O blog parte do princípio que as manifestações são um direito conquistado pela democracia. Para alguns, a plena liberdade, não eliminou a restrição.
Por outro lado, o pedido de impeachment é golpe. A partir dessas premissas é importante sim identificar as insatisfações e o recado das ruas.
É necessário também compreender que o recado foi fortemente amplificado pelo forte apoio da mídia comercial. Esta atua mais como partido do que como órgão de informação. Diante dessa realidade é conveniente observar as estratégias que estão em disputa no atual momento da conjuntura brasileira.
Nesta toada, dois pontos, entre outros, parecem evidentes:
1) Por parte das oposições é evidente a tentativa de empurrar o governo para uma dependência do PMDB. Diante desse caminho, fazer "sangrar" o governo, como afirmou textualmente o senador tucano Aloysio Nunes Ferreira e assim corroer e diluir o poder de quem foi escolhido pelas urnas;
2) No outro extremo, diante de uma segunda e diversa opção do governo que possa levar às medidas mais estruturais e de reformas políticas e econômicas - do tipo das anteriores reformas de base - acusar o governo de bolivarianismo e de chavismo.
Essas duas estratégias da oposição visam, no fundo disputar a base da classe média, recentemente ascendida - em torno de 40 milhões de pessoas - porque a elite e a classe média alta (menor populacionalmente e mais articulada com os poderes econômico e parte da política) em sua maioria esmagadora, já é oposição. Chamada de burguesia ela está hoje, muito mais unificada e expressa um sentimento que o ex-ministro Bresser Pereira chamou de ódio coletivo da classe alta, dos ricos.
A maioria da população que é a base da pirâmide,em sua luta pelo dia a dia, acompanha de longe o que acontece, mas, majoritariamente defende o governo. Age dessa forma, não apenas pelas recentes conquistas, mas, pela desconfiança real, de que mudanças elas poderão levar ao poder, pessoas e partidos que não pensam neles, e que em parte tem reclamado dos espaços ocupados pela ascensão social dos pobres.
Dessa forma, tem-se um disputa de posições que se estendeu ao debate eleitoral de outubro passado. Há sinais no horizonte de que podemos estar vivendo o estertor de um ciclo econômico e político.
A radicalização de posições que a oposição e a mídia forçam, podem levar ao rompimento da polarização que há seis eleições presidenciais (desde 1994) temos visto acontecer.
As forças de esquerda e centro esquerda estão acuadas no momento, porque não é simples defender posições, ao contrário de atacar e fazer oposição. Esta é uma nova experiência do PT e de quem está no atual governo.
Ilusão seria imaginar algo diverso disso, com o sabido e previsível acirramento das posições. Além disso, há que se observar os oportunistas pendurados em cargos federais, de todos os tipos.
Em meio a este quadro, há ainda, inquestionavelmente, um enfraquecimento do sistema político-partidário em diversas partes do mundo.
Tem sido denominado de plutocracia, os governos e o poder controlados não pela política e pelos representantes do povo, mas, pelos "bancados e financiados" pelo poder econômico.
Ajuda nesse processo a fragilização dos partidos e dos políticos pegos, quase diariamente, em artimanhas de contratos e acordos que ofereçam vantagens que compensem desgastes de quem é poder. Quem está na oposição grita e se articula para chegar ao poder e fazer quase que o mesmo.
Nesse processo, a polarização partidária tradicional entre partidos de centro esquerda e centro direita em todo o mundo (como seria o caso brasileiro entre PT e PSDB) podem dar espaço a propostas mais à esquerda, ou mais à direita.
Observando estas possibilidades a disputa política por apoios a uma ou outra alternativa tende a ser cada vez mais importante e também intensa. As convocações, os debates digitais nas redes sociais e também nas manifestações tendem a refletir essa busca por apoios.
Trata-se de uma disputa Política, uma luta de poderes, que evidentemente se inicia no campo das ideias (espaço mental, segundo interpretação de Lefbvre, H.) e que se espalha em toda a sociedade.
