"Geopolítica do Petróleo: Arábia Saudita-EUA X Irã-Rússia-Venezuela ou OPEP X EUA?"
"Jay Solomon e Summer Said (WSJ, 23/12/14) reportam que, no início de outubro de 2014, o representante da Arábia Saudita na Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) surpreendeu os participantes de um seminário em Nova York ao revelar que seu governo estava contente em deixar os preços do petróleo caírem.
A mensagem de Nasser al-Dossary rompeu com décadas da ortodoxia saudita, que buscava manter os preços elevados limitando a produção global de petróleo. Isso criou o cenário para os sauditas derrubarem o preço do petróleo no fim de novembro, depois de persuadirem outros membros da Opep a manter a produção estável.
Os países mais afetados, como Irã, Rússia e Venezuela, suspeitam que a queda foi um esforço coordenado entre os sauditas e o seu aliado de longa data, os EUA, para enfraquecer a economia e a posição geopolítica de seus inimigos.
Mas a história da nova estratégia de petróleo da Arábia Saudita, segundo entrevistas com autoridades do Oriente Médio, dos EUA e da Europa, não é a da velha aliança. É uma história de crescente rivalidade, movida pelo que os sauditas consideram uma ameaça imposta pelas empresas de petróleo americanas, dizem essas autoridades.
A produção de petróleo de xisto no Texas e na Dakota do Norte elevou a oferta americana, substituindo as exportações de membros da Opep para os EUA, o que aumentou o volume excedente global.
A mensagem de outubro de Dossary sinalizava um desafio direto para as empresas de petróleo americanas, de que a monarquia árabe acredita que elas geraram o excesso de oferta ao usar as novas tecnologias de petróleo de xisto.
Autoridades sauditas estão convencidas de que não conseguem sozinhas elevar os preços com a nova enxurrada de petróleo disponível. Também concluíram que muitos outros membros da Opep se recusariam a promover cortes significativos, assim como grandes produtores não membros, como a Rússia e o México. Se a Arábia Saudita cortar a produção sozinha, os sauditas temem que outros produtores iriam ocupar esse espaço e roubariam fatias de mercado.
O ministro saudita do Petróleo, Ali al-Naimi, testou essa conclusão apenas 48 horas antes da decisão da Opep, de 27 de novembro de 2014, ao se reunir em Viena com ministros de outras grandes nações produtoras para sugerir um corte coordenado na produção. Como suspeitava, ele não conseguiu um acordo, disseram fontes a par da reunião. A opção foi deixar o preço cair para testar por quanto tempo, e em que nível, os EUA conseguem continuar extraindo petróleo de xisto.
A decisão da Opep ajudou a derrubar o preço do barril para menos de US$ 60, ante mais de US$ 100 em meados do ano. Isso aprofundou a discórdia entre os membros da Opep – e entre outros produtores – que se acostumaram com preços de três dígitos do barril engordando as contas dos governos.
“Numa situação como essa, é difícil, se não impossível, para o país ou para a Opep tomar qualquer medida que possa resultar em queda de fatia de mercado e maior participação para os outros, num momento em que é difícil controlar os preços”, disse Naimi, segundo a imprensa oficial saudita. Ele não respondeu a perguntas. Os representantes do Ministério do Petróleo saudita não comentaram.
A abordagem saudita é parte de uma evolução significativa da relação saudita com os EUA nos últimos 10 anos. Aliados próximos desde a Segunda Guerra Mundial, os países prosperaram com o acordo pelo qual a Arábia forneceu um fluxo constante de petróleo em troca de os EUA garantirem a segurança de suas fronteiras.
Mas o surgimento dos EUA como um concorrente do setor de petróleo está testando esse alicerce de uma forma não muito bem-vinda, dizem autoridades americanas e sauditas, assim como as principais diferenças em relação à política americana no Oriente Médio.
A Arábia Saudita está se arriscando ao deixar despencar o preço, dizem autoridades americanas, árabes e europeias. Autoridades sauditas já disseram que sua economia pode sobreviver ao menos mais dois anos com os preços baixos, graças em parte a reservas de US$ 750 bilhões. As autoridades árabes acreditam que muitas empresas petrolíferas menos eficientes terão que deixar o mercado.
Ainda assim, alguns executivos do setor dizem que governo saudita e Naimi podem estar subestimando o modo como a tecnologia e o boom do xisto nos EUA mudaram fundamentalmente os mercados de petróleo. Muitas empresas americanas, dizem esses executivos, podem lucrar mesmo com o petróleo abaixo de US$ 40.
A posição saudita também expôs rachaduras no seu círculo de poder. Em outubro de 2014, enquanto os preços do petróleo caíam, o príncipe bilionário al-Waleed Bin Talal, sobrinho do rei Abdullah, criticou severamente Naimi, numa carta aberta, pela falta de preocupação com as quedas nos preços. Menosprezar o impacto, escreveu o príncipe, “é uma catástrofe que não pode deixar de ser mencionada”.
