sexta-feira, outubro 17, 2014

O mito da evolução natural

As nações e o mundo não andam sempre para frente. Isto é um mito. Em processo histórico há idas e vindas. Avanços e retrocessos. É isto que está em jogo em mais este processo eleitoral.

Nesta linha vale conferir o bom artigo abaixo publicado no "Brasil em Debate" de autoria do Pedro Paulo Bastos e Marcio Pochmann:

"Retórica tucana e mito da evolução natural"
Por Pedro Paulo Zahluth Bastos* e Marcio Pochmann**

O abuso da retórica da cientificidade como recurso de poder é comum entre neoliberais que travestem a opção política como julgamento neutro. O nível de autoengano, para dizer o mínimo, chegou a extremos em artigo recente de Samuel Pessôa (Folha, 12/10).

O físico-economista alude à genética de Bruna Marquezine para defender que progressos no bem-estar social dos brasileiros devem-se ou à “evolução natural” da sociedade ou a reformas de Fernando Henrique Cardoso que, no fundo, teriam semeado os avanços colhidos por Lula e Dilma. Pessôa alega que a retórica petista “descontextualiza” FHC e distorce informações para favorecer Lula e Dilma.

Na verdade, é Pessôa quem omite informações, recorre a truques de retórica e distorce a realidade visando ao melhor efeito político para o PSDB.

A principal omissão é que FHC executou a plataforma neoliberal de ampliar o papel do mercado e da competição para selecionar os melhores e punir preguiçosos, prometendo crescimento: privatização de estatais, desregulamentação do mercado de trabalho e liberalização comercial e financeira.

A promessa era falsa: a renda domiciliar per capita caiu entre 1995 e 2002, segundo dados do IBGE (Pnad), tendo aumentado mais de 50% a partir de 2003, com a recuperação do papel do Estado com Lula e Dilma. A melhoria de outros indicadores tampouco resultou da “evolução natural”, a saber:

1. Desigualdade (Gini): enquanto se manteve estável com FHC, caiu 10% com Lula e Dilma diante da valorização do salário mínimo, da defesa e formalização do emprego e ampliação do gasto social, que explicam a queda muito mais do que o avanço “natural” da educação e da demografia;

2. A propósito de progresso educacional, em 2001 FHC vetou o 1º Plano Nacional de Educação (PNE), que determinava investimentos de 7% do PIB até 2010, deixou o País sem meta de financiamento e concluiu mandato com 3,5% do PIB; em 2014, Dilma aplica 6,4% do PIB em educação e sanciona o 2º PNE com destino de 10% do PIB até 2024.

3. Sobre demografia, Pessôa alude a um conceito vago para explicar seu impacto na queda do desemprego: a “transição demográfica”. Talvez se refira à queda da natalidade e o envelhecimento da população, mas a verdade é que isso ainda não esgotou o bônus demográfico (maior proporção de pessoas em idade ativa), pois os adultos nascidos na vigência de taxas mais altas de crescimento populacional ainda não se aposentaram. Ao contrário de reduzir o desemprego, isso o aumentaria caso a oferta de empregos não tivesse aumentado e, principalmente, se não houvesse intensa inserção de jovens à escola, atrasando sua entrada no mercado de trabalho!

De fato, Pessôa omite a significativa ampliação das transferências de renda condicionadas à matrícula escolar, além de bolsas e crédito subsidiado para ensino técnico e universitário e a criação de 18 novas universidades federais (contra zero com FHC) e 178 novos campi. Com isso, as matrículas no ensino superior elevaram-se de 2 milhões (2002) para 7,5 milhões (2014), complementados por 8 milhões de alunos no Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec): produto da evolução natural?

