segunda-feira, julho 11, 2016

A ampliação do poder estratégico e geopolítico do Gás Natural (GNL) na matriz energética mundial


Roberto Moraes Pessanha 
Professor  do NEED/IFF, pesquisador e doutorando do PPFH/UERJ. 
Mestre pela Coppe/UFRJ.

A utilização do Gás Natural como fonte de energia é crescente e tende cada vez mais a ser ampliado, por conta não apenas do seu potencial energético, mas também do seu poder estratégico e geopolítico.

Com frequência, este autor tem tratado do assunto do Gás Natural (GN). Num texto anterior (de 23/06/2016 postado aqui no blog do autor - vide referências) foi questionada a venda da estratégica malha de gasodutos da região Sudeste do Brasil pela Petrobras. No mesmo artigo foram apontadas as tendências de crescimento do gás natural na matriz energética mundial.

Com este novo texto, o objetivo é aprofundar um pouco mais o assunto sobre o gás natural reunindo mais informações, buscando uma maior contextualização e uma breve análise, sobre os riscos e as oportunidades no campo da economia, da geopolítica e de outras dimensões.

Também já foi bastante comentado que os riscos e as oportunidades relacionadas ao GN se deve não apenas às novas reservas de gás descobertas, e em fase de exploração/produção, mas especialmente pelas possibilidades do seu transporte para uso em outros territórios.

A maior parte do gás natural consumido no mundo é ainda transportado principalmente por dutos (gasodutos) como acontece em amplas e extensas redes no continente europeu, americano e asiático.

Na comparação entre o GNL e outras formas de energia considerando a forma de transporte há que se registrar que os gasodutos e/ou a eletricidade são mais vantajosos numa distância até 3 mil quilômetros (Ronceros, P. 28). Só a partir daí o GNL tem melhor relação de custo-benefício e ainda necessita de grandes poços e volumes de produção, além de contratos de longo prazos para amortizar os altos investimentos.

Apesar do uso da liquefação do gás natural já existir desde 1941 (1ª planta comercial em Cleveland, Ohio, EUA, Ronceros, 2008, P.25), só mais recentemente, o desenvolvimento tecnológico tornou viável economicamente (mesmo que ainda com altos custos) a montagem de novas plantas. Hoje, estima-se que cerca de um terço das vendas globais de gás já se dão sob a forma de gás natural liquefeito (GNL).


Leia mais: http://br.sputniknews.com/portuguese.ruvr.ru/2013_10_11/Mercado-mundial-de-GNL-forte-crescimento-5391/

O processo, os custos e os mercados do GNL
Esquema do Sistema de GNL [1]
A unidade de processamento ao receber o gás natural (GN), extraído das reservas, transportado através de gasodutos, transforma em "trens de processamento" o gás natural para a forma líquida - Gás Natural Liquefeito (GNL ou LGN em inglês).

Para a transformação do GN em líquido (processo de liquefação) é necessário que a temperatura do gás natural seja reduzida a -161º C, com uma redução de seu volume em cerca de 600 vezes.

É sob a forma líquida (GNL) que o gás é transportado em navios especiais de LGN. Hoje, os desenvolvimentos de tecnologia e inovação para a redução de custos estão voltados para o processamento de refrigeração e troca de calor.

Esquema do processo de liquefação [1]
O gás natural liquefeito (GNL) antes do embarque necessita ser armazenado em tanques capazes de mantê-lo à mesma temperatura que o liquefez (-161º C) até o embarque nos navios.

Os projetos de GNL normalmente precisam de contratos com longos prazos entre fornecimento e aquisição para que os seus custos sejam viabilizados e garantidos.

Como referência, pode-se afirmar que a implantação de uma planta de liquefação com capacidade de 7 milhões de toneladas métricas por ano (mtpa) de GNL teria hoje um custo aproximado de US$ 3 bilhões a US$ 4 bilhões. Já as unidades de regaseificação com capacidade de 15 MMNm³/d teriam custos de instalação de aproximadamente US$ 300 milhões.

