quarta-feira, novembro 26, 2014

Disputa entre corporações amplia concorrência entre cidades: o caso SJB (Açu) x Macaé (Tepor)

Eu tive conhecimento ainda pela manhã sobre a decisão do TJ-RJ, mas, estava em mais um etapa de trabalho de minha pesquisa sobre portos, na cidade de Tarragona e não tinha como fazer postagem no blog. Na ocasião, por coincidência ou não, discutia sobre concorrência entre projetos portuários e ação governamental.

Refiro-me à decisão já amplamente divulgada sobre a ação judicial promovida pelo município de Macaé, contra os termos da licitação da Petrobras que praticamente garantia à empresa americana Edison Chouest Offshore (Eco) um contrato de cessão de base de apoio às exploração de petróleo offshore, pelo Porto do Açu, hoje controlado pela Prumo Global Logística S.A. (Ex-LLX).

Abaixo a matéria do Valor para uniformizar as informações e em seguida farei alguns primeiros comentários sobre o que isto aponta, significa e possíveis consequências.

Justiça suspende licitação da Petrobras por 


supostas irregularidades

Por André Ramalho | Valor

RIO  -  A Justiça do Rio de Janeiro acatou o pedido da Prefeitura de Macaé e suspendeu, por medida cautelar, a licitação da Petrobras para contratação de serviços de operação logística portuária para atender às Bacias de Campos e Espírito Santo. A liminar foi concedida pelo juiz Josué de Matos Ferreira, da 2ª Vara Cível de Macaé.
A licitação da Petrobras, por convite, prevê a contratação de seis berços de atracação simultânea de embarcações de apoio marítimo. A Prefeitura de Macaé acusa a Petrobras de restringir a competição e beneficiar o terminal portuário da Prumo Logística, no Porto do Açu, no município de São João da Barra (RJ).
Pelas regras da licitação, a estatal definiu uma sobretaxa, que reflete os custos operacionais (opex) da localidade de cada participante, a ser acrescida aos preços das propostas apresentadas. O objetivo da petroleira era valorar, na escolha da infraestrutura portuária, as vantagens ou desvantagens logísticas de cada participante.
O município de São João da Barra foi classificado com um índice de 0%, enquanto a sobretaxa de Macaé foi fixada em 17%. A Prefeitura de Macaé alega que a sobretaxa foi apresentada sem qualquer justificativa técnica e que o mecanismo foi criado para beneficiar as empresas instaladas no Porto do Açu.
O governo macaense também acusa a Petrobras de impedimento indireto de participação de empresas com sede em Macaé na licitação e defende que as obras do Terminal Portuário de Macaé têm prazo de conclusão compatível com o início das operações do contrato licitado.
“Considerando-se que Macaé fica a apenas 46 quilômetros de distância de São João da Barra, aparentemente não há justificativa ou proporcionalidade para o estabelecimento dos índices mencionados, já que Vitória (ES) fica mais q ue o dobro da distância e possui índice extremamente próximo ao do município requerente [Macaé]”, cita a decisão judicial.
Pela decisão, a petroleira terá de apresentar o projeto básico com as justificativas técnicas sobre o critério ou metodologia de cálculo utilizado na definição dos Custos Operacionais (Opex) para as diferentes localidades. A Petr obras também fica impedida de dar continuidade ao processo licitatório, sob pena de multa equivalente a 0,1% do valor previsto na licitação.
Comecemos enumerando as questões:

1) Primeiro é significativo que a ação seja de um governo e não de uma empresa ou corporação. 

2) Ainda mais significativo é que a prefeitura em questão seja a do município de Macaé que há 40 anos possui relação estreita com a estatal, desde que teve a cidade escolhida para ser sede da estatal na região, mesmo que politicamente, o nome concedido à Bacia fosse de Campos, como é conhecida no mundo todo.

3) É direito do gestor defender seu município se considera que ele esteja sendo prejudicado em algo. Porém, é estranho que o faça numa disputa concorrencial entre corporações, o que parece confundir e misturar interesses, que podem ajudar a explicam a incautos os tapetes vermelhos e outras condecorações que concedem mais que arbitram aos empreendedores condições de funcionamento e obtenção de lucros.

4) O jogo se torna ainda pior, na medida em que há algum tempo, eu venho dizendo e defendendo que um dos maiores problemas das gestões locais é que elas agem de forma concorrencial e não colaborativamente, em parceria e projetos em que poderiam se complementar. (Se desejarem releiam aqui minha entrevista à revista Ururau, edição Nº 5 no início deste ano, cujo título foi: "Pela política de colaboração").

5) Há ainda que se considerar que a disputa judicial vem num momento delicado da companhia petrolífera, em que licitações e corrupção por vantagens indevidas estão sendo investigadas pelo Ministério Público Federal e Polícia Federal.

