É possível saber em quais negócios os fundos financeiros
investem - até porque eles precisam desta divulgação para manter e ampliar os
investidores -, mas não se sabe quem coloca dinheiro nas gestoras de fundos de
investimentos, tanto no Brasil quanto no exterior.
Há algum tempo eu passei a chamar a atenção para o papel dos fundos como instrumento da financeirização no capitalismo contemporâneo, em especial, após
a crise do subprime em 2008/2009.
No Brasil, a ação dos fundos financeiros globais - enlaçados
aos fundos nacionais - ficaram mais claros e expostos, após o golpe político de 2016 (documento Ponte para o Futuro) com o processo
de privatização de diversos setores da economia. Porém, de forma mais especial me refiro àqueles empreendimentos vinculados
ao setor de óleo e gás. Vários ativos foram e continuam sendo vendidos, a
preços irrisórios (subsidiárias da Petrobras) para esses fundos canadenses, franceses
e americanos.
Em 2013, quando da debacle dos negócios de Eike Batista,
na holding EBX, em especial na subsidiária de petróleo, a OGX, o empresário viajou por
uma semana aos EUA e de lá voltou com o negócio do Porto do Açu, da empresa LLX,
entregue ao fundo financeiro americano, EIG Global Energy Partners.
Vale ainda recordar que outro fundo, neste caso de pensão
dos professores da província canadense de Ontário, OTPP, tinham sido um dos primeiros
investidores a aportar capital, na recém criada LLX, empresa de logística
responsável pelo planejamento e construção do Porto do Açu e Porto Sudeste.
Assim, sob o controle do fundo EIG, a empresa LLX se transformou em Prumo e logo depois
também se converteu numa holding (grupo). Hoje possui várias subsidiárias
e negócios instalados na colossal área de cerca de 90 Km², em boa parte desapropriada de pequenos agricultores (maioria não indennizada),
pelo governo do estado a favor da empresa.
Esse processo foi manejado via um acordo que usou a Codin, para
criar o Distrito Industrial de São João da Barra (DISJB), que na prática é controlado - e de forma privada - pela Prumo Logística Global, que era uma Sociedade Anônima (S.A.), com capital na Bolsa, B3, e mais adiante fechou o seu capital.
A debacle da holding
EBX de Eike e os negócios com os fundos americano e agora chinês
No segundo semestre 2013, Eike informou e a mídia corporativa
engoliu que ele entregou esse ativo da LLX, em troca de investimentos do fundo
americano EIG. Mas não foi dito e nem perguntado o que Eike ganhou com isso, além
de proteger a LLX da debacle dos seus negócios.
Há quem afirme – e garanta -, que Eike tenha também alocado
na EIG, uma parte do lucro da venda do Sistema Minas-Rio por US$ 3,3 bilhões à mineradora,
anglo-africana, Anglo American e que hoje exporta mensalmente cerca de duas dezenas de milhões de toneladas de minério de ferro pelo
terminal T1 do Porto do Açu, através de empresa joint-venture, a Ferroport, com a holding
Prumo.
Aliás, vale recordar, que na época, a Receita Federal abriu um processo
questionando empresa´rio Eike Batista, sobre o pagamento de impostos federais, devido pela valorização
mobiliária que redundou nessa venda bilionária do Sistema MMinas-Rio, tendo a maior parte deste
dinheiro permanecido nos EUA. Daí se surge a ligação com a hipótese do
investimento no fundo EIG na LLX, transformada em Prumo da qual, Eike passaria a invstidor.
Durante todo, este tempo, de cerca de 7 anos, é bastante
conhecida as incursões frequentes de Eike Batista na área do Porto para “visitas”
e prospecção e discussão de “novos” negócios. Visitas que sempre poderiam ser
consideradas que o a “engorda do boi depende do olhos do dono”.
Há algum tempo, há discussões para saber se essa hipótese, hoje
já teria elementos para se transformar em tese, sobre a manutenção de um
controle indireto sobre parte dos negócios do Açu, conforme acordos mantidos
com a gestora do fundo EIG, em dezembro de 2013, nos EUA.
O fato é que Eike, agora, ao invés do acordo com fundo financeiro
americano, foi buscar aliança com um fundo financeiro chinês, o China Development
Integration Limited (CDIL), que tem relações e negócios com o governo da China,
inclusive na nova Rota da Seda (Belt and Road Initiative), mas possui sede na financeira cidade de Hong Kong.
Como quase todo o negócio financeiro, sempre há outros
intermediários nestes negócios de captura de investidores e decisão sobre aquisição
de ativos para investimentos. Diz-se que os chineses vão entrar com capital e
Eike “as ideias” e os projetos.
Mas pode ser além disso. Por trás das conversas há algum
aporte de capital nas demais subsidiárias da finada holding EBX, como a MMX,
OGX, OSX (essa tem enorme área alugada no Porto do Açu onde fica o terminal T2)
e que ficaram em recuperação judicial desde 2014, devendo a muita gente Brasil e
mundo afora.
