Abaixo o blog publica artigo do professor e ambientalista Arthur Soffiati analisando e questionando as ações contra a seca anunciadas pelo governador Pezão há dois dias, em Italva. Vale conferir a opinião de quem vem estudando, pesquisando e debatendo as questões relacionadas às questões ambientais da região. Fotos enviadas pelo autor do artigo com os devidos créditos.
"Ações emergenciais contra a seca"
Arthur Soffiati
Sempre que um evento atípico quebra a rotina, as pessoas costumam ficar perdidas. Muitas declarações são feitas. Há diagnósticos superficiais, soluções propostas precipitadamente e ações que agravam mais o problema do que o solucionam. Por mais que a economia do Norte-Noroeste Fluminense dependa das condições climáticas, uma enchente sempre parece ser a primeira enchente da história e uma estiagem sempre a primeira estiagem enfrentada. Instala-se uma confusão generalizada difícil de se dissipar.
No meio da balbúrdia, eis que o Governador Pezão anuncia em Italva soluções emergenciais para nossa região na longa seca que afeta a Região Sudeste há um ano e um mês. Os eventos de enchentes não costumam ser longos como as secas. Estou convencido que começamos a colher os frutos murchos do aquecimento global, da falência da Amazônia e do desmatamento da Mata Atlântica. Sei perfeitamente que uma pessoa passa fome se não comer durante uma semana, mas que pode morrer se comer todos os pratos que não ingeriu durante uma semana.
Destruímos a Terra durante dois séculos e meio e não aceitamos que os problemas que nos afetam resultam de nossas ações predatórias. Achamos que tudo é natural ou um castigo de Deus. Nesse sentido, buscamos soluções imediatas, esquecendo que não há soluções rápidas para problemas que vêm se acumulando há mais de dois séculos.
A partir dessas considerações iniciais é que analiso as propostas do governador para enfrentar a mais profunda seca registrada na Região Sudeste. São boas as medidas de fornecer alimento para o gado esfaimado e sedento e de propor à Presidente da República um programa de reflorestamento da Bacia do Paraíba do Sul. Não sei de onde virá este alimento nem conheço em detalhes o programa de reflorestamento, se é que realmente se trata de um programa e se limita à Bacia do Paraíba do Sul. Um programa sério de reflorestamento deveria partir do governo federal em consonância com os Estados e Municípios. Não apenas se restringindo à Bacia do Paraíba do Sul. Afinal, quatro estados, pelo menos, estão envolvidos. Do contrário, a tendência é não haver unidade, com cada um fazendo o que bem entende. Tal programa não deve se limitar às nascentes e a uma bacia hídrica. Por maiores que sejam as resistências dos produtores rurais em ceder terras que não lhes pertencem, é preciso a revitalização das bacias desde a nascente até a foz.
No Norte-Noroeste Fluminense, há várias bacias e microbacias que não podem ficar de fora. As principais são as do Rios Itabapoana, Guaxindiba, Paraíba do Sul (com a sub-bacia da Lagoa Feia) e do Macaé. Mas existem várias bacias independentes entre as grandes. O Programa Rio Rural, que admiro de longa data, já acumulou grande experiência em reflorestamento conjugado com agropecuária e para pequenos produtores. Lamento apenas que a revitalização de microbacias não comporte a restauração das antigas fisionomias de cursos d'água, ao mesmo tempo em que promove barragens que desregulam o regime hídrico de córregos.
A proposta de abertura de poços comunitários corresponde a captar água no volume morto da região. Não temos reservatórios construídos, como os de Paraibuna e Santa Branca, no alto Paraíba do Sul, que já chegaram ao volume morto. Ora, explorar água nesta parte, que vem sendo chamada eufemisticamente de reserva técnica, sem a garantia de chuvas próximas, aumenta o ressecamento, mergulhando no subsolo. Há uma confusão acentuada entre poços profundos e poços artesianos. Os primeiros atingem profundidades iguais ou superiores a 30 metros. Os segundos perfuram camadas muito profundas na busca de água aprisionada em camadas rochosas. Não importa a confusão. Acontece que os pontos de recarga não recebem proteção e não há previsão de chuvas abundantes para breve. Não caíram as chuvas esperadas para a segunda quinzena de novembro, para dezembro e janeiro. No entender do climatologista Carlos Nobre, do Instituto de Pesquisas Espaciais, além das chuvas regulares para esta época do ano, precisamos de 60 a 80% a mais para restabelecer a normalidade de umidade. Ou seja, além do que normalmente chove, precisamos de mais 5/3 ou 5/4 de chuva a mais para restabelecer a umidade normal.
Enquanto as seca se intensifica, o governador lembra das misteriosas obras contra enchentes nos Rios Pomba e Muriaé, desconhecidas até mesmo por seus executores. Até onde se sabe, trata-se da construção de canais antes das cidades para desviar excesso de água, voltando ao rio abaixo da cidade. Esta solução só se justificaria se tais canais conduzissem o excedente de água para um reservatório que, uma vez cheio, extravasaria a fio d'água e voltasse para o rio principal, com o aproveitamento de depressões, como no caso dos dois rios mencionados, mais no Muriaé que no Pomba, pois na margem esquerda do Rio Muriaé existem lagoas que funcionariam como reservatórios, como as da Onça e do Lameiro. Tais lagoas, porém, estão privatizadas ou estropiadas. No início do canal, seriam necessárias comportas para evitar a perda d'água durante as estiagens.
Não podemos mudar o mundo repentinamente. Contudo, em meio a crise, é preciso manter a cabeça fria e adotar soluções inteligentes.
3 comentários:
Então... Se já destruímos tudo nos 2,5 séculos passados não adianta chorar o leite derramado, é reflorestar e já! Desde os anos de 1970 a silvicultura é ensinada para os alunos da área de agricultura e a abordagem sobre desmatamento já contemplava o caos dos dias de hoje, é preciso um programa sério a nível federal e com respostas a médio e longo prazo, pois se a destruição florestal aconteceu em busca de riquezas e conforto hoje estes ocorreram, e há formulas e sistemas que resolvem este problema do reflorestamento rápido...
Quanto a emergência acho que estão esquecendo que os aquíferos costeiros são beneficiados pelas aguas oceânicas, estes são "infinitos", e nas regiões mais ao largo também há aguas profundas... Essa coisa de chamar o planeta de terra engana as pessoas, nosso planeta é Agua!
Pô Marcos Valério.
Cadê você este tempo todo? Já que você sabe isto tudo porque estamos amargando esta seca? Apresente-se para salvar-nos desta ignorância aflita e mostre-nos, ó mestre, o caminho das águas...
Rs, anônimo eu estou apresentado quando você vê meu perfil, ao passo que ironias à parte, pois o bom humor é essência da boa existência, você poderia se identificar e trocarmos ideias e ideais por aqui!
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