para falar e resumir a minha interpretação sobre as vantagens e desvantagens do Porto do Açu. Agora no dia 20 de fevereiro de 2018, eu fui ver o link e identifiquei que o mesmo saiu do ar e não mais existe.
Sim pode ser uma coincidência. Ou não. Na verdade a entrevista foi publicad apelo site
no dia 1 de fevereiro de 2016. Mas, eu só repercuti a mesma no meu perfil do Facebook, no dia 20 de fevereiro de 2016 com os comentários abaixo.
Foram apenas seis perguntas, mas as respostas acabaram gerando quase o dobro de páginas com as extensas respostas (sic). A entrevista foi feita por duas jornalistas, Jaciara Gomes e Julia Assis que na ocasião atuavam no
.
Considerando que muito do que foi falado ainda vale ser refletido, embora eu já tenha avançado nas pesquisas e nas interpretações sobre a implantação e desenvolvimento deste projeto, embora a gênese do processo não tenha se alterado.
Assim, o blog decidiu republicar a entrevista abaixo, apenas sugerindo que ela deva ser lida no contexto histórico em que foi escrita.
Quem se interessar pelo assunto pode também ver uma outra entrevista concedida por este blogueiro à mesma época (apenas um mês e meio antes) ao Instituto Humanitas, da Unisinos, Rio Grande do Sul, em 11 dez. 2015 (veja
aqui), cujo título foi: "
Infraestrutura logística portuária: O Estado cooptado pelo setor privado e a população à mercê do capital. Entrevista especial com Roberto Moraes Pessanha".
Enfim está aí abaixo:
Entrevista para o SJB
Online em 01 de fevereiro de 2016
Publicada em 20 de
fevereiro de 2016:
"Porto do Açu do discurso de sustentabilidade à hipocrisia"
SJB Online: Desde o início do
processo de implantação do Complexo Portuário do Açu, começando com o arrojado
projeto do grupo EBX e agora com a Prumo Logística, quais são, na sua opinião,
os pontos positivos e negativos para a comunidade?
Roberto Moraes: Eu
prefiro deixar a análise dual, ou polarizada, entre pontos positivos e
negativos para mais adiante. A atividade portuária é parte de um sistema de
logística que liga o produtor ao consumidor. No mundo todo, a atividade de
logística portuária vem sofrendo transformações acentuadas. Uma delas é a
relação cada vez menor com as cidades e as comunidades onde estão instaladas,
porque os fluxos de cargas e a movimentação material se dão em velocidades cada
vez maiores, ao contrário da lógica antiga dos grandes armazéns. A outra,
ligada à primeira, é a exigência de grandes retroáreas e, por isto os terminais
estão migrando (na medida do possível) para fora de grandes áreas metropolitanas.
Ambas as característica se vinculam a uma terceira transformação, a que
chamamos da 5ª geração de portos, que é a característica do “porto-indústria”, porto
junto do distrito industrial, onde a ideia é que se ganhe com o baixo custo de
logística, na medida que a produção tende a ficar ao lado do porto, para daí sair
e chegar ao consumidor, que pode ser o final, ou outra indústria de
transformação. O Porto do Açu foi pensado pela primeira vez no ano 2000 para
servir de apoio às atividades de exploração de petróleo, no litoral do Sudeste.
A ideia de usá-lo para exportação de minério de ferro, em projeto similar à da
Samarco, ES, surgiu quando os estudos de viabilidade técnico-econômica,
realizados pelo governo estadual foram entregues ao empresário, Eike Batista, que
este veio à região em 2005/2006 e adquiriu as áreas de duas grandes fazendas:
Caruara e Saco Dantas. Desta forma, em julho de 2007, se iniciou efetivamente a
construção e implantação do porto, com o que hoje é foi denominado como Terminal
1.
