardiloso", vejam:
argiloso
(ô), adj. 1. Que contém argila. 2. Da natureza da argila.
ardiloso
(ô), adj. Que emprega ardis; astucioso, destro, enganador, sagaz, velhaco.
Isso não é a privatização da prefeitura. Na verdade são fraudes nas licitações. Se fosse privatizada de verdade, a gestão municipal seria muito mais eficiente comparada às péssimas administrações que sofremos.
Achei muito boa a entrevista.Porém o professor cometeu um erro.Os candidatos apoiados por garotinho venceram na maioria do estado.Em nossa região venceu em São Francisco,São João da Barra,São Fidélis,Itaocara,Italva,Pádua,Bom Jesus do Itabapoana e pratiacamente todos.Só perdeu em Cardoso Moreira.Essa é minha ressalva.
CARÍSSIMOS PROFESSOR ROBERTO MORAES E RENATO BARRETO.
SEM RANSO DE PIEGUICE
FOI EM NOSSA PLANÍCIE
BATALHA SEM IGUAL
DO MAL COMBATENDO MAL
TODOS PERDEM
ALGUNS GEMEM
PERDEMOS,
UM BOCADO MORREMOS
DE PRESENTE O QUE RESTOU
ELEIÇÃO
CIDADÃO
NEM SEI SE SOU
NÃO PEDI
E RECEBI
EU, OS MEUS
VOCÊ, OS SEUS
SEM DIREITO A PENITÊNCIA
SEM A DÁDIVA DA CLEMÊNCIA
O CASTIGO DE MEU DEUS
ONDE O ERRO ACONTECE
SE BEM PAGO DO PECADO ESQUECE
CAMPISTAS
CAMBISTAS
COMPRAM POR DEZ VOTOS DE MIL
SE O BRASIL TIVER CÚ
CAMPOS É O CÚ DO BRASIL
NÃO PENSE QUE É IMPROPÉRIO
POIS CÚ NO TEMPO DO IMPÉRIO
FALAVA-SE COM EXARCEBO
O ERA RAIZ DE VERBO
IR PRA TRÁS OU RECUAR
ERA NA DIREÇÃO DO CÚ, SE VOLTAR
NOSSA VERGONHA EM FALAR
DEVIA HAVER EM FAZER
POIS QUE NA MESMA VIA
TODO MAL QUE DENTRO HAVIA
DEVE SE ESGOTAR E DESCER
MEU ANDAR BEM DE MENINO
SEM NORTE , SEM DESTINO
APRENDI NESTA ELEIÇÃO
SE PAGA NÃO O QUE VALE
O QUE VALE É A TRAIÇÃO
UMA BATALHA INSANA
COMBATER-SE A LÍDER TIRANA
A FACE LHE GIRANDO ABRUPTA.
JAZ TROPA NEGRA, CORRUPTA
MIRAR ALIADOS ANTIGOS
TRANSMUTAR MERCENÁRIOS INIMIGOS.
CHEGA O CHOQUE FINAL
DO EMBATE NO SOLO CAMPISTA
VENCE A TROPA NARCISISTA
VITÓRIA DO MAL CONTRA O MAL.
ARMANDO BARRETO<:.>
Caro anônimo foi isso que o professro disse: "Em 2004, Garotinho apoiava candidatos em praticamente todas as cidades do estado e seus aliados venceram na grande maioria delas".
O termo argiloso está empregado em seu sentido correto e dicionarizado, que também significa frágil. O argumento é simples: é frágil todo indivíduo que lança mão da calúnia, pois não tem capacidade de enfrentar seu oponente se valendo de argumentos concretos, por isso arquiteta inverdades.
Ótima entrevista, escolheu de fato um excelente professor (digo isso pois ja tive aulas com ele no CEFA em 2010). Sou Raphael Oliveira e tive conhecimento acrescentado depois deste. Parabens aos dois.
As duas eleições mais importantes do planeta: dos EUA e de Campos dos Goytacazes.
mfs
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