Interessante este conceito de crise que se quer atribuir só à Petrobras entre outras petrolíferas mundo afora, sem considerar a fase de baixa do ciclo petro-econômico. Com os dados soltos e jogados ao vento se constrói qualquer discurso. Vamos a um dos exemplos.
A anglo-holandesa Royal Dutch Shell, uma das sete irmãs do setor de petróleo. A Shell tem uma dívida de US$ 75,1 bilhões (apenas 20% menor do que a da Petrobras). A Shell possui muito menos reservas e ativos que a estatal brasileira, por isso comprou a petroleira britânica BG, para ter os ativos que esta possui no pré-sal do Brasil.
Assim, a Shell passou a ser a segunda em ativos no pré-sal brasileiro, só atrás da Petrobras. A estatal norueguesa Statoil saiu às compras para ficar como a 3ª maior operadora do pré-sal brasileiro. As duas estão satisfeitas com esta realidade.
A Shell divulgou na segunda-feira a queda de 93% em seu lucro no segundo trimestre deste ano, caindo para US$ 239 milhões em relação a 2015.
Tem mais. Veja no gráfico abaixo, que em meio não só à crise do preço do barril de petróleo, mas à operação lava jato, o lucro bruto da Petrobras (sem as baixas contábeis) em comparação a algumas outras importantes petroleiras do mundo. Na soma de 2014 e 2015 só ficou atrás da Esso.
E tudo isso sem olhar os atuais resultados da Petrobras. Ao contrário da grande maioria das petroleiras, a estatal continua a aumentar sua produção total de óleo e gás, a reduzir custos de produção e aumentar a produtividade no pré-sal, etc.,como demonstra os dados de produção de junho, anunciados ontem pela ANP e informado aqui pelo blog.
Observe ainda que a Petrobras está na frente da Shell que em pleno início da fase de colapso aumentou seu endividamento em 190% só para adquirir a BG por US$ 60 bilhões e segue animada, especialmente pelo potencial que tem para crescer e lucrar no Brasil.
Enquanto isso, "os gênios do mercado" repetem como um mantra que a Petrobras tem que fazer desinvestimentos (eufemismo* para venda ou entrega) de empresas e ativos, no valor total de pelo menos US$ 15 bilhões, só este ano, sem olhar a realidade geral do setor petróleo no mundo, que já começou a se preparar para um novo ciclo petro-econômico.
Eles só nadam de braçada e inventam suas narrativas onde impera a ignorância e a falta de articulação entre os dados e fatos para se interpretar a realidade. Tudo é muito claro e nem necessita de muitos argumentos. Continuamos acompanhando.
PS.: Atualizado às 18:28: Para corrigir a figura de linguagem citada* no penúltimo parágrafo. A figura de linguagem a que queria referir era eufemismo e não pleonasmo como saiu no texto original. O blog agradece a correção no comentário da Valéria Paz no perfil do Facebook.
65 anos, professor titular "sênior" do IFF (ex-CEFET-Campos, RJ) e engenheiro. Pesquisador atuante nos temas: Capitalismo de Plataformas; Espaço-Economia e Financeirização no Capitalismo Contemporâneo; Circuito Econômico Petróleo-Porto; Geopolítica da Energia. Membro da Rede Latinoamericana de Investigadores em Espaço-Economia: Geografia Econômica e Economia Política (ReLAEE). Espaço para apresentar e debater questões e opiniões sobre política e economia. Blog criado em 10 agosto de 2004.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
6 comentários:
Bom dia Roberto.
Seria possível divulgar as fontes utilizadas para realizar essa análise.
Obrigado
Fábio
Caro Fábio, a análise remete a uma ampla pesquisa documental sobre o tema que envole a relação petróleo-porto na Economia Global.
Nesta nota em especial, eu utilizei como referência uma matéria do The Wall Street Journal em 29/07/2016, e uma apresentação na Comissão Especial PL Nº 4567/2016 em 12/04/2016, so Paulo Cesar Ribeiro de Lima, consultor Legislativo.
Roberto, poderia postar aqui os links para as fontes?
Caro Fábio.
A informação sobre a dívida acumulada da Shell está numa coluna do WSJ que o Valor republica, mas não está acessível pela internet. Pelo menos que eu saiba. Mas pode ser localizado no Valor, 27/07/2016, P. B11.
Ou ainda, ligada à Shell você pode ver outras informações sobre as resultados do trimestre de importantes petroleiras, incluindo na Shell e outras, nesta matéria do link abaixo do Valor de 03/08/2016, P. B2:
http://www.valor.com.br/empresas/4656789/petroleo-cai-e-afeta-lucro-das-petroleiras
A apresentação do Paulo Cesar Lima pode ser acessada no link abaixo:
http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-temporarias/especiais/55a-legislatura/pl-4567-16-petrobras-e-exploracao-do-pre-sal/documentos/audiencias-publicas/PauloCsarLimaApresentaoComissoEspecialPL45672016rev3.pdf
Qual o custo da dívida da Shell? Provavelmente eh muito menor que o da Petrobras.
Os custos da dívida, o caixa, o que é dívida de longo prazo, em moeda local e em dólar, tudo isto pode ter diferenças, mas não como a que se coloca como se uma estivesse no inferno e outra no céu.
Há ainda o volume de reservas que uma e outra possuem, que é bem mais favorável para a Petrobras, porque elas demonstram lastros. O nível de integração da companhia da extração à distribuição de derivados que oferece maior capacidade para conviver com dificuldades em menos diversos.
O nível de tecnologia para atuar nas novas fronteiras exploratórias (como águas profundas e o pré-sal). O mercado interno de derivados que oferece a maior parte dos lucros, etc. Tudo isso oferece maior ou menor lastros, mesmo nesta fase de colapso dos preços.
A não ser que o viés e o interesses seja a dilapidação e o entreguismo.
Postar um comentário