Neste processo, em
oito anos e meio, houve e continua havendo, muitos problemas, que não
existiriam se a palavra “sustentabilidade” não fosse na prática, tão falsa e
hipócrita, quando se trata da implantação de grandes empreendimentos e não
apenas portuários. Os processos de licenciamento foram absurdamente fatiados e
aí se perdeu completamente a noção e a avaliação dos impactos de forma
cumulativa, assim com a relação do sistema portuário com o chamado complexo
industrial. Desde o Sistema Minas-Rio, com o mineroduto, ao terminal Sul, (hoje
chamado de Terminal 2); o estaleiro da OSX (hoje com a implantação
interrompida); as Usinas Termelétricas (duas, uma a carvão e outra a gás) –
hoje suspensos; as duas siderúrgicas, projetos também suspensos, junto com duas
cimenteiras.
O processo de
desapropriação foi e continua eivado de ilegalidades absurdas, além de
realizado de forma violenta, numa espécie de reforma agrária, às avessas, com o
estado tirando de vários pequenos proprietários rurais e agricultores, para
entregar a uma corporação global, hoje controlada por um fundo de investimentos
americano, em latifúndio quase sem uso com mais de 70 km². Sendo que a pequena
parte utilizada se dá a um custo mensal de aluguel superior ao valor que se
realizou (alguns casos pretendeu) para a compra dos pequenos agricultores.
O processo de
dragagem e de formação do aterro hidráulico com a areia retirada para a
construção do canal de atracação vazou, criminalmente, e salgou as terras e os
recursos hídricos da região, atingindo, talvez, não por acaso, os agricultores
que insistiam em manter suas atividades rurais a despeito da força e do poder
econômico dos implantadores do porto.
Para não estender
mais, mas sem deixar de registrar outro impacto importante da implantação dos
píeres e quebra-mares, a Praia de Barra do Furado, desde 2012 e de forma mais
intensa em 2014 e 2015, passou a sofrer a supressão de areia e rápida erosão,
aliás prevista no EIA/Rima elaborado pela própria empresa, para o licenciamento
do Terminal Sul do porto (hoje 2) e do Distrito Industrial previsto para as
áreas desapropriadas pelo Estado.
Ainda sobre os
pontos negativos a geração de empregos para os moradores de SJB foi e continua
sendo, proporcionalmente, pequena e desta forma, para muitos, o porto ainda
parece algo estranho ao município. Mesmo que menores que antes, ainda há
esperanças de que o porto traga algumas vantagens, por conta da importância
estratégia de logística nas cadeias de produção e de valor da economia global
que se tem hoje.
As receitas de ISS
cresceram, mas em proporção menores do que as demandas que a atividade
econômica e a vinda de pessoas de fora passaram a demandar da municipalidade,
em termos de saúde, educação, saneamento e segurança pública. A comunidade que
empresta nome ao porto, parece que ficou de costas, virando quase que um
quintal do empreendimento e sofre todos os problemas que já tinha antes, além
de vários outros, como de seguidos roubos e assaltos, ausência de um terminal
bancário ou mesmo entrada de acesso ao porto.
As atividades de
movimentação de cargas começaram no final de 2014, mas um maior fluxo de cargas
ligado ao Terminal 2, onde estão (estariam) algumas empresas de apoio e
produção de materiais para exploração de petróleo ainda não deslanchou. Neste
terminal, a americana Edison Chouest monta uma base portuária, demandada
através de um contrato de licitação com a Petrobras e que está sendo
construído. Porém, ele vem num momento de baixa do “ciclo petro-econômico” com
repercussão em todo o mundo e de menor dinâmica na Bacia de Campos, com redução
de novas exploração. Isto poderá alterar a dinâmica que se começou a prever,
com a transferência paulatina de serviços e indústrias da base operacional de
Macaé para o Açu.
