65 anos, professor titular "sênior" do IFF (ex-CEFET-Campos, RJ) e engenheiro. Pesquisador atuante nos temas: Capitalismo de Plataformas; Espaço-Economia e Financeirização no Capitalismo Contemporâneo; Circuito Econômico Petróleo-Porto; Geopolítica da Energia. Membro da Rede Latinoamericana de Investigadores em Espaço-Economia: Geografia Econômica e Economia Política (ReLAEE). Espaço para apresentar e debater questões e opiniões sobre política e economia. Blog criado em 10 agosto de 2004.
segunda-feira, março 14, 2022
Live sobre "Financeirização, Fundos de Investimento e Guerra Financeira" no Diário da Crise do Eduardo Costa Pinto (IE/UFRJ)
quinta-feira, março 10, 2022
A guerra financeira das sanções já afeta os maiores fundos globais e ampliará a crise
A guerra EUA-OTAN x Rússia tem três dimensões ou elementos que se interagem transversalmente, conforme o nível da disputa das relações de poder envolvida. 1) Guerra tradicional/híbrida; 2) Financeira/sanções; 3) Cibernética e digital.
Assim, como em outras guerras, começa pela primeira dimensão
e depois oscila também para as demais que antes ou não existia (cibernética) ou
era menos importante, como a econômico-financeira, nestes tempos de mercados e
finanças globalizadas.
Não é difícil perceber que estamos agora no auge da dimensão das sanções financeiras, a maior já havida até hoje em conflitos no planeta. E tem os EUA na cabeça que é quem controla a moeda de conversão e de comércio mundial e assim, a grande maioria dos fluxos da financeirização ao nível global, agindo contra uma grande potência, porque em suma se trata de uma guerra EUA x Rússia. Sendo assim, não se pode deixar de observar que na cabeça da financeirização global estão os maiores fundos financeiros globais.
Os fundos de investimentos lubrificam a financeirização que se tornou hegemônica
Dos dez maiores, nove são dos EUA, alguns em parcerias com grande financistas do Reino Unido. No topo desta lista é o conhecido fundo americano, Black Rock, criado em 1990 e que hoje controla volume de ativos superior US$ 9 trilhões, cerca de 15 vezes o confisco que os bancos americanos fizeram das reservas russas e quatro vezes mais o PIB russo.
Já tratei no meu livro “A
´indústria´ dos fundos financeiros: potência, estratégias e mobilidade no
capitalismo contemporâneo”, editora Consequência, 2019, que os fundos de
investimentos, controlam de forma crescente (em especial, depois da crise do subprime, em 2008/2009), tanto os ativos
reais (produtivos), quanto ativos financeiros (títulos, papeis, ações, mercados
futuros, etc.), em nações de todos os continentes do mundo. Assim, o
instrumento dos fundos são hoje responsáveis, em boa monta pela acelerada
financeirização ao nível global.
Nesse sentido, podemos afirmar que os fundos lubrificam a financeirização que contribuiu em boa parte pela hegemonia no capitalismo contemporâneo, globalizado que agora é colocado em xeque no confronto direto entre duas potências mundiais: EUA x Rússia.
A guerra financeira, os fundos, o sistema interestatal e a disputa por hegemonia
Os fundos de investimentos também investem na economia da guerra e das armas, embora pouco se fale disso. Porém, a repercussão das sanções econômicas não são simples de serem medidas e nem compensáveis.
A Ucrânia e seu povo sofrem essa disputa, que nessa fase se
fortaleceu em termos geoeconômicos, mesmo que em meio a movimentos
geopolíticos cujos resultados só adiante serão percebidos.
É nesse contexto que o freio dos fluxos financeiros, o abandono
de empresas e ativos na Rússia, os bloqueios de suas exportações de petróleo e
minerais, as consequências da interrupção no fornecimento de insumos e
interrupções, as quebras de várias cadeias produtivas regionais, etc. já
produzem impactos para as pessoas, nações e para esses grandes fundos globais que
possuem controle centralizado nos EUA.
A guerra financeira nunca terá uma direção única como o de
uma bomba. Como a globalização os ativos estão interligados, a explosão vai em
várias direções e em efeitos sinérgicos. Os custos das pessoas e das empresas já
aumentaram com energia e com alimentos. Junto puxa a inflação nos diferentes
países, mesmo que em proporções distintas decorrentes dos impactos diversos em
cada cadeia, mas em todos, fortemente influenciados pela energia e alimentos.