O Gás Natural (GN) é exportado em volumes diversos por quatorze países espalhados pelos continentes: Indonésia, Malásia, Argélia Nigéria, Egito, Abu Dhabi, Qatar, Oman, Líbia, Austrália, Brunei, Trinidad e Tobago, Peru e EUA. Estes países possuem hoje, mais de duas dezenas de plantas com trens de liquefação.

Atualmente, existem 38 plantas de liquefação de gás natural em 21 países. Assim, como acontece com a produção de petróleo, o Oriente Médio possui a maior capacidade de liquefação mundial, com 34% do total, sendo 25% proveniente somente do Qatar, o maior exportador do energético no mundo.

O Peru é o único país da América Latina a possuir uma planta para transformar o GN em GNL. A unidade de GNL do Consórcio Peru GNL teve um custo de US$ 4 bilhões e começou a operar em 2010 com exportação para o México e para o Canadá. 

A planta da Peru GNL tem capacidade de 4,4 milhões de toneladas/ano que processa diariamente 17 milhões de m³ de gás. O consórcio Peru LNG reúne quatro corporações: a americana Hunt Oil (50%); a espanhola Repsol-YPF (20%), a coreana SK Energy (20%) e a japonesa Marubeni (10%).

A região da Ásia é um forte mercado em que EUA e Rússia querem disputar, seja por duto ou GNL. O Japão é ainda hoje um dos maiores importadores de GNL, cerca de metade do mercado global. A Europa é a segunda maior região consumidora de GNL, especialmente o Reino Unido, Espanha e França.

A primeira exportação de GNL aconteceu em 1969 dos EUA (Alaska) para o Japão. A Coréia do Sul e crescentemente a Índia e China são outros fortes consumidores de GNL.

Segundo estimativa da Agência Internacional de Energia (AIE), a capacidade de produção de GNL alcançará até 2020, cerca de 580 milhões de toneladas por ano. Veja no mapa abaixo (2006) as origens, destinos e volumes do comércio de GNL pelo mundo que é crescente [2]:

Muitos dos navios de GNL são também unidades que podem além de transportar, regaseificar o produto e assim devolvê-lo à forma de gás natural, para o seu uso junto ao consumidor, para produzir eletricidade, em usinas termelétricas - a maior parte do uso - ou, como insumo, para outras produções industriais.

Atualmente estima-se que haja cerca de 150 navios para transporte de GNL em operação. Há vários outros sendo construídos na França e na Coréia do Sul. O primeiro navio usado para transporte de GNL aconteceu em 1959, num petroleiro adaptado, que foi do Alaska, EUA, para o Reino Unido [2].

Hoje, a capacidade normal de cada navio de GNL fica entre de 125 a 135 mil m³, que correspondem a 55 a 60 mil toneladas de GNL. Porém há com capacidade para transportar de até 153 mil m³ de GNL.

Com este recurso, esta possibilidade ampliou os projetos de extração de gás natural, considerando que agora, o seu uso pode ser expandido para além dos territórios atendidos pelos gasodutos, conforme os custos do processamento e transportes.


O GNL tem vantagem ambiental e estimativa de crescimento na matriz de consumo mundial
Como já se sabe, o GN é ambientalmente muito menos poluente e, portanto, mais sustentável, o que já é uma grande vantagem, diante dos questionamentos e metas definidas na Cop-21.

É neste contexto que se faz previsões do aumento do consumo de Gás Natural na matriz energética mundial. Segundo o relatório especial World Energy Outlook "Energy and Climate Change" (2016), em 2013, o GN era responsável por 21% da Matriz. Já em 2040, a estimativa é que o GN terá participação de 24%, se aproximando dos 26% do petróleo que terá descido dos 31% que tinha em 2013. Gráficos ao lado [3]

Esta estimativa parece bem mais consistente num prazo maior de 2040, do que as projeções da Internacional Gás Union (IGU, 2015) que indicam que, no médio prazo, haveria permanência de um período de estabilidade sobre a oferta de GNL [4].

