segunda-feira, agosto 12, 2013

"O desenvolvimento das exigências": O avanço do IDH não reconhecido

A excelente matéria abaixo do jornalista Cristian Klein, do Valor, traz ao debate um interessante tema: a menor da taxa de sucesso de reeleição de prefeitos nos municípios que mais avançaram no IDH, indicador do PNUD.

É interessante porque o tema se vincula ao debate sobre as manifestações de ruas no Brasil, num momento em que o desemprego é o menor dos últimos tempos e há grande inclusão social, ao mesmo tempo, em que as reclamações por melhorias no serviço público, especialmente de transporte e saúde são crescentes.

A reportagem mostra astúcia do jornalista em buscar nas entrelinhas da informação sobre a melhoria do IDH dos municípios brasileiros o que era comum nos 100 municípios com maior e menor crescimento de IDH como mostra o infográfico abaixo:



Observando os dados em detalhes, se vê que a diferença dos percentuais de reeleição não são tão diferentes, mas, isto não invalida o debate. Ao contrário, ele aponta que não basta, aos políticos, no desenvolvimento de sua atividade de mediação em relação às políticas públicas, a melhoria da performance. Há outras necessidades para que o cidadão eleitor reconheça os avanços. Confira abaixo a excelente matéria:

Reeleição caiu onde IDHM mais evoluiu

Por Cristian Klein | De São Paulo
Os prefeitos das cidades que registraram o maior aumento proporcional no Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de 2010, divulgado pelo PNUD, tiveram maior dificuldade de se reeleger em 2012 do que seus pares pelo país. Em vez de se beneficiarem eleitoralmente da forte melhora nos indicadores de renda, saúde e educação - que compõem o índice - os prefeitos dos cem municípios com o maior avanço entre os IDHs de 1991 e 2010 viram suas chances de reeleição despencarem. É o que mostra o levantamento feito pelo Valor Data, a partir do cruzamento de dados do PNUD, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e da Confederação Nacional dos Municípios (CNM).

