Desde o final da década de 90, aqui no ERJ com o vertiginoso crescimento das receitas dos royalties do petróleo, decorrente do aumento da produção e mudança legas, vários estudiosos passaram a propor que os municípios petrorrentistas criassem fundos com os recursos dos royalties e participações especiais.
O objetivo em geral é para que pudessem compensar os imprevistos equilibrando os valores quando da redução da produção por acidentes, ou pela redução do preço do barril de petróleo.
A ideia era também criar setores e cadeias produtivas que pudessem ser incentivadas para romper a petrodependência, considerando ainda se tratar de um bem intergeracional.
Os gestores sempre foram contra a inciativa por considerarem que eles não deveriam deixar para outros mandatos, os recursos que poderiam ser usados em suas gestões. Uma ou outra experiência foi tentada nesta linha com péssimos resultados.
O Fundecam, em Campos dos Goytacazes, que saiu a partir de pressão da sociedade e um fórum de desenvolvimento regional é um deles e já mereceu diversos estudos e análises críticas mais ou menos detalhadas nas universidades.
Infelizmente, os resultados foram desastrosos em termos de abertura de alternativas econômicas contra a dependência do petrorrentismo. Projetos tiveram curto espaço de sobrevivência, eram pontuais sem serem de cadeias os setores produtivos, os empregos foram perdidos e outros projetos eram formas apenas de acessar fundos públicos para fins privados. O resultado é um passivo de algumas centenas de milhões de reais que poderiam ter amortizado as consequências no período da redução dos royalties.
A mudança espacial das receitas dos royalties nos municípios litorâneos: do ERJ para SP
Pois bem, duas décadas depois, os municípios do litoral fluminense do Norte e Baixadas Litorâneas começam a ver estas receitas se reduzirem porque os campos de petróleo offshore se tornaram maduros, enquanto outros municípios metropolitanos no ERJ e no litoral paulista começam a ver o aumento da receitas com a produção colossal nos campos da Bacia de Santos.
No ERJ, os exemplos mais conhecidos é o de Maricá e Niterói. No estado de São Paulo o caso de São Sebastião, Caraguatatuba e Ilhabela têm receitas de royalties crescentes.
No ano passado (2017), o município paulista de São Sebastião com 74 mil habitantes recebeu R$ 86,9 milhões. Caraguatatuba com 101 mil habitantes recebeu royalties de 81,9 milhões. [1]
Porém, outro município paulista de Ilhabela com 28 mil habitantes, em 2017 teve a maior petrorrenda com receita de R$ 474,8 milhões. Valor que foi quase o dobro de dois anos antes, em 2015, quando a receita dos royalties na cidade tinha sido de R$ 239,7 milhões. [1]
Os royalties recebidos por São Sebastião de R$ 474,8 milhões no ano de 2017 foi superior ao recebido pelo município de Campos dos Goytacazes, que neste mesmo ano recebeu R$ 470 milhões, depois de ter recebido R$ 1,3 bilhão em 2012. Enquanto São João da Barra, no ERJ recebeu em 2017 o valor de R$ 115 milhões, depois de ter recebido R$ 237 milhões, no pico desta receita, em 2014. [1]
A produção crescente nos campos de petróleo da Bacia de Santos e das reservas do Pré-sal no litoral paulista explicam esta evolução da receita dos royalties mesmo com o petróleo estando distante do preço superior aos R$ 100, o barril, em todo o período entre 2101 e 2014.
Em 2018, Ilhabela tem um orçamento aprovado de R$ 650 milhões com previsão de que mais de R$ 500 milhões tenham origens nas petrorrendas. Com 347 km² (área menor que SJB que tem 458 km²) Ilhabela tem problemas e questionamentos similares àqueles feitos aos nossos municípios petrorrentistas no ERJ: shows, patrocínios e obras questionáveis em termos de prioridades e caras em termos de preços, além do enorme crescimento das despesas de pessoal e custeio, de forma especial nos últimos três anos. [2]
Um dado interessante é que os setores de Educação (R$ 141 milhões) e Saúde ,(R$ 94 milhões) em São Sebastião são as funções com maior dotação dentro do orçamento do ano em curso no município paulista de Ilhabela. Veja
aqui a LOA 2018 do município de São Sebastião, SP. [3]
O que é viver na Economia dos Royalties
Porém, muitas outras questões merecem ser analisadas quando se observam problemas similares nos municípios que passam à condição de petrorrentistas e desta forma vivem a Economia dos Royalties, como base fundamental de sua receita.
Uma outra informação que merece ser melhor apurada - e que tem relação com o início desta postagem - é a de que o município de Ilhabela, sendo um município com características turísticas, resolveu constituir um fundo para desenvolvimento do turismo que se inicia com um percentual de 1% dos royalties e que teria uma previsão para chegar ao longo de um tempo a 25%.
Novamente se vê que a receita para o fundo se ampliará em mandatos futuros, comprometendo assim menor parte da receita atual. Nenhum prefeito quer ajudar a organizar o futuro abrindo mão de parte considerável da receita.
Ainda assim, a prefeitura de Ilhabela tem divulgado que nos próximos quatro anos deverá investir R$ 328 milhões em projetos de ampliação da infraestrutura turística. Há neste item projetos caros como a construção de parques aquáticos e marinas que visam angariar receitas com turismo de cruzeiros que hoje é muito disputado.
Porém, há que se saber como a população local está sendo atendida e preparada para atuar neste setor, de forma a que este investimentos com fundos públicos não sirvam apenas, ou basicamente para engordar lucros de uma elite local ou regional.
Há algum tempo, este tema, vinculado basicamente às investigações sobre o uso dos fundos públicos (orçamentos) dos municípios petrorrentistas, deixou de ser foco das minhas pesquisas mais detalhadas, mas nunca deixou de sair completamente do meu radar de observação.
Desta forma, esta postagem tem também o objetivo de chamar a atenção de professores e pesquisadores que atuam no tema para aprofundar a análise sobre os caminhos trilhados pelas novas cidades petrorrentistas no ERJ (Maricá, Niterói) e SP (Ilhabela, São Sebastião e outras).
Referências:
[1] Informações sobre a receita dos royalties (quota mensal) e participações especiais (quotas trimestrais) disponível no portal InfoRoyalties da Ucam-Campos. Disponível em: https://inforoyalties.ucam-campos.br
[2] Matéria da Folha de São Paulo em 24 set. 2017. PAMPLONA, Nicola. Ilhabela vive benefícios e risco dos royalties. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/09/1921224-ilhabela-vive-beneficio-e-risco-dos-royalties.shtml
[3] Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2018 do município paulista de São Sebastião. Site da Prefeitura. Disponível em: http://transparenciaonline.ilhabela.sp.gov.br/wp-content/uploads/sites/2/arquivos/2018/01/Lei-1.250_2017-LOA-Lei-Or%C3%A7ament%C3%A1ria-Anual-para-2018-1.pdf