A produção de GNL nos EUA e a estratégica ampliação do Canal do Panamá
Reforçando esta previsão, nesta última semana, os gestores do Canal de Panamá que terá sua ampliação inaugurada no próximo domingo, depois de mais de oito anos de obras e investimentos de US$ 5,4 bilhões, afirmou que até 2020, o gás natural líquido (GNL) será um dos principais produtos transportados pelo canal. [5]

Terminal de Sabrine Pass de GNL no estado de Louisiana, EUA
Este fato está muito relacionado à unidade de liquefação que a empresa americana Cheniere Energy Inc. possui na foz do Rio Sabine, quase na divisa com o estado do Texas e de frente para a parte americana das reservas de petróleo e gás do Golfo do México. [6]

Nesta região chegam gasodutos oriundo da produção de gás dos poços do Golfo do México. A Cheniere tem dois projetos de LGN. O primeiro entrou em operação em 2008 e outros ainda estão em construção, pretendendo alcançar em 2020, 9% do mercado mundial de LGN.

A partir de fevereiro deste ano, a Cheniere passou a exportar LGN, após processamentos nos trens de liquefação da unidade na Louisiana, no terminal Sabine Pass, que usa a hidrovia para alcançar a 3,7 milhas náuticas, o litoral para exportação. O projeto é grande e prevê seis trens de liquefação de gás, com uma capacidade total de 22,5 milhões de toneladas métricas por ano (mtpa).

Com a ampliação do Canal do Panamá, a exportação do LGN por esta passagem ampliará o mercado da empresa americana que hoje atende empresas espanholas, francesas e outras.

Veja no mapa abaixo (clique sobre ele para ver em tamanho maior) a localização dos estados da Louisiana e Texas, mais o Panamá e observe como o acesso à Ásia e mesmo ao lado oeste da América do Sul fica facilitado para o transporte de LGN.

Do autor.

A região do Texas produziu em 2015, cerca de 27% de todo o gás natural extraído nos EUA, incluindo o de xisto (shale gas) [6]. 

Com o preço do barril de petróleo voltando ao patamar dos US$ 50, o barril, a produção de óleo e gás na parte americana do Golfo do México (Texas e Louisiana) voltou a crescer e está compensando, em parte, a perda produção de óleo e gás de xisto (shale) americana. Sobre esta questão, é importante ressaltar que os preços do LGN guardam relação com os preços do barril de petróleo e com as duas fases do ciclo petro-econômico, expansão e colapso. 

As unidades de liquefação de gás natural (GN) como já visto são muito caras e por isto existem poucas no mundo, enquanto o processo de regaseificação é mais barato, o que facilita, de certa forma, o uso dos compradores.

Além disso, estas unidades e seus reservatórios, por conta das exigências do processo e da circulação do produto, necessitam estar instaladas próximas aos sistemas portuários.


O GNL no Brasil e seu poder geopolítico 
O Brasil, através da Petrobras possui três unidade de regaseificação uma no Rio, Bahia e Ceará que a estatal colocou à venda junto das Usinas Termelétricas (UTEs) que consomem o GN para produzir energia elétrica.

Antes desta fase de colapso dos preços do petróleo e do gás, a Petrobras chegou a cogitar, junto com parceiros projetar uma unidade offshore de liquefação para exportação do GN produzido no campo de Libra.

Hoje, o Brasil possui mais capacidade de produção e disponibilidade de GN do que capacidade de escoamento e distribuição para consumo, incluindo o contrato de importação da Bolívia que vence em 2019.

No Brasil, o processamento de gás natural foi enormemente ampliado na Unidade de Tratamento de Gás de Cabiúnas (UTGCAB) instalada em Macaé que se tornou o maior polo de processamento de GN do Brasil.

No início, o Terminal de Cabiúnas processava apenas o GN da Bacia de Campos, agora, está conectado ao gasoduto Rota 2 e já processa o GN da Bacia de Santos e do Pré-sal. Além disso, em breve com a construção do gasoduto Rota 3 uma unidade de processamento de GN (UPGN) será instalada junto ao Comperj em Itaboraí.

Além disso, a Agência Nacional de Petróleo (ANP) está mapeando áreas com potencial para armazenamento de gás, investidores interessados em serviços de estocagem e também empresas interessadas em prestar estes serviços. A estocagem de GN é uma forma eficiente de compensar produção inconstante de alguns campos produtores.