Fundo chinês CDIL
aparece no Açu da mesma forma que surgiu o fundo americano EIG
O fundo chinês já atua junto à MMX que tem mina no
Quadrilátero Ferrífero e exportação via Porto Sudeste, planejado também por
Eike, em Itaguaí, na Baía de Sepetiba, mas também com controle acionário repassado, como o Porto do Açu para da grande trading holandesa de commodities: Trafigura.
Porém, não é difícil intuir que os negócios maiores entre Eike e os fundos financeiros passam
pelo ativo do Porto do Açu, controlado pela Prumo/EIG e que hoje tem no governo do ERJ, um grande "aliado", o secretário de Desenvolvimento Econômico. Digamos que uma espécie de “despachante
de luxo” dos vários interesses da Prumo no que diz respeito a um conjunto
enorme de projetos, entre licenciamentos e articulações para financiamentos de fundos
públicos e privados.
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Esquema gráfico slide de apresentação da tese PESSANHA, R.M. (2017, PPFH-UERJ), "A relação transescalar e multidimensional "Petróleo-Porto" como produtora de novas territorialidades".[1] |
Entre os “novos negócios” está a um megaprojeto de geração
de energia com potência de 1,1 MW, quase similar à capacidade da UTE-1 da GNA,
que está prestes a entrar em funcionamento no Porto do Açu. As placas solares seriam
fornecidas por outra empresa chinesa com tradição na produção destes equipamentos
e que o CDIL tem participação acionária, a Trina Solar.
O site BrazilJournal, controlado pela gestora do fundo BR
Partners, que também participa das negociações, informa hoje (aqui) [2] que os primeiros
300 MW da usina solar seriam instalados numa área adjacente ao Porto do Açu, que se supõe, que
passa ser no terreno que a OSX dispõe, alugado ainda na época da LLX.
É necessário entender
o circuito financeiro por trás dos negócios destas corporações e suas relações com
o Estado
É nesse contexto que é importante observar os movimentos financeiros dos fundos
junto aos negócios do Porto do Açu. Para a população da região, o empreendimento
não tem mais um dono conhecido como foi no passado.
Fundo financeiro não tem cara e muito menos coração. Parece
que o empreendimento não tem dono, embora, os seus gerentes atuem como se
fossem, atrás de cumprir as metas para bem remunerar os investidores curto-prazistas
desses fundos, mesmo que explorando a muitos.
A Prumo, a EIG, os fundos, o Porto do Açu todos têm poucas ou nenhuma relação com a comunidade regional. Na verdade, eles a evitam. Funcionam, como
uma espécie de enclave, que vê a comunidade local, como problema à fluidez de
seus negócios.
Um porto ganha com a fluidez das cargas, ainda mais um
porto de 5ª geração (ZIP-Zona Portuária-Industrial) que como o complexo do Açu está instalado em área mais afastada dos circuitos urbanos, exatamente para evitar essa relação que o empreendedor e seus
investidores entendem como problemas.
Enfim, esse relato com a ligação de fatos pretéritos e atuais, tem o objetivo de permitir que se tenha uma leitura mais integrada e mais ampla
dos negócios do Porto do Açu. Uma interpretação sobre vínculos e interesses dos
diversos agentes envolvidos nos negócios, para além da propaganda enganosa da mídia corporativa regional e nacional.
Os agentes financeiros, as corporações controladas pelos
fundos, os agentes públicos das diversas escalas, a mídia corporativa, a
Justiça e outros fazem parte destas relações de poder.
Assim, só conhecendo um pouco mais quem são estes agentes. Como operam, as suas estratégias e vinculações em diferentes escalas e dimensões será possível entender melhor os reflexos sobre a comunidade
regional, onde o capital fixo destes fundos chegam para extrair valor, lucros e
acumulação no território.
É preciso compreender o papel destes diversos agentes, as escalas em que atuam, as funções, suas posições na estrutura de poder e nas relações política. Só desta forma, os interesses da sociedade e das comunidades, mais
ou menos atingidas do entorno regional, poderão ser melhor questionados e,
eventualmente, negociados.
PS.: Detalhes e mais informações de muitos fatos citados
podem ser vistos em centenas de postagens do blog (desde 2007 e de forma
especial deste 2015 na seção ao lado direito, (“Últimas do Porto do Açu) sobre
os investimentos no complexo logístico portuário do Açu, litoral Norte do ERJ.
Referência:
[1] Tese do autor PESSANHA, Roberto M., defendida em mar. 2017, no PPFH-UERJ:
A relação transescalar e multidimensional “Petróleo-porto” como produtora de novas territorialidades. Disponível no Banco de Teses da UERJ: http://www.bdtd.uerj.br/tde_busca/processaPesquisa.php?pesqExecutada=1&id=7433&PHPSESSID=5vd3hsifip5hdg3n1icb57l9m6
[2] Matéria do BrazilJournal em 05 de abril de 2021. Os Chineses que estão apostando em Eike Batista - e querem investir bilhões no Brasil. Disponível em: https://braziljournal.com/os-chineses-que-estao-apostando-em-eike-batista-e-querem-investir-bilhoes-no-brasil https://braziljournal.com/os-chineses-que-estao-apostando-em-eike-batista-e-querem-investir-bilhoes-no-brasil