Assim, a recessão tende a se ampliar também com a redução da
produção e do comércio. É nesta toada que os ativos (reais ou financeiros)
perderão igualmente, como valor real. É certo que a periferia sempre
perderá mais, porque não detém os meios que as finanças centralizadas dispõem.
A guerra sempre tem um grau de irracionalidade que depois os
líderes tentam superar. Porém, já é possível perceber que a globalização sofre
um freio com esse fenômeno da guerra EUA-OTAN x Rússia. As nações tendem a
olhar mais para dentro, para suas defesas e para as suas necessidades estratégicas.
É óbvio que isso não interessa aos fundos financeiros globais. E se é verdade que a guerra financeira afeta os fundos globais ela também afetará os fundos financeiros regionais que aos globais estão imbricados.
Os fundos com suas plataformas digitais ‘online’ que funcionam
24 horas, monitoram todos os movimentos do mercado em que atuam e já devem identificar
as tendências. Onde os fluxos se reduziram, foram trocados, os by-pass criados,
etc. Geoeconomia determinando nova geopolítica. Por isso uma guerra entre
potências (EUA x Rússia) não tem como não ser vista como um conflito de
proporções globais
O Black Rock possui a potente plataforma Aladdin com trabalho de equipes com milhares de economistas, matemáticos e técnicos de computação em telas de 360º. Usam IA e redes de
computadores expostas em tema que monitoram simultaneamente esses dados.
Observam seus efeitos em modelagens e programações de algoritmos com
aprendizado de máquinas (learning machine).
Não é por outro motivo que o Black Rock trabalha, essencialmente com o ETF, um
fundo de índices que visa ganhar como inovação tecnológica financeira com o monitoramento da totalidade.
Os fundos chineses são poucos conhecidos e articulados junto
aos seus grandes bancos estatais. Eles possuem relações com alguns destes
fundos do Ocidente, mas se movimentam com lógicas distintas por isso, devem ser
bem menos afetados. De novo, há que se observar a tendência do Oriente se
distanciar do Ocidente não apenas por conta da russofobia.
É evidente que são grandes os temores dos proprietários
destes capitais, hoje sob a gestão destes fundos financeiros gigantes que operam
juntos, e em articulação, com o Estado americano.
Neste sentido, é provável que seus gestores (Larry Fink, em
especial) tenham feito uma aposta com o Poder Político da Casa Branca. Uma
aposta de médio prazo de olho na manutenção da hegemonia geopolítica e
financeira americana, ainda muito vinculada à moeda americana.
Porém, bombas nucleares financeiras como essas das sanções
gigantes que estão sendo escaladas, não são possíveis de serem modeladas
antecipadamente. Seus resultados ainda estão sendo medidos. Os by-pass
monitorados entre fluxos subterrâneos, mercado negro, criptomoedas e outros.
O fato é que os proprietários destes ativos dos grandes fundos globais, também estão sendo atingidos, mesmo que muito menos que as pessoas, mas tendem a reagir. Observemos, pois, os movimentos e falas dos seus líderes e, então, enxergaremos melhor, os impactos da sangrenta guerra e veremos que a crise tende a se ampliar. Apertem os cintos o hegemon pode estar à prova.
segunda-feira, março 07, 2022
Para além da diabolização do Putin, o que poderá sair da guerra EUA-OTAN x Rússia?
A guerra é cruel, violenta, sangrenta e de consequências difíceis de serem medidas, mas a diplomacia sempre se mostrou limitada para essas grandes contendas. Não há santos em disputas deste tipo, ao contrário os diabos e os demônios nascem e se alimentam de tudo isso.
O fato é que com a guerra EUA-OTAN x Rússia, ou Rússia x EUA-OTAN, Putin que já era mal visto foi ainda mais facilmente diabolizado. Em especial no Ocidente e com ajuda das redes sociais e das Big Techs americanas que entraram na disputa como braços da OTAN. Creio que Putin sabia que isso iria ocorrer. Talvez, não na proporção, quando resolveu ir para o front da guerra tradicional e mortífera. O mundo se transforma a partir daí e produz enormes consequências de médio e longo prazos, daí se compreende porque é estratégica a aliança da Rússia com a China.