O Brasil não possui estocagens de gás. Não se está falando de reservatórios que apenas servem para temporárias transferências de produto. A União Europeia (UE) possui uma capacidade de armazenamento equivalente a 25% do seu consumo. Para isso, a ANP organiza estas informações para preparar um processo licitatório para conceder campos maduros – já devolvidos à União ou em processo de devolução – e com potencial para serem usados para estes armazenamentos de gás natural. [7]

Mapa de parte dos gasodutos Rússia - Europa
Os dados acima mostram o avanço que a extração, processamento, transporte e uso do gás natural está tendo em todo o mundo, tornando o combustível extremamente estratégico para as nações produtoras.

Além desta ampliação, a facilidade com a exportação pelo uso do LGN está permitindo que a geopolítica tenha peso nesta relações que deixam de ser apenas comerciais.

Até há pouco tempo todo o gás usado nos países da Europa eram supridos basicamente por gasodutos. A maioria com origem nas reservas da Rússia e dos países árabes.

Com o transporte do LGN por navios, os EUA já está forçando para baixo e pressionado o preço do gás oferecido pela Rússia à Espanha e França. Assim, tentará repetir com o gás, o processo que ajudou levar ao colapso dos preços do barril de petróleo em todo o mundo. De outro lado, a Rússia segue planos de construir as plantas de produção de GNL para enfrentar esta disputa com uso dos navios de GNL e para além dos gasodutos.

No 05 de Julho de 2016 o jornal americano Wall Street Journal trouxe a manchete: "Exportações de propano amenizam crise no setor petrolífero nos EUA". A matéria reforça a tese, tanto sobre a capacidade de produção, quanto de exportação de gás dos EUA. Além disso, também aponta para o incremento que tudo isto terá com o uso do canal do Panamá, agora duplicado, facilitando o acesso aos mercados do Oeste da América Latina e da Ásia, como foi comentado anteriormente. [8]

Veja abaixo os gráficos que acompanham a matéria sobre produção, exportação e mercados, assim como da expectativas até o ano de 2018. A reportagem informa que o propano é um subproduto da exploração de GN, que nos EUA cresceu junto com o boom da exploração de gás natural em formações de xisto e que também pode ser transformado em líquido para transporte, se tornando uma solução prática para a exportação. A matéria do WSJ cita ainda que: "a produção de propano extraído do xisto era tamanha que, às vezes, os produtores precisavam pagar para os clientes ficarem com o produto". [8]



Do lado, russo, a empresa Gazprom tem um projeto Vladivostok-GNL, com capacidade de produção de cerca de 15 milhões de toneladas GNL por ano, com uma unidade em Primorie e outra na região de Leningrado. O colapso dos preços do petróleo e do gás, a partir de 2014, impôs o adiamento destes projetos, assim como em outros, em diversas partes do mundo. [9]

A ampliação dos acordos em diversos níveis e dimensões entre a Rússia e a China também se estendem cada vez mais à área de energia, com o petróleo e o gás. No setor avançam as conversas para que o comércio de petróleo aconteçam em suas próprias moedas (rublo e/ou yuan), sem depender do dólar americano.

Entre março e maio último (2016), a Rússia ultrapassou a Arábia Saudita como o maior fornecedor de petróleo da China, sendo seguido do Catar, Iraque e Irã. Em nova rodada bilateral de negociações de 24 a 26 de junho de 2016, na visita do presidente russo Vladímir Pútin ao presidente chinês Xi Jinping, eles discutiram projetos em diversas áreas e celebraram 30 acordos de parcerias e quanto a assuntos: militares, econômicos e diplomáticos. [10]

Entre os acordos anunciados um dos mais importantes está exatamente na área de gás natural, o que reforça a hipótese principal deste texto-análise, sobre a ampliação da importância estratégica e geopolítica do gás natural dentro da matriz energética mundial.