Assim, há que se
investigar como este processo se transcorrerá. De certo, infelizmente, é a
pouca capacidade do município de SJB e mesmo os demais da região, em
conversarem, se integrarem e exigirem melhor interação com o projeto econômico
que o porto pode trazer. O governo estadual também foi e continua sendo omissos
na regulação e fiscalização das atividades de implantação do porto, assim como
nas exigências de um maior diálogo com os municípios da região. Os problemas
não resolvidos vão se intensificando e acumulando.
SJB Online: Quais são os principais
problemas do Porto? Economia local (atividades tradicionais), política,
alterações no ecossistema, aumento populacional, questões sociais?
Roberto Moraes:
Parte da resposta a esta pergunta está acima. Os impactos de um empreendimento
como este sempre serão muito grandes. O maior questionamento é que muitos
deles, poderiam de fato ser evitados, ou reduzidos, se houvesse interesse e
respeito com as pessoas e a comunidade. São custos relativamente pequenos.
Porém, são pouquíssimas as condicionantes para mitigação destes impactos efetivamente
realizadas. Como eu disse, os portos na atual conjuntura de rápidos fluxos,
como se vê a partir da reestruturação produtiva mundial, conversa muito pouco
com as cidades e com as comunidades. Assim, eles se transformam numa espécie de
ilha isolada de tudo e todos. Os especialistas chamam este tipo de
empreendimento de “enclaves”. Eles também dizem que os enclaves geram poucas “externalidades”
para o local e para o entorno onde estão instalados.
Observando o processo
de instalação do porto é possível enxergar claramente este processo. Diversos
dados e indicadores confirmam esta realidade. Assim, até os pequenos
restaurantes que atendiam aos trabalhadores, foram sendo deixados de lado. Por
conta dos alojamentos que tantos problemas tiveram como de denúncias de
condições análogas a de trabalho escravo e de péssimas condições de
habitabilidade, foram sendo suprimidos, por pagamentos de uma espécie de
auxílio moradia. Assim, a maioria dos trabalhadores que atua nas empresas do
porto e na construção de outras bases, hoje vão e voltam diariamente em ônibus
para Campos. Estima-se hoje este número em torno de 7 mil trabalhadores. Até
hoje, a ligação do Açu com a sede de SJB é precária, o que ajuda a ampliar a
relação do empreendimento portuário com Campos, que já é um polo comercial e de
serviços.
Como já disse, os
gestores locais não dialogam e não traçam políticas de integração e de
consórcios que poderiam ajudar aos moradores. A relação entre os gestores
municipais e do empreendimento, ou são superficiais, ou de submissão aos
interesses econômicos destes. Um bom exemplo, pode ser visto no processo de
revisão e aprovação do Plano Diretor de SJB, onde a discussão sobre o uso do
solo, em que o município tem poder de regulação atendeu a todos os interesses
do porto e abriu brechas para um enorme processo de especulação imobiliária. Há
que se considerar, em meio aos problemas, que os imbróglios da implantação
total do empreendimento, a mudança de dono e de controle, o adiamento ou
suspensão de alguns projetos, acabaram por vias transversas, oferecendo à
população/comunidade, alguns poucos meios e formas para se adaptar e tentar
resistir, ao que se pode chamar de “processo tratoral” usado sobre a população
local.
SJBOnline: É possível que uma
mudança de conduta dos empreendedores e gestores públicos seja capaz de
minimizar ou até sanar os problemas existentes no Porto do Açu (os atuais e os
previstos para o futuro)?
Roberto Moraes: Isto
é desejável. É ridículo imaginar gestores locais e mesmo do governo do estado,
só batendo continência para os empreendedores. O empreendimento é desejado e
traz potencialidades e perspectivas econômicas que interessam à população, que
busca e pensa mais no emprego. Mas até poderia também atender ao governante,
que pensa nos tributos que lhe possibilitará avançar em projetos do seu
mandato. Porém, há que se dialogar, mas sem abrir mão em regular a atividade,
sem deixar de cobrar pelas compensações dos impactos, como infelizmente se viu
nos momentos de maiores problemas como da salinização, da erosão do mar e da
forma usada para as violentas desapropriações.