As duas potências se complementam, mas a China avança no “soft power”, como poder moderador de um lado e atenuador das sanções de outro, em meio aos riscos de uma grande crise Ocidente x Oriente, ou de alternância para uma liderança mundial eurasiana. Se a premissa tem algum sentido, na aliança entre Xi Jiping e Putin, o último, já deve ter aceitado que a China possa assumir um novo papel, num mundo que não seja unipolar e sob controle da EUA-OTAN.
A história não se encerra aí, evidentemente. As sanções
estão empurrando para uma desdolarização, um comércio entre grandes nações, via
moedas próprias, digitais e/ou criptos, compensações e meios de pagamento em
volumes nunca dantes realizados. É um processo paulatino, mas que já está sendo
testado na prática, com maior volume e ajustes acordados em tempo de guerra.
A Europa que já enxerga vantagens nas relações com a China,
de outro lado teme muito agora, a expansão da guerra e os riscos de um desabastecimento
energético e de alimentos, além do torpedeamento de suas potentes cadeias
produtivas regionais.
Os países da UE têm suportado as pressões se mantendo na
OTAN, para desgastar o “vizinho” Putin, mas já deve estar repensando os riscos que
tem de um lado e também do outro, assim como as vantagens que pode ter com um mundo multipolar (sem acreditar muito nisso, após sofrer duas grandes
guerras),
Enquanto isso, a Turquia que é membro da OTAN, parece
enxergar mudanças neste pêndulo, não apenas se oferecendo para moderação, mas indo
um pouco mais longe, ampliando conversas e negócios com ambos os lados, assim
como outros países do Oriente Médio e também a asiática e grande Índia. Se este for o cenário será também grande a hipótese de Trump retornar ao poder nos EUA, após ter sucumbido à condição de "hegemon". Mas, isso
já seria outra e longa conversa.
A guerra e as tragédias humanitárias vão além destes períodos
de grandes embates, batalhas, transformações e sofrimento. No dia-a-dia muitas
vezes eles não são enxergados e passam despercebidos. Não por maldade,
mas por banalização. Realisticamente, não cabe torcida num ambiente de guerra,
mas é necessário que nos esforcemos para entender o que realmente está
ocorrendo.
sexta-feira, março 04, 2022
A aceleração do tempo na guerra 4.0 (EUA-OTAN x Rússia), os riscos de expansão do conflito e reflexos nas eleições no Brasil
É importante observar a aceleração dos tempos presentes na disputa EUA-OTAN x Rússia, em relação às guerras anteriores. É um processo que pode ajudar a explicar a disputa e a perda da racionalidade que pode estar delineando um quadro tenso de uma pré-3ª Guerra.
A Ucrânia foi o estopim. Tudo se desenrola numa velocidade alucinante — bem distinto dos tempos da 2ª GM —, características do mundo digital que alimenta a guerra física, financeira e de sanções, como elementos da Guerra 4.0. (Ver artigo anterior: Três principais elementos da disputa Rússia x OTAN).
Não estou me referindo apenas a velocidade de informações e contrainformações — isso já havia antes com comunicação via rádios — mas, o "time" que as nações que vão sendo envolvidas no conflito e no tempo que têm para digerir e tomar decisões, que de forma espiral pode seguir envolvendo outras nações.
Se o conflito EUA-OTAN x Rússia se alongar no tempo, esses
desdobramentos se estenderão para as questões econômicas das nações, com
reflexos para as eleições nacionais de vários e importantes países.
Tudo isso tende a retroalimentar e ampliar espacialmente o conflito.
A guerra 4.0 e as
eleições no Brasil
Essas hipóteses sacodem o tabuleiro e produzem
instabilidades e possibilidades para que as relações internacionais e a crise
EUA-OTAN x Rússia afetem as eleições no Brasil previstas para daqui a menos de
sete meses. Ainda não vi e nem li comentários sobre essas hipóteses, mas creio
que elas precisam ser consideradas e avaliadas.
No caso do prolongamento do conflito e expansão espacial para
outros pontos da Europa é evidente que os candidatos das eleições na França e
no Brasil (entre outros países) terão que lidar mais densamente com o tema das
relações externas e muito provavelmente também com posições fortemente
confrontantes entre os principais candidatos.