O memorando assinado no sábado (25/06/2016) em Pequim, pelos presidentes da gigante russa Gazprom, Aleksêi Miller, e da China National Petroleum Corporation (CNPC), Wang Yilin, estabeleceu a criação de uma joint venture para a produção de gás e armazenamento subterrâneo de gás natural no território chinês, segundo comunicado divulgado pela Gazprom. Eles se propõem a fazer análise das condições geológicas, tecnológicas e econômicos nas cidades chinesas Daqing, Jiangsu e Baiju para avaliar a possibilidade de construção dos reservatórios. O acordo também prevê projetos para a geração de energia com a construção de termelétricas.

Nesta mesma ocasião, o Grupo de Gás de Pequim confirmou a aquisição de 20% da subsidiária de gás da russa Rosneft, a VCNG. Além disso, o acordo bilateral reforçou a decisão da China em financiar a conclusão do projeto russo de GNL Yamal, na Sibéria. Juntos o Banco de Desenvolvimento Chinês (estatal) e o China Ex-Im resolveram financiar com US$ 12 bilhões o Yamal LNG em que o estado chinês já possuía 299%, a francesa Total, 20% e a companhia privada russa OAO Novatek 50,1%. A planta da Yamal tem previsão de produzir e transportar GNL a partir de 2017.

Estes acordos avançam em relação a outros entendimentos anteriores. Em maio de 2014, a empresa russa Gazprom e a chinesa CNPC assinaram um contrato de US$ 400 bilhões para fornecimento de gás à China pela rota oriental para os próximos 30 anos, que prevê o envio de 38 bilhões de metros cúbicos de gás russo por ano, através do gasoduto “Poder da Sibéria”. Na mesma linha, em novembro de 2014, as mesmas empresas assinaram outro acordo também para o fornecimento de gás natural da Rússia à China, só que através da rota ocidental. Segundo, os mesmos o abastecimento por esta via de gasoduto, só será possível a partir de 2020, com capacidade estimada de 30 bilhões de metros cúbicos ao ano. [10]

Em termos geopolíticos é possível identificar que o Gás Natural tem um enorme peso entre as nações com maior peso econômico, político e militar no mundo: EUA, China e Rússia. Os EUA e a Rússia como produtores e a China, mais o restante da Ásia como consumidores desta fonte energética que já está tendo a sua produção, distribuição e consumo ampliado no mundo.

Este é um fato novo, mesmo que de alguma forma relacionado à produção e ao uso do petróleo. O GN e o petróleo possuem ciclos que guardam similaridades, mas que são distintos em vários outros itens, inclusive e em especial na questão ambiental. O transporte do gás natural por liquefação (LGN) em condições hoje mais baratas que antes para longas distâncias (acima de 3 mil quilômetros) está criando novas possibilidades.

A relação entre a Rússia e a China ampliada, não apenas pelo Brics e seu banco, mas pelas condições geopolíticas e no aparente alinhamento para confronto e disputa contra a hegemonia americana, também explica a opção por duas vias de transporte (pelo lado do ocidente ou oriente), além da opção marítima para o fornecimento e distribuição do gás natural russo para a China.

É no meio desta realidade, que as reservas do pré-sal brasileiro com importante potencial de gás natural, junto com o alinhamento do Brics e das relações de complementariedade econômicas entre estas nações gera pressões, marchas e contramarchas oriundas dos EUA.


Considerações finais:
Diante de todo este quadro do mercado global de energia, incluindo o GNL é que se deve observar e analisar a situação do Brasil e sua estatal Petrobras, em relação à produção, logística de transporte e distribuição desta fonte de energia, seja para consumo interno, ou, eventualmente e de forma complementar, também para exportação dos excedentes produzidos.

Considerando todo este cenário e ainda avaliando que o uso do GN é muito mais interessante, para o uso interno no território nacional, do que o petróleo, por conta do peso da matriz energética nacional é que as decisões que aí acontecem têm peso estratégico e também geopolítico.

O quadro exposto no plano global permite que se compreenda em detalhes a importância estratégica do GNL para o Brasil e sua matriz energética, mesmo sabendo que há um forte vinculação entre o ciclo econômico do petróleo e do GN determinado pelos valores de ambos no mercado mundial.
Ambos estão pressionados pela disputa com os renováveis por conta dos subsídios governamentais estimulados pelas decisões da Cop-21. Em função também disto, o GN tende a ampliar seu poder na matriz energética mundial.