A articulação entre
as gestões públicas nas esferas de poder possuem força suficiente para buscar
sinergias para minimizar os problemas. Sanar não. Um empreendimento deste porte
sempre traz problemas na mudança que se faz na natureza, para o uso humano e
para a geração de valor e de riquezas. Porém, há hoje formas e fórmulas
diversas, para colocar em prática o que chamei de hipocrisia do discurso da sustentabilidade.
Elas não são feitas porque não cobradas e nem fiscalizadas. É como já disse, na
época da euforia da construção, em que toda a economia ia bem, o discurso é que
era necessário deixar a coisa andar para aproveitar a onda e aí as cobranças
eram deixadas de lado, para adiante. Agora, no colapso da economia, os
problemas com os preços das commodities de minério de ferro e óleo em baixa,
duas das bases do sistema portuário, o discurso se altera, mas para tudo
continuar como antes, sem cobrança, licenciando socioambientalmente os
empreendimentos (como se viu neste caso do licenciamento ambiental da dragagem
para aprofundamento do canal de atracação do porto – veja em meu blog
comentário e crítica específica sobre isto: http://www.robertomoraes.com.br/2016/01/sobre-audiencia-publica-da-prumo-em-sjb.html). Sem fiscalizar as operações e o cumprimento das
condicionantes.
É fato que a
operação do Porto do Açu atrai potencialidades econômicas para toda a região,
para além da logística de movimentação de carga destas duas commodities
(mineral e petróleo), mas para isso há muita coisa para ser pensado em termos
de planejamento e de integração com a economia estadual e nacional. Há um
desenho sobre esta dinâmica econômico-espacial que eu tenho chamado de “Circuito
Espacial do Petróleo e dos Royalties” que antes ia até Macaé e agora foi
espichado para o Açu. Enfim, para o bem e para o mal, atendendo e enriquecendo
poucos, o porto é sempre uma janela para o mundo, mas parece que no caso do
Açu, ele vem se tornando quase que apenas, um portão de entrada e saída para
seus donos. Ou não?
SJB Online: Não só em relação ao
Porto do Açu, o senhor tem estudado a realidade da questão portuária dentro e
fora do estado do Rio de Janeiro. O que tem observado?
Roberto Moraes: Sim, eu desenvolvo uma pesquisa
desde 2006 sobre o tema, e de forma mais estruturada, a partir de 2011, sobre a
implantação do porto do Açu e a relação que isto tem com a região e com o
desenvolvimento com todo o ERJ. Pesquisa que nasceu no Núcleo de Estudos em
Estratégia e Desenvolvimento (NEED) do IFF e foi sendo ampliada no Programa de
Políticas Púbicas e Formação Humana (PPFH) na UERJ, onde estou em vias de
concluir o doutorado no tema. Assim, eu identifiquei a existência do que passei
a chamar de uma tríade entre “petróleo-porto-indústria naval” que passou a ter
ainda maior relevância na economia e no emprego do estado. O PIB estadual
perigosamente passou a ficar dependente da chamada “maldição mineral”, com 33%
vinculado direta ou indiretamente a esta cadeia, ou à tríade que é puxada pelo
petróleo. Foi no curso deste processo que fui ampliando o conhecimento sobre os
sistemas portuários já existentes e inúmeros outros projetos de porto que foram
surgindo, no litoral de nosso estado, na última década.