No caso de Bolsonaro, o atual presidente já começou a
produzir falas conflitantes e em dissimulação sobre a guerra, aliás como faz o tempo
todo em outros assuntos. Não é difícil supor que Bolsonaro queira usar o tema para
esconder seus graves problemas de administração e os poucos resultados que tem para a apresentar na busca de reeleição, mesmo não tendo liderança reconhecida ao nível global.
Bolsonaro usaria essa nova dissimulação não apenas como uma
desculpa para as dificuldades de seu período de mandato, que mistura ainda a
Pandemia neste bojo. Assim, pode-se ainda imaginar que o presidente poderia tentar
reapresentar o “seu governo militar” como o mais apropriado ao tempo presente, permeado
de conflitos entre nações, embora o que se perceba ao nível global, seja a demanda
ansiosa por lideranças que possam intermediar os conflitos, atributo que
Bolsonaro nunca teve, ao contrário daquilo que é reconhecido globalmente, em
seu principal opositor, Lula.
O uso da guerra para alegar a paralisação da economia, a inflação, preços altos dos combustíveis (gasolina, diesel e gás), eletricidade, alimentos, etc. são fatos que fogem à realidade de um país que em quatro anos de mandato, vem observando o desmonte das políticas públicas e de piora das condições de vida, com entrega e privatização de estatais a preço vil (inclusive das fábricas de fertilizantes da Petrobras que faz agora falta), muito anos antes de espoucar o conflito EUA-OTAN x Rússia.
Entre o medo e o horror com a guerra e a demanda por uma liderança forte e moderada
Há ainda a ser considerado, o tamanho do percentual dos
brasileiros que tem medo (ojeriza) à ideia de guerra. Esses podem temer ainda
mais Bolsonaro e seu governo militar. Como se pode intuir, o tema tende a trazer
mais um embate político entre os principais candidatos nas eleições de outubro.
Para quem está na liderança folgada nas várias pesquisas, em
quadro de estabilidade, caso do Lula, nada disso interessa. Já ao presidente
que vai para a disputa à reeleição nas piores condições, por má avaliação do seu
mandato na história eleitoral do Brasil, o tema pode aparecer como esforço,
quase desesperado, de virar o quadro com iniciativas e decisões inesperadas.
É evidente que o percentual de pessoas que possa cair nesta
nova e contraditória dissimulação não é tão grande, mas devemos lembrar que as
eleições contemporâneas no Ocidente tendem a ser decididas por margens pequenas
de votos.
Enfim, as ameaças da guerra EUA-OTAN x Rússia para outras
regiões do mundo começa a aparecer no horizonte como um grande conflito. No
Brasil, estamos a menos de sete meses das eleições de outubro. Esperava-se para
abril (e depois junho), as primeiras definições que produziriam reflexos para as
eleições presidenciais.
Porém, esse novo cenário chega trazendo espanto e horror pelos
embates e vítimas, mas também instabilidades e possibilidades de que o tema da
guerra, se prolongada no tempo e espaço, possa empurrar as definições principais
das eleições no Brasil, ainda mais para a reta final do pleito por conta das grandes transformações da geopolítica global.
terça-feira, março 01, 2022
Três principais elementos da disputa Rússia x OTAN
Três elementos chamam a atenção nesta disputa OTAN x Rússia: 1- Energia (petróleo e gás); 2- Hegemonia financeira (fluxos e sanções); 3 - Controle Cibernético (Big Techs-Redes Sociais; Manipulação política) e Imperialismo digital. A sequência vale também temporalmente.
O 1⁰, a Energia está presente há um século nas disputas geopolítica e por hegemonia. O 2⁰, a financeirização se amplia há 3 décadas. Já a 3⁰, a disputa cibernética, há quase duas décadas.
A guerra OTAN x Rússia se dá em três frentes, especialmente. Em duas (financeira-cibernética) toda a OTAN+ enfrenta a Rússia. Porém, mesmo a guerra "tradicional" é atravessada por estes dois enfrentamentos.
Assim, as guerras híbridas e físicas serão disputadas nestes três campos, mesmo que ainda não tenhamos clareza desse processo. Mais complexo ainda se torna o fato das disputas se darem entre Ocidente e Oriente ou na região eurasiana.
PS.: Atualizado às 10:16 de 01/03/2022.