O esgarçamento do capitalismo contemporâneo parece estar levando
o mundo ao rumo de uma civilização excludente e para poucos e isto começa a
espantar cada vez mais pessoas e autoridades, mesmo nas nações mais
desenvolvidas.
O sentimento de que podemos estar no fim de um “período entre
guerras”, com a assunção da plutocracia que assume as rédeas da democracia,
tornada não compatível com o capitalismo cada vez mais desigual.
Assim, depois de vários outros estudiosos, agora, por
incrível que possa parecer, foi o Fundo Monetário Internacional (FMI) - a
partir de seu mais recente estudo – que afirmou publicamente e de forma taxativa
que “o excesso de desigualdade pode corroer a coesão social, levar à
polarização e, em última instância, reduzir o crescimento da economia”.
O FMI, através de sua diretora-gerente Christine Lagarde argumentou
em reunião de cúpula junto com o Banco Mundial que “os países desenvolvidos
podem compartilhar prosperidade de maneira mais equilibrada, sem sacrificar o
crescimento, ao transferir um ônus do imposto de renda para os riscos”. Assim o
FMI defendeu a taxação dos mais ricos e a redistribuição de renda nos países
desenvolvidos.
Desta forma, por incrível que possa parecer, o FMI parece
agora querer rever muitas de suas receitas, por julgar que a frustação desigual
dos frutos do livre comércio e da desregulação do capital e relaxamento das
fronteiras estaria levando o mundo para posições de enorme risco ao capitalismo
que deseja preservar. O FMI qualificou ainda que “o aumento da desigualdade de
renda representa uma ameaça à recuperação econômica dos últimos dez anos (se
referindo a crise pós-2008).
Com os riscos Trump e do BRexit, há um ano, editor
do Financial Times já tinha mesmo temor
O espanto não é menor e nem tão distante no tempo assim. Há
pouco mais de um ano eu escrevi aqui no blog, sobre os limites do capitalismo, republicando um artigo do Martin Wolf, conhecido editor e principal analista de
economia do jornal The Financial Times. O mesmo Wolf que esteve há cerca de dez dias
no Brasil, num evento sobre a economia global realizada pelo Valor/Santander.
Martin no seu artigo de setembro de 2016, descrevia as
tensões entre o capitalismo e a democracia e se perguntava se seria duradouro o
casamento entre a democracia liberal e capitalismo mundial. Wolf disse mais ao identificar
as tensões entre democracia e capitalismo: “a democracia é igualitária. O
capitalismo é desigual, pelo menos em termos de resultados” ... Hoje, porém, o
capitalismo está se defrontando com dificuldades muito maiores para gerar esses
avanços de prosperidade. Ao contrário, são crescentes as evidências de
desigualdade e declínio do crescimento da produtividade. Essa poção
venenosa torna a democracia intolerante e o capitalismo, ilegítimo.”
Wolf no mesmo texto reconheceu que o capitalismo
contemporâneo é mundial e buscou apoio nas posições do professor Dani Rodrik,
da Universidade de Harvard, que defendia que “a globalização restringe a
autonomia nacional. Ele escreve que "democracia, soberania nacional e
integração econômica mundial são incompatíveis entre si: podemos combinar
quaisquer dois dos três, mas nunca todos os três simultânea e
integralmente".
Ao apontar para o futuro, Wolf defendeu que “a legitimidade
dos nossos sistemas políticos democráticos, as políticas econômicas precisam
ser orientadas visando a promoção dos interesses de muitos, e não de poucos...”
Ao temer que estamos caminhando para o esgarçamento Wolf finalizou: “se não
conseguirmos fazê-lo, a base de nossa ordem política provavelmente naufragará.
Isso não seria bom para ninguém. O casamento da democracia liberal com o
capitalismo precisa ser estimulado. Não deve ser visto como algo assegurado.”
Interessante observar que os argumentos do FMI e do editor
do Financial Times temendo pelo futuro do capitalismo e da democracia clamem
pela redução das desigualdades, enquanto no Brasil atual, se revive o
neoliberalismo ainda mais exacerbado que o laboratório dos “Chicago-boys” no
Chile na década de 70.
Diante de nossa atual realidade política com a trama
parlamentar-jurídica-midiática que deu o golpe e sustenta os “bolsomitos” e os “dorianos”,
as posições do Financial Times e do FMI mais se parecem a um discurso de
esquerda marxista revolucionário e não reformista, mesmo que seja evidente que
o FMI quer apenas dosar e administrar os conflitos.
O controle que o mercado faz do governo (poder político) que
alçou com o golpe planejado e em curso no Brasil, faz com que tenhamos passado
a ser no mundo o maior “case” do ultraliberalismo de mercado que capturou por
completo o poder político.
O quadro é tão estranho que nos faz sugerir que poderemos
estar, paradoxalmente, diante de mudanças mais acentuadas. Não se trata apenas de
mais uma crise, como parte do capitalismo e dos ciclos sistêmicos de
acumulação.
É possível que estejamos diante dos limites do capitalismo determinado
pelo alto grau de aspiração dos recursos produtivos pelo sistema financeiro,
mas especialmente, pelo nível sem igual de desigualdade de renda e de exclusão
da maior parte da população do planeta.
A ideia de progresso e contínua evolução em termos
civilizatórios é um engodo. Nada nos garante este destino, como algo inexorável
e sem luta. Muita luta. A se manter este movimento, eles nos conduzirá para uma
civilização excludente com a maioria abandonada pelo poder e por sua forma de
mediação chamada de democracia.
Na realidade, a democracia através do capitalismo foi se
tornando não uma forma de mediação da vida em sociedade com a participação de
todos na ágora, mas apenas e tão somente, um conceito cada vez mais abstrato, distante,
vago e irreal da vida em sociedade.
Outro mundo é possível, mas como sempre, não virá sem luta.
Muita luta!
Um comentário:
No Brasil a manutenção há uma elite política que é medíocre e depende dessa exploração para perpetuar e reproduzir no poder.Aqui nunca tivemos um projeto de país porque a elite política nacional nunca teve autonomia para isso porque eles dependem de que o país seja explorado pelo capital financeiro internacional, com representações nacionais, para perpetuar no poder garantido também a continuidade da exploração do trabalhador no país. È claro e evidente que a internacionalização das movimentações financeiras com a desregulamentação do mercado torna vulneráveis todas as economias dependentes como é a do Brasil, porém, aqui no Brasil, o capital financeiro nunca encontrou resistência da elite política em explorar a riqueza nacional.
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