O ERJ é chamado por alguns de “estado-porto”,
porque hoje possui 13 portos em funcionamento, além de outros 5 projetados, em
seus 635 km de litoral (o 3º maior em extensão entre todos os estados). Nos
portos em funcionamento, há hoje, mais de 30 terminais instalados. Assim, o
setor portuário que já tinha tradição e história, desde o Porto do Rio, que
recebeu a família real em 1806, foi ampliando a sua importância econômica e
social para o estado e par ao país. Inicialmente com a movimentação de cargas
gerais, gerando receitas de impostos, e adiante, quando passou a ter ainda
maior significado com a demanda de apoio portuário, para movimentação de
embarcações que viabilizaram as descobertas e a produção de várias reservas
petrolíferas, desde a Bacia de Campos, ES e de Santos e mais recentemente, a
gigantesca reserva do Pré-sal. Assim, os portos, enquanto infraestrutura foram
se transformando numa base importante para a economia fluminense, ampliando a
disputa por este centro de logística com o vizinho estado do Espírito Santo. Na
atual conjuntura vale observar que pelo estado mais avançado de implantação e
já funcionando, o Porto do Açu ganhou vantagem diferencial, em relação aos
demais projetos portuários no ERJ e no ES, que ainda aguardam licenciamento ambiental
e/ou financiamento.
A minha pesquisa identifica hoje de forma mais
estruturada a relação entre petróleo e porto e a repercussão dela sobre o
território. Sobre o assunto, eu formulo a interpretação de que para o bem ou
para o mal, esta relação constituiu um “Circuito Espacial do Petróleo e dos
Royalties” (CEPR) no litoral fluminense, com o uso do solo, mais dominado por
corporações do que pelas comunidades e pelos governos locais. Assim, há hoje,
contornos daquilo que se poderia intitular como uma “região metropolitana do
petróleo”. É por conta disso, que o meu enfoque e defesa de atuação da gestão
pública é voltada essencialmente, para a necessidade de uma maior integração
das políticas municipais com visão regional e menos localista. Ou seja, esta ideia
não parte da teoria e sim da realidade empírica do que se observa e dos dados e
indicadores que se analisa.
|
Fonte: Mapa do Circuito Espacial do Petróleo e os Royalties no ERJ. Elaboração do autor e publicado no artigo da Revista Espaço e Economia em setembro de 2015. |
Para as próximas décadas, diante da reestruturação produtiva mundial, os portos ampliarão ainda mais a sua importância, seja em navegação de longo curso, intercontinental, ou mesmo dentro do país, com a navegação de cabotagem. Para os que se interessam sobre o assunto, eu sugiro duas publicações. Um artigo científico publicado na revista “Espaço e Economia” – Revista Brasileira de Geografia, em setembro de 2015, sobre a relação porto-petróleo e sua influência no ERJ e no Brasil, cujo título é: “A ampliação da fronteira de exploração petrolífera no Brasil é parte da geopolítica da energia: oportunidades e riscos de inserção global em meio às novas territorialidades regionais e ao desafio da abundância na economia dos royalties no ERJ”.
(Link: http://espacoeconomia.revues.org/1511) e a outra uma entrevista que concedi ao Instituto Humanitas, da universidade Unisinos no Rio Grande do Sul, em dezembro de 2015, cujo título é: “Infraestrutura logística portuária: O Estado cooptado pelo setor privado e a população à mercê do capital”. (Link: http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/550047-infraestrutura-logistica-portuaria-o-estado-cooptado-pelo-setor-privado-e-a-populacao-a-merce-do-capital-entrevista-especial-com-roberto-moraes-pessanha). Há ainda no blog inúmeras postagens sobre os sistemas portuários na atualidade. De forma especial cito um artigo publicado, em fevereiro de 2015, na plataforma GeocritiQ, da Universidade de Barcelona, cujo título é “Portos demandam regulação”. (Link: http://www.geocritiq.com/author/roberto-moraes/).
SJB Online: Poderia comentar sobre a direção de um plano de ação regional incorporando a questão portuária, de desenvolvimento sócio/econômico regional e Políticas Públicas?