Um porta-voz do Conselho Nacional de Segurança dos EUA disse que a aliança com a Arábia Saudita segue forte. “Nossa relação bilateral foi construída durante 70 anos de cooperação próxima, seja em contraterrorismo, treinamento militar, trocas educacionais, segurança energética ou incentivos ao comércio e investimentos”, disse Alistar Baskey.
Mas as relações azedaram nos últimos anos devido a divergências sobre como os EUA têm lidado com a instabilidade no Oriente Médio, inclusive a decisão americana de não atacar a Síria após as forças do presidente Bashar al-Assad terem supostamente usado gás venenoso contra civis.
“A dependência que a Arábia Saudita tinha da proteção americana é coisa do passado”, afirma Nawaf Obaid, acadêmico visitante do Belfer Center, da Universidade Harvard, e que já assessorou o governo saudita em política externa. “Os sauditas continuarão sendo os mais importantes parceiros estratégicos dos EUA no Oriente Médio, mas não os mais próximos.”
Os EUA estão entrando numa nova era de sua relação com a Arábia Saudita, embora a aliança continue crucial para a economia global, diz Amos Hochstein, enviado especial do Departamento de Estado e coordenador internacional dos EUA para assuntos de energia.
“Nossa relação com a Arábia Saudita nunca foi dependente da energia. E está evoluindo”, diz. “Nunca seremos independentes do petróleo porque ele é uma commodity global. Mas podemos ser mais eficientes e autossuficientes.”
Ao defender a manutenção da produção pela Opep, Naimi não estava forçando uma queda nos preços para prejudicar as petrolíferas que exploram petróleo de xisto nos EUA, dizem pessoas a par da questão, mas alertando que, se a Opep cortasse a oferta, petróleo de fora do cartel iria substituí-lo.
Ordens de venda inundaram os mercados, as ações das grandes petrolíferas caíram e a moeda dos grandes exportadores, como Rússia e Nigéria, recuou ante o dólar.
Autoridades americanas e árabes secretamente desejaram que a queda pudesse reduzir a capacidade de Irã, Rússia e Venezuela de desestabilizar o mercado global e que os problemas financeiros do Irã poderiam forçá-lo a maisconcessões no seu programa nuclear.
“Se, no processo, 30% da receita do Irã sumir, tudo bem”, disse uma autoridade árabe envolvida nas discussões do petróleo. “Se, no processo, 30% da receita da receita da Rússia sumir, tudo bem.”
Há o risco de que os preços não se recuperem logo. Parte da mídia saudita vem criticando Naimi por uma política que pode ser desastrosa para a economia do país, que depende do petróleo para 90% de seu orçamento. “Autoridades da Opep e fora dela estão em estado de choque”, diz Muhammad al-Sabban, ex-assessor de Naimi. “Esperar para ver é a única opção.”
Os países mais afetados, como Irã, Rússia e Venezuela, suspeitam que a queda foi um esforço coordenado entre os sauditas e o seu aliado de longa data, os EUA, para enfraquecer a economia e a posição geopolítica de seus inimigos.
Mas a história da nova estratégia de petróleo da Arábia Saudita, segundo entrevistas com autoridades do Oriente Médio, dos EUA e da Europa, não é a da velha aliança. É uma história de crescente rivalidade, movida pelo que os sauditas consideram uma ameaça imposta pelas empresas de petróleo americanas, dizem essas autoridades.
A produção de petróleo de xisto no Texas e na Dakota do Norte elevou a oferta americana, substituindo as exportações de membros da Opep para os EUA, o que aumentou o volume excedente global.
A mensagem de outubro de Dossary sinalizava um desafio direto para as empresas de petróleo americanas, de que a monarquia árabe acredita que elas geraram o excesso de oferta ao usar as novas tecnologias de petróleo de xisto.
Autoridades sauditas estão convencidas de que não conseguem sozinhas elevar os preços com a nova enxurrada de petróleo disponível. Também concluíram que muitos outros membros da Opep se recusariam a promover cortes significativos, assim como grandes produtores não membros, como a Rússia e o México. Se a Arábia Saudita cortar a produção sozinha, os sauditas temem que outros produtores iriam ocupar esse espaço e roubariam fatias de mercado.
O ministro saudita do Petróleo, Ali al-Naimi, testou essa conclusão apenas 48 horas antes da decisão da Opep, de 27 de novembro de 2014, ao se reunir em Viena com ministros de outras grandes nações produtoras para sugerir um corte coordenado na produção. Como suspeitava, ele não conseguiu um acordo, disseram fontes a par da reunião. A opção foi deixar o preço cair para testar por quanto tempo, e em que nível, os EUA conseguem continuar extraindo petróleo de xisto.
A decisão da Opep ajudou a derrubar o preço do barril para menos de US$ 60, ante mais de US$ 100 em meados do ano. Isso aprofundou a discórdia entre os membros da Opep – e entre outros produtores – que se acostumaram com preços de três dígitos do barril engordando as contas dos governos.
