sábado, outubro 14, 2017

Quem diria, até o FMI teme pelo limites do capitalismo

O esgarçamento do capitalismo contemporâneo parece estar levando o mundo ao rumo de uma civilização excludente e para poucos e isto começa a espantar cada vez mais pessoas e autoridades, mesmo nas nações mais desenvolvidas.

O sentimento de que podemos estar no fim de um “período entre guerras”, com a assunção da plutocracia que assume as rédeas da democracia, tornada não compatível com o capitalismo cada vez mais desigual.

Assim, depois de vários outros estudiosos, agora, por incrível que possa parecer, foi o Fundo Monetário Internacional (FMI) - a partir de seu mais recente estudo – que afirmou publicamente e de forma taxativa que “o excesso de desigualdade pode corroer a coesão social, levar à polarização e, em última instância, reduzir o crescimento da economia”.

O FMI, através de sua diretora-gerente Christine Lagarde argumentou em reunião de cúpula junto com o Banco Mundial que “os países desenvolvidos podem compartilhar prosperidade de maneira mais equilibrada, sem sacrificar o crescimento, ao transferir um ônus do imposto de renda para os riscos”. Assim o FMI defendeu a taxação dos mais ricos e a redistribuição de renda nos países desenvolvidos.

Desta forma, por incrível que possa parecer, o FMI parece agora querer rever muitas de suas receitas, por julgar que a frustação desigual dos frutos do livre comércio e da desregulação do capital e relaxamento das fronteiras estaria levando o mundo para posições de enorme risco ao capitalismo que deseja preservar. O FMI qualificou ainda que “o aumento da desigualdade de renda representa uma ameaça à recuperação econômica dos últimos dez anos (se referindo a crise pós-2008).


Com os riscos Trump e do BRexit, há um ano, editor do Financial Times já tinha mesmo temor 
O espanto não é menor e nem tão distante no tempo assim. Há pouco mais de um ano eu escrevi aqui no blog, sobre os limites do capitalismo, republicando um artigo do Martin Wolf, conhecido editor e principal analista de economia do jornal The Financial Times. O mesmo Wolf que esteve há cerca de dez dias no Brasil, num evento sobre a economia global realizada pelo Valor/Santander.

Martin no seu artigo de setembro de 2016, descrevia as tensões entre o capitalismo e a democracia e se perguntava se seria duradouro o casamento entre a democracia liberal e capitalismo mundial. Wolf disse mais ao identificar as tensões entre democracia e capitalismo: “a democracia é igualitária. O capitalismo é desigual, pelo menos em termos de resultados” ... Hoje, porém, o capitalismo está se defrontando com dificuldades muito maiores para gerar esses avanços de prosperidade. Ao contrário, são crescentes as evidências de desigualdade e declínio do crescimento da produtividade. Essa poção venenosa torna a democracia intolerante e o capitalismo, ilegítimo.”

Wolf no mesmo texto reconheceu que o capitalismo contemporâneo é mundial e buscou apoio nas posições do professor Dani Rodrik, da Universidade de Harvard, que defendia que “a globalização restringe a autonomia nacional. Ele escreve que "democracia, soberania nacional e integração econômica mundial são incompatíveis entre si: podemos combinar quaisquer dois dos três, mas nunca todos os três simultânea e integralmente".

Ao apontar para o futuro, Wolf defendeu que “a legitimidade dos nossos sistemas políticos democráticos, as políticas econômicas precisam ser orientadas visando a promoção dos interesses de muitos, e não de poucos...” Ao temer que estamos caminhando para o esgarçamento Wolf finalizou: “se não conseguirmos fazê-lo, a base de nossa ordem política provavelmente naufragará. Isso não seria bom para ninguém. O casamento da democracia liberal com o capitalismo precisa ser estimulado. Não deve ser visto como algo assegurado.”

Interessante observar que os argumentos do FMI e do editor do Financial Times temendo pelo futuro do capitalismo e da democracia clamem pela redução das desigualdades, enquanto no Brasil atual, se revive o neoliberalismo ainda mais exacerbado que o laboratório dos “Chicago-boys” no Chile na década de 70.

Diante de nossa atual realidade política com a trama parlamentar-jurídica-midiática que deu o golpe e sustenta os “bolsomitos” e os “dorianos”, as posições do Financial Times e do FMI mais se parecem a um discurso de esquerda marxista revolucionário e não reformista, mesmo que seja evidente que o FMI quer apenas dosar e administrar os conflitos.

O controle que o mercado faz do governo (poder político) que alçou com o golpe planejado e em curso no Brasil, faz com que tenhamos passado a ser no mundo o maior “case” do ultraliberalismo de mercado que capturou por completo o poder político.

O quadro é tão estranho que nos faz sugerir que poderemos estar, paradoxalmente, diante de mudanças mais acentuadas. Não se trata apenas de mais uma crise, como parte do capitalismo e dos ciclos sistêmicos de acumulação.

É possível que estejamos diante dos limites do capitalismo determinado pelo alto grau de aspiração dos recursos produtivos pelo sistema financeiro, mas especialmente, pelo nível sem igual de desigualdade de renda e de exclusão da maior parte da população do planeta.

A ideia de progresso e contínua evolução em termos civilizatórios é um engodo. Nada nos garante este destino, como algo inexorável e sem luta. Muita luta. A se manter este movimento, eles nos conduzirá para uma civilização excludente com a maioria abandonada pelo poder e por sua forma de mediação chamada de democracia.

Na realidade, a democracia através do capitalismo foi se tornando não uma forma de mediação da vida em sociedade com a participação de todos na ágora, mas apenas e tão somente, um conceito cada vez mais abstrato, distante, vago e irreal da vida em sociedade.

Outro mundo é possível, mas como sempre, não virá sem luta. Muita luta!

Um comentário:

Márcio Beraldo disse...

No Brasil a manutenção há uma elite política que é medíocre e depende dessa exploração para perpetuar e reproduzir no poder.Aqui nunca tivemos um projeto de país porque a elite política nacional nunca teve autonomia para isso porque eles dependem de que o país seja explorado pelo capital financeiro internacional, com representações nacionais, para perpetuar no poder garantido também a continuidade da exploração do trabalhador no país. È claro e evidente que a internacionalização das movimentações financeiras com a desregulamentação do mercado torna vulneráveis todas as economias dependentes como é a do Brasil, porém, aqui no Brasil, o capital financeiro nunca encontrou resistência da elite política em explorar a riqueza nacional.