Roberto Moraes: Sim. Eu não vou dar uma tecnocrata e listar uma receita de bolo, porque não acredito nisto. Não reconheço projetos de gabinetes sem participação popular e construção coletiva de políticas públicas. Acho que necessitamos sim de direções, de caminhos sobre as quais se deve dialogar com as partes interessadas para criar mediações e projetos de políticas públicas. Nesta linha, eu tenho insistido na necessidade de se pensar políticas públicas menos locais e mais regionais e de integração. Algumas das importantes medidas que necessitamos só serão realizadas com um maior integração das gestões. Os municípios não podem continuar atuando de forma concorrencial e isolada. Esta não é uma crítica intelectual e sim prática. De estímulo à busca de uma melhor direção para a tomada de decisões e implementação de ações políticas que a meu juízo devem ser pensadas em 3 grandes dimensões: Política (Gestão e Participação Social); Econômica (Participação do Setor Produtivo e do Trabalho/Emprego nos debates) e Social e Cultural (Manifestações Culturais, Movimentos Populares, de Minorias etc.) que devem ser vistas no plano do município e de um grupo de cidades as mais próximas e àquelas com que possuem mais afinidades históricas, sociais, culturais e econômicas. Seguindo
esta direção, eu defendo ainda que sejam pensadas algumas das novas
características de nossa região:
a)
Era sabido que a Redução dos Royalties viria
antes da escassez do petróleo e atingiria também o ERJ – perda de R$ 3,5 bi e
déficit de R$ 16 bilhões e encontraria a União também com problemas, como
estamos vendo no presente. Agora não adianta chorar o leite derramado, embora
seja necessário reconhecer os erros, para não repeti-los. Porém, é preciso
olhar pra frente e fazer o que não foi feito;
b)
A região de forma paulatina, passou a ficar
vinculada diretamente à Economia Global, seja pela relação com o petróleo
(royalties), seja pelo porto. Este fato deveria levar a uma maior cuidado e
busca de integração com a economia tradicional, que deve ser mais apoiada e
valorizada, com potencial para ganhar novos significados e mercados;
c)
A gênese de toda a questão é Política e da sua
relação com as comunidade e as corporações, enquanto nos municípios, quase sem
exceção se permanece apenas numa esganiçada “luta de poderes”, deixando de
lado, uma preocupação com o que poderia ser uma disputa no “campo das ideias”,
para a formulação, coletivamente e de forma participativa, de boas políticas
públicas nos diversos setores: educação, saúde, saneamento e ambiente, cultura
e esportes, etc.
d)
A meu juízo a “Economia do Petróleo” tende a se
manter nos próximos 30/40 anos na região e no Brasil, enquanto a “Economia dos
Royalties” perderá força e o estado e os municípios até aqui petrorrentistas
continuarão a sentir os efeitos. (33% do PIB do ERJ e 12% PIB nacional);
e)
Não há saídas fora do diálogo amplo. É necessário ampliar e radicalizar a
participação da sociedade nas decisões. Aproximar representantes de
representados. Assim, mesmo que tardiamente, é sempre hora de reestimular a
participação social na definição das prioridades, em termos de setores e
lugares. Sem ilusões, ou ingenuidades de se pensar em consensos, possíveis em
poucas situações, mas no atendimento às maiorias, em termos econômicos, sociais
e culturais. Épocas de crise como a atual, é mais que propícia para pedir a
colaboração, especialmente, quando se trata de decidir sobre cortes
orçamentários, porque deste debate é que se originarão as prioridades e os
novos projetos para atender diretamente à população.
f)
Podemos não querer perceber, ou registrar, mas é
fato que as populações dos municípios da região, a despeito dos problemas de
locomoção e mobilidade, hoje, vão e voltam diariamente de uma para outra
cidade, especialmente para trabalhar e estudar, mas também para o lazer e a
integração social com as famílias vivendo espacialmente mais espalhadas. Os
governos não podem ignorar este fato ao pensar políticas públicas para suas
comunidades. Já era conhecido este movimento diário entre Campos e Macaé de
cerca de 10 mil pessoas. Porém, entre Campos e SJB este deslocamento diário,
chamado de movimento pendular, foi paulatinamente crescendo com a implantação
do porto e outras realidades e hoje, já é de cerca de 7 a 8 mil pessoas que
diariamente vão e voltam nos dois sentidos.