4. Pessôa alega que mais da metade do crescimento da dívida pública com FHC resultou da assunção de dívidas passadas não contabilizadas. Isso é pura invenção: a “assunção de dívidas” explica menos de 10% da dívida e foi compensada em dobro (!) pela venda de estatais e a elevação de impostos. O que explode a dívida são juros altos e títulos indexados em dólar para evitar a crise da âncora cambial antes da reeleição de FHC em 1998. No próprio estudo do IPEA citado por Pessôa, correção cambial e juros altos contribuem com mais do que 100% da multiplicação da dívida por cinco entre 1995 e 2002! A dívida só não se elevou mais por causa das privatizações e do superávit primário depois de 1998.

5. Três idas ao FMI: Pessôa cita artigo de M. Bolle que, à maneira de Goebbels, não chama as coisas pelo nome e alega que empréstimos do FMI não indicam que o Brasil “quebrou”, pois “facilitaram a empreitada” da inclusão social. Por que “quebrar” designaria o fato de não obter financiamento do FMI e decretar moratória, ao invés de precisar dele a ponto de, no desespero, realizar políticas que levaram o desemprego a 15% e prometer vender o Banco do Brasil, a Caixa e as demais empresas estatais ainda não privatizadas, inclusive a PetrobraX?

6. Sobre o desemprego, Pessôa incorre naquilo de que acusa o PT: o “truque retórico de escolher estatísticas e bases de comparação de forma oportunista”. Em 2011, ele escreveu que, “entre julho de 2003 e julho de 2011, a taxa de desemprego caiu mais de 50% (!), apresentando redução de 13% da população economicamente ativa para 6,2%”, citando dados de regiões metropolitanas captadas pela Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE. No domingo, usou a PNAD para afirmar que “se tomarmos como base de comparação 2002, último ano de FHC, o desemprego caiu 2,6 pontos percentuais (!), de 9,1% para 6,5%”, sem sequer discutir que a PNAD capta menos a “transição demográfica” que cita. Ora, 50% ou 2,6%? É provável que a diferença no modo de calcular a redução do desemprego em 2011 e em 2014 se deva a oportunismo político e truque de retórica, não?

A piada sem graça não é que a retórica petista se aproprie da “evolução natural” de Bruna Marquezine, mas que seus críticos precisem se iludir quanto à rejeição da “herança natural” do neoliberalismo tucano por Lula e Dilma.

* Pedro Paulo Zahluth Bastos é professor associado (Livre Docente) do Instituto de Economia da Unicamp e ex-presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores em História Econômica (ABPHE)

** Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas

8 comentários:

Anônimo disse...

Vale ressaltar que um governo(PSDB), que nos anos 90, encontrou um país com uma inflação anual de quase 1000%,ao ano, foi muito competente, e corajoso, ao fazer baixá-la, ao patamar de um digito, em menos de um ano. Para isso teve que lutar com o PT, que na época, foi contra o Plano Real, que fez estabilizar essa inflação galopante.

Naquela época, o governo estava praticamente quebrado, em razão da inflação que corroía salários dos mais pobres e beneficiava somente os donos de fortunas, que aplicavam seu dinheiro e vivia somente de aplicações financeiras.

Já para o assalariado, era dificílimo, pois todo mês seu salário, valia no mínimo a metade.
Antes do plano real, a luta entre trabalhadores e patrões era enorme, face as desvalorizações de seus salários e incompreensão de empresários em não querer reajustá-los.

O plano real do PSDB, praticamente fez acabar esse conflito, entre patrões e empregados.

Seria uma grande Hipocrisia, negar esse legado do PSDB, quanto a estabilização da inflação,e da moeda, que possibilitou que anos depois, o PT avançasse em outras áreas, principalmente a social.

Roberto Moraes disse...

O tema do artigo trata da balela que é esta argumentação na mesma linha daquela dos go-go boys de Chicago sobre a evolução natural das nações e do mundo.

Sobre hipocrisia e legados quem morreu aborrecido com tamanha falta de reconhecimento foi Itamar Franco. Foi ele efetivamente, em seu governo que permitiu e orientou as mudanças. Quem nega este legado é FHC e os tucanos. Lembrando que FHC só se elegeu com apoio dele no final de 1994.