É neste contexto que deve ser vista com imprópria, ou inaceitável, a decisão da Petrobras (e do país), em se desafazer de suas bases instaladas, na área de gás natural. Observe-se que a intenção não se trata nem de abrir, complementarmente à iniciativa privada, a extração, processamento e até o transporte de GN, mas entregar o que já está pronto. A maior parte da distribuição já é operada pelo setor privado.

Os novos gestores da estatal estão em fase de negociação da Malha de gasodutos do Sudeste (NTS) e do controle de sua subsidiária, a Transportadora Associada de Gás (TAG) que detém a infraestrutura de dutos da regiões Norte e Nordeste. Juntas, as duas empresas representam 81% de toda a malha de gasodutos, hoje, em operação hoje no país. [10]

O governo interino do Michel Temer já anunciou a decisão de fazer revisão da Lei do Gás para, segundo palavras do ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho “adequar a legislação atual sancionada em 2009 para um provável novo cenário de predomínio de agentes privados no setor”. [10]

A falta de regulação atual no setor é derivado da atuação exclusiva da Petrobras de forma monopolística no setor. O objetivo das mudanças - de forma rápida - é a de tirar a Petrobras de sua atuação como operadora dos gasodutos de transportes, abrindo espaços para a entrada do setor privado neste setor já estruturado. [11]

A decisão é estrategicamente equivocada e poderá vir a contribuir para que esta malha de transportes, nas mãos do setor privado, interfira no valor das tarifas do transporte, inviabilizando a produção em algumas reservas nacionais, por conta de interesses geopolíticos, que hoje operam no gás, da mesma forma, como atuam no mercado mundial de petróleo.

Não há como sustentar tais posições diante da realidade dos dados expostos sobre o mercado mundial de óleo e do gás diante da geopolítica da energia.

A despeito dos discursos contrários e do desejo de evolução, em tempo mais rápido que o possível, das formas ainda chamadas de alternativas e renováveis de geração de energia, o petróleo e o gás natural, até 2040/2050, ainda serão muito disputadas.

E como a previsão para este período é o crescimento do uso de GN em relação ao petróleo [3], será esta forma de energia que ampliará a sua condição estratégica na geopolítica da energia.

Considerando a geopolítica como uma forma de uma nação controlar outras, pode-se inferir que neste contexto, o Gás Natural (GN), assim como acontecia com o petróleo continuará a ser um importante campo de disputa por hegemonias, ou dependências.

Desta forma, as nações não devem abrir mão dos seus interesses e devem planejar as suas matrizes considerando todo este emaranhado de interesses que envolve a geografia das corporações que atuam como se o mundo fosse um único espaço, sem limites ou fronteiras.

O planejamento dos interesses das nações pode prever a atuação de suas estatais e mesmo das empresas privadas nacionais. Neste sentido, o existência de grandes empresas estatais atuando no setor de forma integrada - da origem (extração) até a ponta do sistema – é uma vantagem da qual não se pode e nem deve abrir mão, considerando o cenário aqui elencado e analisado.

Os “think tanks” brasileiros devem prosseguir nesta observações, produzindo análises e divulgando conhecimentos sobre este setor estratégico. Só assim, a nação planejará as transformações para um futuro de inclusão social e menos desigualdades.

Notas, fontes e referências:

[1] Site GasNet. De Luis Olavo Dantas. Disponível em: http://www.gasnet.com.br/gnl_descricao.asp.

[2] RONCEROS, G. Nesttor. 2008. Dissertação de Mestrado em Engenharia Mecânica, Puc-Rio. Processo de Liquefação do Gas Natural APCI C3MR. Rio de Janeiro.

[3] World Energy Outlook "Energy and Climate Change", 2016. Disponível em: https://www.iea.org/publications/freepublications/publication/WEO2015SpecialReportonEnergyandClimateChange.pdf.

[4] International Atomic Energy Agency (IAEA). Nuclear Power Reactors in the World.IAEA-RDS-2/35.Vienna, 2015.