Diante destas realidades há muito a ser conversado,
debatido e projetado para que a vida na região, ou no local onde se vive, seja
melhor que ontem, e amanhã melhor que hoje. As cidades são o lócus (local) da
vida em comunhão, em meio a conflitos e disputas sociais sim, mas de convívio.
A redução das desigualdades precisam ser perseguidas nas diferentes escalas,
mas será do debate e da ampla participação social nas proposições e ações, bem
para além do voto de quatro em quatro anos, é que se construirá ou não,
ambientes melhores não apenas para sobreviver, mas viver em comunhão.
SJB Online: O senhor conheceu recentemente áreas portuárias na Europa. Com que objetivo? Como foi a experiência?
Roberto Moraes: No segundo semestre de 2014, eu morei em Barcelona para ampliar a pesquisa ainda em curso, sobre a relação dos portos com a Economia Global. A viagem a trabalho foi parte do chamado “doutorado-sanduíche” junto à Faculdade de Geografia, da Universidade de Barcelona. A partir da região da Catalunha, eu pesquisei os maiores portos da Europa, Roterdã na Holanda, Antuérpia, na Bélgica, além do Porto de Tanger em Marrocos e outros cinco portos espanhóis. Uma experiência e um aprendizado riquíssimos para a compreensão de como os portos, a sua relação com as tradings (que fazem o comércio global controlando fluxos e preços), articulação com o sistema financeiro mundial, manejam, de forma colossal a economia no mundo.
Entender a gênese dos portos, sua tipologia e geração e a sua interligação com as economias nacionais foi se tornando indispensável em minha pesquisa. Passei a compreender que só entendendo esta lógica do sistema, seria possível traçar cenários sobre os impactos e sobre as formas possíveis de se enfrentar esta realidade, estruturada pelo capitalismo global, com repercussão sobre o nosso dia a dia. Muito material foi levantado. Tenho me esforçado para repartir esta compreensão com todos. O blog e minha intensa participação nas redes sociais tem este intuito, em informar de maneira clara e descomplicada, esta complexa realidade, tentando desocultar interpretações, além de estimular um debate mais politizado e menos personalizado que se tem nos embates naturais para a disputa do poder.
Tenho participado de vários seminários, congressos e mesas redondas sobre estes temas, mas talvez seja no blog, onde eu tenha mais detalhado, comentado e debatido, estas questões. Por isso, muitos que não o acompanham tão assiduamente o blog, nestes quase 12 anos de existência, não entenderam a migração do conteúdo das postagens, de um enfoque majoritário das questões locais para as questões regionais, nacionais e até internacionais. Penso que assim, se pode, junto com outros blogs e sites da região, se complementar melhor a abrangência das informações, reflexões e debates. Eu agradeço o convite para e entrevista de um site que possui abrangência mais local, mas que pretende valorizar a reflexão num âmbito e numa dimensão mais ampla. Junto também peço desculpas pela extensão das respostas, mas atribuo as mesmas às boas e abrangentes perguntas formuladas pela repórter Jaciara Gomes. Sigamos em frente, porque a vida é um processo e não um produto.
Roberto Mores Pessanha tem 56 anos é engenheiro e atua como professor do IFF desde 1986, onde foi diretor geral do Cefet, no período entre 1994 e 2000. É mestre em engenharia de produção pela Coppe/UFRJ (1992) e atual doutorando pelo PPFH/UERJ. Blogueiro atuante desde agosto de 1994, no espaço virtual (digital) que possui cerca de 3 mil visitas diárias. É ainda autor de organizador dos livros: “Economia e Desenvolvimento no Norte Fluminense – da Cana de Açúcar aos Royalties do Petróleo” (2004) e “Campos dos Goytacazes uma cidade para todos” (2005).