Os resultados surpreendem e, de acordo com especialistas consultados pelo Valor, sugerem um fenômeno semelhante ao ocorrido nacionalmente em junho: as manifestações de rua, que ocorreram a despeito da sensação de bem-estar, do baixo nível de desemprego e do consumo ainda elevado.
Os prefeitos dos cem municípios com maior crescimento no IDH - entre 201% e 369% - tiveram uma taxa de reeleição de 48,7%. É uma proporção menor que a dos prefeitos das cem cidades que registraram as menores evoluções de IDH (entre 21% e 33%, ou seja, um patamar dez vezes inferior) no período - municípios em boa parte que já têm os maiores IDH em termos absolutos. Neste grupo, o índice de reeleição foi de 55,8%, praticamente o mesmo da média nacional, que ficou em 55%.
A comparação das taxas entre os cem que mais evoluíram, os cem menos e o total de 5.568 municípios mostra que a expectativa de renovar o mandato foi ficando cada vez mais difícil, apesar do progresso no IDH.
Desde que passou a vigorar o instituto da reeleição, em 2000, nas últimas quatro corridas municipais a taxa média nacional de recondução foi de 59,7% (pela taxa líquida, que inclui também os prefeitos que poderiam se reeleger mas não tentaram, esse percentual é de 41,3%).
O índice de reeleição nos cem municípios que mais evoluíram no IDH subiu de 68,8% para o pico de 82,4%, em 2004, quando passou a declinar fortemente, para 68,8%, em 2008, e para os 48,7% do ano passado.
Para o economista Renan Gomes de Pieri o resultado não é contraditório, pois ao sair de um patamar muito baixo de desenvolvimento a tendência da população local seria a de naturalizar os ganhos e exigir mais. Com mais educação, viriam uma noção maior de cidadania e um maior rigor com os governantes. Seria uma versão do processo ocorrido nos protestos de junho e que deixaram a classe política e estudiosos perplexos, uma vez que o cenário não indicava tamanha turbulência ou insatisfação.
De Pieri é um dos autores de um artigo, baseado em sua dissertação de mestrado de 2011, que relacionou o impacto da melhora no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) sobre as chances de reeleição dos prefeitos nas eleições de 2004 e 2008. Os dados da primeira disputa, quando o Ideb ainda não era divulgado, foram utilizados para controlar a relação causal, se ela não seria contrária, ou seja, se a reeleição é que estaria impactando a melhora no indicador - o que não foi confirmado. A pedido do Valor, Renan de Pieri estimou a probabilidade de reeleição dos prefeitos e também encontrou a correlação negativa nos municípios com maior avanço de IDH.
"Há o aumento do IDH, que, em princípio, nos leva à ideia de que estes prefeitos seriam recompensados. Mas pode ter ocorrido qualquer evento político local ou mesmo que os eleitores destes municípios tenham ficado mais exigentes. A reeleição neste caso pode ficar até mais difícil. É algo semelhante ao que aconteceu em junho. A despeito de termos uma taxa de 3% de desemprego, tivemos uma das maiores mobilizações populares que o país já viu", diz De Pieri. "Se fizermos um cruzamento entre reeleição de governadores e crescimento econômico a correlação talvez também seja negativa, pois a população está de olho em outros fatores como a qualidade dos serviços públicos e a corrupção", acrescenta.
Na dissertação, o pesquisador encontrou uma correlação positiva: o aumento em um ponto na escala do Ideb cresceria a probabilidade de reeleição em cinco pontos percentuais. O professor André Portela, da FGV-SP, que foi o orientador no estudo, diz que o trabalho quebra um mito de que educação não dá voto, mas ressalva que a diferença entre o Ideb, o IDH (que ainda inclui renda e saúde) e o perfil dos municípios pode levar a resultados distintos.
Não adianta um prefeito investir em educação, exemplifica, se no perfil demográfico do município há uma predominância de idosos, que demandam mais por investimentos em saúde. Ou o contrário: se numa população majoritariamente de jovens, a gestão privilegiar políticas públicas voltadas para saúde em detrimento daquelas da educação. "Por isso, nós, economistas em geral, somos críticos a essas rubricas, com percentuais obrigatórios para saúde ou educação. Quando elas são baixas, são irrelevantes. Mas se forem altas, restringem a alocação de recursos de forma mais apropriada", diz.
De Pieri destaca que, embora seu estudo tenha apontado um efeito da educação nas chances de reeleição, o impacto seria menor que outras realizações mais visíveis. "Educação dá voto, mas a relação custo-benefício é alta. Para o prefeito, é mais barato fazer uma ponte. O retorno eleitoral é mais garantido. Na educação, é difícil o eleitor enxergar o produto", afirma.
Essa dificuldade pode ajudar a explicar a baixa taxa de reeleição. Marcelo Neri, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) - parceiro do PNUD na elaboração do IDHM - afirma que 65% da evolução do indicador na última década se devem à educação - enquanto 35% foram puxados pela renda e pela saúde.
Ele lembra que o efeito sobre as chances de renovação de mandato dos prefeitos, no entanto, são "realmente difíceis de achar". "O IDH resume muitas políticas distintas e compartilhadas, que envolvem vários partidos e níveis de governos diferentes", diz. Neri ressalta que a educação - embora tenha sido o componente que mais contribuiu para a evolução no IDH - é a antítese do ciclo político, pois o estudante, seu maior beneficiado é, majoritariamente, "aquele que não vota, que não é protagonista" na eleição. Uma prova disso, cita o presidente do Ipea, seria o trabalho de um ex-aluno seu - o economista Gabriel Buchmann, morto aos 28 anos, em 2009, quando fazia uma escalada na África - que mostrou diminuição de gastos educacionais em anos eleitorais."

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