“Numa situação como essa, é difícil, se não impossível, para o país ou para a Opep tomar qualquer medida que possa resultar em queda de fatia de mercado e maior participação para os outros, num momento em que é difícil controlar os preços”, disse Naimi, segundo a imprensa oficial saudita. Ele não respondeu a perguntas. Os representantes do Ministério do Petróleo saudita não comentaram.
A abordagem saudita é parte de uma evolução significativa da relação saudita com os EUA nos últimos 10 anos. Aliados próximos desde a Segunda Guerra Mundial, os países prosperaram com o acordo pelo qual a Arábia forneceu um fluxo constante de petróleo em troca de os EUA garantirem a segurança de suas fronteiras.
Mas o surgimento dos EUA como um concorrente do setor de petróleo está testando esse alicerce de uma forma não muito bem-vinda, dizem autoridades americanas e sauditas, assim como as principais diferenças em relação à política americana no Oriente Médio.
A Arábia Saudita está se arriscando ao deixar despencar o preço, dizem autoridades americanas, árabes e europeias. Autoridades sauditas já disseram que sua economia pode sobreviver ao menos mais dois anos com os preços baixos, graças em parte a reservas de US$ 750 bilhões. As autoridades árabes acreditam que muitas empresas petrolíferas menos eficientes terão que deixar o mercado.
Ainda assim, alguns executivos do setor dizem que governo saudita e Naimi podem estar subestimando o modo como a tecnologia e o boom do xisto nos EUA mudaram fundamentalmente os mercados de petróleo. Muitas empresas americanas, dizem esses executivos, podem lucrar mesmo com o petróleo abaixo de US$ 40.
A posição saudita também expôs rachaduras no seu círculo de poder. Em outubro de 2014, enquanto os preços do petróleo caíam, o príncipe bilionário al-Waleed Bin Talal, sobrinho do rei Abdullah, criticou severamente Naimi, numa carta aberta, pela falta de preocupação com as quedas nos preços. Menosprezar o impacto, escreveu o príncipe, “é uma catástrofe que não pode deixar de ser mencionada”.
Um porta-voz do Conselho Nacional de Segurança dos EUA disse que a aliança com a Arábia Saudita segue forte. “Nossa relação bilateral foi construída durante 70 anos de cooperação próxima, seja em contraterrorismo, treinamento militar, trocas educacionais, segurança energética ou incentivos ao comércio e investimentos”, disse Alistar Baskey.
Mas as relações azedaram nos últimos anos devido a divergências sobre como os EUA têm lidado com a instabilidade no Oriente Médio, inclusive a decisão americana de não atacar a Síria após as forças do presidente Bashar al-Assad terem supostamente usado gás venenoso contra civis.
“A dependência que a Arábia Saudita tinha da proteção americana é coisa do passado”, afirma Nawaf Obaid, acadêmico visitante do Belfer Center, da Universidade Harvard, e que já assessorou o governo saudita em política externa. “Os sauditas continuarão sendo os mais importantes parceiros estratégicos dos EUA no Oriente Médio, mas não os mais próximos.”
Os EUA estão entrando numa nova era de sua relação com a Arábia Saudita, embora a aliança continue crucial para a economia global, diz Amos Hochstein, enviado especial do Departamento de Estado e coordenador internacional dos EUA para assuntos de energia.
“Nossa relação com a Arábia Saudita nunca foi dependente da energia. E está evoluindo”, diz. “Nunca seremos independentes do petróleo porque ele é uma commodity global. Mas podemos ser mais eficientes e autossuficientes.”
Ao defender a manutenção da produção pela Opep, Naimi não estava forçando uma queda nos preços para prejudicar as petrolíferas que exploram petróleo de xisto nos EUA, dizem pessoas a par da questão, mas alertando que, se a Opep cortasse a oferta, petróleo de fora do cartel iria substituí-lo.
Ordens de venda inundaram os mercados, as ações das grandes petrolíferas caíram e a moeda dos grandes exportadores, como Rússia e Nigéria, recuou ante o dólar.
Autoridades americanas e árabes secretamente desejaram que a queda pudesse reduzir a capacidade de Irã, Rússia e Venezuela de desestabilizar o mercado global e que os problemas financeiros do Irã poderiam forçá-lo a maisconcessões no seu programa nuclear.
“Se, no processo, 30% da receita do Irã sumir, tudo bem”, disse uma autoridade árabe envolvida nas discussões do petróleo. “Se, no processo, 30% da receita da receita da Rússia sumir, tudo bem.”
Há o risco de que os preços não se recuperem logo. Parte da mídia saudita vem criticando Naimi por uma política que pode ser desastrosa para a economia do país, que depende do petróleo para 90% de seu orçamento. “Autoridades da Opep e fora dela estão em estado de choque”, diz Muhammad al-Sabban, ex-assessor de Naimi. “Esperar para ver é a única opção.”
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