É triste ter memória seletiva e ainda querer que os outros sigam.

O fato é que olhando o passado os governos tucanos e os de Lula e Dilma, não há comparação possível que possa dizer quem fez mais para os brasileiros.

Sei que isto dói no ego do príncipe que renegou até o que escreveu, sobre a Teoria de Dependência, desde quando passou a defender que o Brasil assumisse sua "dependência" e tratasse de se colocar como uma nação apêndice do sistema central.

Mais nada é necessário dizer.

Anônimo disse...

Claro blogueiro quem pegou a casa arrumada, quer dizer um governo com inflação quase 0% , foi o PT. Sem esse ambiente favorável, o PT iria ter serios problemas lara governar. ALÉM do mais , LULA e Dilma governaram 12 anos e não apenas 08 anos como FHC. Logo o PT tinha o dever que fazer .ais que o PSDB.

Roberto Moraes disse...

Oh meu caro investidor,

Com sempre voltamos ao ponto de partida, rs.

Quem pegou inflação baixa e elevou foi FHC. A inflação dos 8 anos dele é mais alta que do período de Lula ou Dilma. Veja nos índices que desejar.

Sobre os resultados, não é necessário os 12 anos, pega todos, repito todos os indicadores não apenas os sociais, mas de emprego entre diversos outros são muito melhores do que de FHC. Pega qualquer um dos 8 anos e escolhe os 8 dos 12 anos para comparar.

Antes diziam que era porque o quadro internacional era outro.

Pois bem, há 6 anos, desde 2008, o quadro internacional piorou e temos desemprego de 5%.

Reconheço que dói dizer isto, mas, para quem pensa dentro do "quadrado dos go-go-boys de Chicago" não poderia ser diferente.

É como disse na outra postagem sobre a questão do valor do petróleo no mercado internacional.

É o bastante.

Anônimo disse...

Se engana pois não sou investidor. Porém, sei que há erros nas duas gestoes, do PT e do PSDB, é hipocresia querer atribuir erros somente ao PSDB. Afinal de contas houve corrupção nos dois governos. Mas o montante desviado pelo PT, extrapolou todas as expectativas, foi grande o rombo do PT.

Roberto Moraes disse...

Mais uma vez sua métrica está equivocada. Certamente influenciada pela mídia comercial que diariamente repete a mesma coisa.


Já que gosta e prefere as informações deste tipo de mídia veja com as fontes da Editora Abril o valor dos principais casos de corrupção do Brasil:

http://www.endodontiaclinica.odo.br/pages/posts/os-10-maiores-escandalos-de-corrupcao-do-brasil713.php?p=60

Ou aqui:
http://contrapontopig.blogspot.com.es/2014/01/contraponto-13199-os-onze-maiores-casos.html

Anônimo disse...

Não gosto de comparações. Ambos partidos tiveram seus méritos e seus problemas. Vamos pensar pra frente.

Como o sr avalia a economia durante o governo da Dilma e o que podemos esperar no âmbito também econômico.

1>Atividade econômica fraca e piorando muito nos últimos meses

2>Mercado de trabalho está piorando rapidamente (dados do ibge - população ocupada)

3> Número de vagas geradas

4>Inflação em alta já há alguns anos e sem sinais de queda

5> Confiança do consumidor

6>Confiança do empresário do comércio

7> A indústria reduzindo a produção

8> Investimento produtivo na economia vem caindo

9> Balança comercial caindo

10>Dívida externa volta a subir

11> O volume de poupança interna caindo

12>Consumo do governo aumentando

13> Despesas do governo federal crescendo

14>Carga tributária elevada e em alta

15> Oferta de crédito na economia depende dos bancos públicos

Coloquei alguns ganchos do qual gostaria de uma opinião.

Roberto Moraes disse...

Rs uma consultoria desta não é barata rs rs