Ele trata dos ganhos de intermediação entre produtores e consumidores. Por exemplo, tome o gráfico ao lado, que mostra como se forma a cadeia de preços de um produto, o café, à medida que avançamos na cadeia produtiva, desde a produção do grão pelo agricultor, até o momento em que é transformado no café que tomamos.
Ou seja, a evolução do preço da porta da fazenda em Uganda, à porta do bar no Reino Unido, desde os 14 centavos de dólar pagos a quem produziu o café até o equivalente de 42 dólares que pagamos no bar. Utilizamos o exemplo do café de Uganda para ilustrar uma tendência geral. Extraído do excelente estudo internacional sobre a aplicação de ciência e tecnologia à economia agrícola, nos dá a dimensão do problema, para um produto bem familiar.
É bom seguir a evolução das colunas, que representam o valor obtido em cada etapa: porta da fazenda, comercialização primária (trader price), colocado no porto em Mombasa, colocado em Felixstowe no Reino Unido, custo do produto após processamento na fábrica, preço na prateleira do supermercado, e finalmente o preço sob forma de café para consumo (when made into coffee). Veja-se antes de tudo a participação ridícula do produtor de café, que arca com o grosso do trabalho. Ao pegarmos as cinco primeiras etapas, vemos que para o conjunto dos agentes econômicos que podem ser considerados produtivos (produtor, serviço comercial primário, transporte, processamento) a participação no valor que o consumidor final paga ainda é muito pequena.
O imenso salto se dá no preço na gôndola do supermercado, os Walmart ou equivalentes em qualquer país. E outro salto se dá no ”when made into coffee”, ou seja, quando é servido sob forma de café. O gráfico fala por si. E os valores nas pontas, 14 centavos e 42 dólares, dão uma ideia da deformação da lógica de remuneração dos fatores e dos agentes econômicos.
O professor Ladislaw mostra que a lógica da desintermediação, naturalmente, é de se reduzir os lucros gerados no pedágio, redistribuindo esta apropriação de mais-valia entre o produtor, que poderá produzir mais e melhor, e o consumidor, sob forma de preço mais baixo, o que permitirá um consumo maior, absorvendo assim o fluxo maior de produtos. E o intermediário descobrirá que ao ganhar menos sobre um volume maior, voltará a ter a sua parte do bolo sem prejudicar a cadeia produtiva.
Com este exemplo o artigo mostra em detalhes onde e como se instala os processos inflacionários ao passar no gargalo dos intermediários que por serem em pequeno número conseguem agir sobre as duas pontas (produtores e consumidores) que embora sejam em muito maior quantidade, eles são dispersos e têm dificuldades em se articular, ao contrário dos intermediários. Isto pode ser visto de forma clara na imagem semelhante a de uma ampulheta (ao lado) tendo na base maior e inferior os produtores e na parte superior os consumidores.
O professor segue sua análise dizendo que os casos não se resumem a produtos agrícolas, depois industrializados (ou não), mas também a diversos outros produtos que seguem a mesma lógica:
"O fato maior, aqui, é que um conjunto de produtos que constituem o sangue da economia, como alimentos, minérios e energia, não são regulados nem por regras, nem por mecanismos de mercado, e muito menos por qualquer sistema de planejamento que pense os problemas de esgotamento de recursos ou de impactos ambientais.
"O fato maior, aqui, é que um conjunto de produtos que constituem o sangue da economia, como alimentos, minérios e energia, não são regulados nem por regras, nem por mecanismos de mercado, e muito menos por qualquer sistema de planejamento que pense os problemas de esgotamento de recursos ou de impactos ambientais.
A regulação formal, por leis, acordos e semelhantes não se dá antes de tudo porque se trata de um mercado mundial, e não há governo mundial. Os países individualmente não têm como enfrentar o processo. Quando a Argentina quis restringir as exportações de grãos para priorizar a alimentação da própria população, caiu o mundo em cima dela, como se a produção de alimentos não devesse satisfazer as necessidades alimentares.
O segundo fator de caos é a oligopolização do sistema. Na prática, além das cinco operadoras principais, poucas são as que têm importância sistêmica. Isto significa que estas corporações têm como definir os preços e manipular a oferta de maneira organizada. Chamam isto de “mercado” na imprensa, mas não se trata de mercado no sentido econômico, de livre jogo de oferta e procura. Na ausência de concorrência efetiva, os mecanismos de manipulação tornam-se prática corrente.
Um exemplo? A Glencore controlava, em 2010, 55% do comércio mundial de zinco, e 36% do comércio de cobre. Vitol e Trafigura venderam em 2010 8,1 milhões de barris de petróleo por dia, equivalente às exportações de petróleo da Arábia Saudita e da Venezuela juntas. (Schneyer, p.2)
Um terceiro fator, é o segredo. As empresas gozam de pouca visibilidade mundial, apenas especialistas acompanham o que acontece neste pequeno clube. E ninguém tem autoridade formal para exigir os dados neste espaço mundial... ... "O resultado são imensas fortunas nas mãos de quem não produziu riqueza nenhuma, mas cobra pedágio sobre todas as transações significativas".
Se você se interessa pelo tema, já viu o quanto o assunto é importante em nosso cotidiano. Por ele, você pode ter mais pistas do poder da "mídia comercial" para disfarçar a realidade dos fatos e lhe impor interpretações que lhe interessam, conforme o que lhes é pago, já que informação é outra mercadoria no mercado, em que quem ganha é o intermediador, repudiando todos que lhe possam mostrar as entranhas do sistema que ajuda a produzir lucros, excedentes e acumulação.
Com este artigo você pode ter uma ideia melhor daquilo que é chamado de capital fictício, especulação, fluxos globais, paraíso fiscais, necessidade de desburocratização, abertura econômica (todas palavrinhas abstratas que você ouve no noticiário econômico sem relacionar à concreticidade dos fatos) por cima dos governos nacionais com interferências diretas nos setores financeiros que transitam nos países, nas mídias, na justiça e outros.
Se desejar ir um pouco mais a fundo pode ainda imaginar como tudo isto se se articula com infraestrutura portuária, comércio internacional e relação com as chamadas cidades globais. A íntegra do artigo pode ser lido aqui.
3 comentários:
Mas está é a lógica atual. Quem produz, não vale nada. Quem especula, está nadando na crista da onda.
O atravessador sabe que a vaca não pode guardar o leite, que o café quando está pronto tem que ser colhido etc. Aproveita-se disso para colocar o pé no pescoço de quem produz. E os governos que devem regular estas relações, estão a favor dos especuladores e bancos pois eles financiam os governos, ora.
Não concordo com o professor quando diz que o pessoal do pedágio ganhará o mesmo se a distribuição for mais equânime. Não vai. Para alguem ganhar, alguem tem que perder. E eles não aceitarão perder. Ao menos não será espontâneo.
É por isto que os bancos nunca perdem, só perde quem produz.
Se os custos dos pedágios fossem menores, o consumo seria maior, também a produção e desta forma o rendimento total da intermediação se aproximar dos valores atuais.
Isto numa lógica em que se buscasse (usando uma expressão corriqueira dos executivos) um ganha-ganha (win-win).
Só que a lógica é diversa em função que a intermediação tem. Como falado no texto, sobre os governos das nações. As grandes traders, ligadas a fundos e instalados em paraísos fiscais imunes às regulações dos países.
A vinculação das traders, a fundos e bancos surge quase que como natural. Eles nada produzem, mas tudo controlam.
Vale ler o artigo na íntegra, para além do texto resumido que fiz para a nota.
Disse do poder que a intermediação tem. ( no 3º parágrafo do comentário).
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