Dessa forma, argumentos como governabilidade ou rupturas são partes do atual debate político, onde as falsas moralidades, não parecem querer efetivamente mudar o que precisa ser alterado para aperfeiçoar o sistema político, mas, para oferecer melhores condições para ter ou manter o poder.
Quem tem o que perder nessa disputa tende a ter mais forças para a disputa. O esclarecimento mais ideológico das posições em disputa, mesmo que com os riscos da radicalização, pode não ser de todo ruim.
Ao longo do tempo, evitamos confrontos e conflitos, num jeito próprio de ser que o historiador Sérgio Buarque de Holanda identificou em seu livro "Raízes do Brasil (1936), como "homem cordial".
Não por outro motivos, Buarque, em suas ideias weberianas de interpretar as raízes de nossa colonização, identificou que este "homem cordial" ganhou musculatura junto do conceitos reconhecidos como patrimonialismo e burocracia. Não por coincidência, continuam também no âmago dos problemas contemporâneos.
A questão prossegue no cerne da atual disputa política, não apenas pelos desvios, mas pela cooptação e controle do Estado, mesmo fora dos governos, pelas classes dominantes, protegidas por vernizes e denominações de subsídios, apoios e construção das chamadas Condições Gerais de Produção.
Vale aqui pontuar lembrando uma análise de Buarque: "É necessário que façamos uma espécie de revolução para darmos fim aos resquícios de nossa história colonial e começarmos a traçar uma história nossa, diferente e particular". Buarque que rejeitou o fascismo e afastou a hipótese do comunismo fez a afirmação acima, num contexto em que identificava que o Brasil era um país, pacífico e brando, e eu digo, quase sempre conciliador.
Enfim, continuemos a observar e participar do ambiente e dessa disputa política em vigência. Ter posição e lutar por ela é parte da realidade.
É bom que reconheçamos essa nova realidade e ao mesmo tempo nos aprofundemos para compreender a conjuntura em que vivemos. É um ambiente conturbado, mas, a saída não é fugir da compreensão do ambiente político que estamos envolvidos.
O movimento contrário nos transformará em massa de manobra, pior dos cenários, para um futuro que na condição de povo, nos deve levar à luta pela construção de uma nova Nação Brasileira.
Sigamos em frente!
PS.: Atualizado às 13:38 para correção do texto.
65 anos, professor titular "sênior" do IFF (ex-CEFET-Campos, RJ) e engenheiro. Pesquisador atuante nos temas: Capitalismo de Plataformas; Espaço-Economia e Financeirização no Capitalismo Contemporâneo; Circuito Econômico Petróleo-Porto; Geopolítica da Energia. Membro da Rede Latinoamericana de Investigadores em Espaço-Economia: Geografia Econômica e Economia Política (ReLAEE). Espaço para apresentar e debater questões e opiniões sobre política e economia. Blog criado em 10 agosto de 2004.
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2 comentários:
Em países sérios, onde a democracia realmente funciona,(Japão, Suiça, Suécia,Coréia do Sul etc) governantes tais como : Presidentes da República, e Primeiro Ministro), a qualquer pequeno escândalo, envolvendo seus governos, renunciam aos cargos.
Portanto, aqui no Brasil, o escândalo envolvendo o governo, é gigantesco e caso fosse um país de governantes sério, ela mesma(Dilma), teria entregue o cargo. Enfim daí, não precisaria o povão se protestar pedindo seu impeachment.Ela própria deveria renunciar.
Golpe, foi o saque bilionário, que os integrantes e aliados do governo Dilma, perpetraram(consumaram), contra importantes empresas do governo, (do povo).
A visão colonizada é sempre lamentável e despossuída sequer de razão.
No sistema presidencialista (e não "países sérios") a substituição de governantes se dá com o voto nas eleições. O resto é golpe sim.
No parlamentarismo é que há mudanças quando o primeiro ministro perde apoio partidário.
Como se vê a falta de argumentos mistura desejos pessoais com a institucionalidade, onde se vê o estado como uma espécie de extensão do seu desejo e pensamento.
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