6) É ainda oportuno que a disputa entre entes governamentais inclui também o governo do Estado do Espírito Santo, que embora tenha a mesma opinião de Macaé, aceitou (em termos o jogo) diante da promessa da direção da Petrobras (divulgada aquiaqui e aqui pela Gazeta do ES) de no início de 2015 realizar outra licitação concedendo melhores condições a portos e projetos portuários com sede naquele estado. Se desejar leiam também duas postagens recentes do blog sobre o assunto. (Aqui, aqui e aqui)

7) Na verdade os grandes interessados aí são as corporações. Vamos a elas: Em Macaé: a Queiroz Galvão que tem o projeto do Porto Tepor que está em processo de licenciamento e enfrenta questionamentos ambientais pela proximidade da área urbana (Bairro do Lagomar) e com a unidade de conservação ambiental, Parque Federal de Jurubatiba. É oportuno lembrar que o porto que até hoje serviu à base da Petrobras em Macaé é o TUP de Imbetiba de propriedade da Petrobras que hoje sofre com problemas de assoreamento e congestionamento para atracação de embarcações de apoio à exploração de petróleo em nosso litoral. 

8) No Açu, em SJB, as coporações interessadas é a americana Edison Chouest Offshore (Eco) que arrendou área, depois ampliada junto ao Terminal 2 do Porto do Açu. Em segundo lugar a Prumo Logística Global S.A. (ex-LLX) que vislumbra com a base de apoio no porto não apenas a receita do aluguel já feita da área, mas, a ida para o Açu de base de outras empresa que para lá se dirigirão pelas facilidades que tenderão a ter com esta nova base de apoio offshore da Petrobras. 

9) É oportuno recordar que o custo de embarcações de apoio é muito alto algumas entre US 50 mil e US$ 80 mil por dia, quando hoje se chega a ter problemas até para abastecimento fazendo com o que o taxímetro das diárias não pare, mesmo que o serviço desejado possa ser retardado.

10) Entre as empresas há que se considerar que portos e projetos portuários do Estado do Espírito Santo, controlados todos por empresas privadas, por propriedade do terminal, ou por concessão, também sabem que esta decisão da nova base, mesmo que outras licitações venham a ocorrer terá uma repercussão enorme para o futuro. 

11) O que está em jogo, a meu juízo, é na verdade a definição por parte da empresa de duas bases principais de apoio à exploração offshore. Uma para atender aos trabalhos da Bacia do Espírito Santo e de Campos até o seu limite na altura de Araruama e outra, no Rio e Niterói para atender a Bacia de Santos de Maricá em direção ao sul até Santos. Assim, sendo, as demais bases, do Espírito Santo, de Macaé e até mesmo de Santos tendem a ser apêndices destas duas. Até aqui. Esta é a grande questão que está em jogo. Economicamente e politicamente não é pouca coisa.

12) Porém, voltando às primeiras questões que citei, é interessante que as corporações (empresas) estejam na retaguarda e tenham colocado os "governos" para realizarem esta competição que é de cunho inter-empresarial, ou inter-capitalista, sobre o uso do território para a consecução dos seus interesses. 

14) Assim sendo, conhecendo, mesmo que brevemente, mas continuando a estudar e pesquisar,  a forma como as corporações atuam, não é difícil vislumbrar que esta competição tenha limite com algum tipo de acordo entre elas, que certamente não levará em conta, os interesses dos municípios e nem de sua população, como melhor solução.

15) Para encerrar esta primeira etapa de comentários sobre o caso, vale considerar e mostrar as evidências da ausência do governo estadual como planejador e ordenador da ocupação territorial no Rio de Janeiro. Mais que tapetes vermelhos e trocas de favores com empréstimo de aviões, o papel do estado é de ser gestor das soluções, de buscar conciliações e colaboração entre os municípios para interesse do cidadão. 

16) Vejam que interessante, os políticos de Macaé está juntos do governo do estado na busca de seus interesses, da mesma forma que os de São João da Barra. Aliás, foi o prefeito de SJB que anunciou publicamente o vencedor da licitação que disse ter ouvido do governador a notícia,em que este sabia que seria contestada pela Prefeitura de Macaé a quem também tinha prometido apoio.

17) Que o caso sirva de exemplo e de alerta para o "novo mandado" que o tipo de ação que a população espera do governo estadual é de outra ordem. A agilidade tida nas desapropriações contra os pequenos proprietários e a inércia diante dos impactos ambientais da instalação do Porto do Açu, a salinização de parte do solo e agora a erosão da Praia do Açu, seja trocada por uma ação de ordenamento territorial articulado com os interesses da população e dos municípios e não apenas e exclusivamente das empresas que concorrem entre si e aqui estão interessadas nas oportunidades geradas pela riqueza produzida por uma empresa estatal de petróleo.

O assunto é mais extenso e merece outras análises, mas, entendo que por ora estas sejam suficientes para que não se fique apenas na superficialidade das observações de mais uma disputa política entre gestores de diferentes correntes e municípios. Diante da quantidade de informações que hoje é possível se obter, sem estar presente nos gabinetes governamentais ou nas salas das gerências, a população espera que haja mais clareza, transparência e disposição de avançar no que interessa a todos.

Assim, o blog submete sua primeira análise sobre o caso ao debate de quem vem acompanhando as questões que se referem ao desenvolvimento daquilo que ainda chamam de região (mesmo que desintegrada) Norte Fluminense.

Um comentário:

Manoel Ribeiro disse...

OK, a Petrobras vai utilizar o porto de São João da Barra para transportar materiais que estão em Macaé para as plataformas à custo zero. Pergunto: quando custará levar de Macaé à SanJuan esses mesmos materiais? Não podemos esquecer que TODAS as empresas que prestam serviços de manutenção ou fornecimento de materials à petrobras estão em Macaé. ou seja, vamos saturar mais um pouquinho a BR101, né?