[5] PARIS, Costas et. ali. WSJ 18/06/2016. Canal do Panamá ampliado chega em meio a crise. Disponível em: http://br.wsj.com/articles/SB10757983977900314237804582139444171167390.

[6] Site da Cheniere Energy Inc.. Disponível em: http://www.cheniere.com/.

[7] Matéria do Valor em 24/06/2016, P. A2. Ramalho, André. ANP busca investidores para a área de estocagem. Disponível em: http://www.valor.com.br/brasil/4612837/anp-busca-investidores-para-area-de-estocagem.

[8] Matéria do Wall Street Journal em 05/07/2016. DEZEMBER, Ryan e PUKO, Timothy. Exportações de propano amenizam crise no setor petrolífero nos EUA". Disponível em: http://br.wsj.com/articles/SB12178757771758574323704582169572167495952?tesla=y.
[9] Site Agência de Notícia Sputink. Disponível em:http://br.sputniknews.com/portuguese.ruvr.ru/2013_10_11/Mercado-mundial-de-GNL-forte-crescimento-5391/.

[10] Portal Gazeta Russa, 27/06/2016. Rítsar, Pavel. Em Pequim, Pútin e Xi Jinping assinam 30 acordos bilaterais - Contratos assinados após reunião entre líderes da Rússia e China incluem setores como comércio, infraestrutura, tecnologia, agricultura, finanças e energia. Disponível em: http://gazetarussa.com.br/politica/2016/06/27/em-pequim-putin-e-xi-jinping-assinam-30-acordos-bilaterais_606603.

[11] Matéria do Valor em 24/06/2016, P. A2. Rittner, Daniel. Venda de ativos da Petrobras impõe revisão da Le do Gás, diz ministério. Disponível em: http://www.valor.com.br/brasil/4612835/venda-de-ativos-da-petrobras-impoe-revisao-da-lei-do-gas-diz-ministerio.


Blog do Roberto Moraes - Acervo - Postagens mais recentes sobre Gás Natural:

Em 23 de junho de 2016:
"A venda da malha dos gasodutos do Sudeste pode bagunçar o mercado". Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2016/06/a-venda-da-malha-dos-gasodutos-do_23.html.

Em 22 de maio de 2016:
Petrobras ratifica posição sobre sua base operacional em Macaé que o blog havia analisado. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2016/05/petrobras-ratifica-posicao-sobre-sua.html.

Em 15 de Maio de 2016:
Gasoduto que interliga Pré-sal da Bacia de Santos ao Terminal de Cabiúnas em Macaé é simbólico e inverte relação que havia com o óleo entre o RJ e SP. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2016/05/gasoduto-que-interliga-pre-sal-da-bacia.html.

Em 3 de Maio de 2016:
Discussão sobre a crise em Macaé tem prioridade invertida. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2016/05/discussao-sobre-crise-em-macae-tem.html.

Em 7 de abril de 2016:
O crescimento do gás na matriz de energia do Brasil, seus significados em várias dimensões, inclusive a geopolítica. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2016/04/o-crescimento-do-gas-na-matriz-de.html.

Em 21 de fevereiro de 2016:
E a caravana passa: Petrobras coloca em operação + um FPSO e seu maior gasoduto submarino - Rota 2. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2016/02/e-caravana-passa-petrobras-coloca-em.html.

Em 30 de novembro de 2015:
Gás natural para refrigeração é inovação tecnológica já em uso e referência para aplicações mais nobres. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2015/11/gas-natural-para-refrigeracao-e.html.

Em 30 de abril de 2015:
Prumo anuncia projetos de gás para o Açu. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2015/04/prumo-anuncia-projetos-de-gas-para-o-acu.html.

PS.: Até 13/07/2016 às 11:50, este artigo estava postado junto da nota "A Petrobras não para de bater recordes em produção, enquanto o governo golpista prepara a venda em partes da estatal". O blog resolveu desmembrar os textos em duas notas. A nota referida acoma pode ser lida no link abaixo: http://www.robertomoraes.com.br/2016/07/a-petrobras-nao-para-de-bater-recordes.html.

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