O crescimento dos serviços é uma característica da sociedade contemporânea e de todo o país. Desde 2000-2004 (época que elaborei do Raio X do orçamento de Campos dos Goytacazes) acompanho essas principais receitas dos municípios. Naquela época começavam a disparar as receitas dos serviços nas capitais e cidades das regiões metropolitanas, logo após terem superado as receitas do imposto sobre a propriedade, o IPTU.
Nesses últimos vinte e três anos as receitas dos serviços seguiram se ampliando. Logo adiante, o mesmo fenômeno passou para as cidades de médio porte e agora até mesmo em alguns municípios de menor porte.
Nessa transição foi sendo superada a antiga classificação da economia entre de atividades do setor primários, secundário e terciário. Os serviços se ampliaram como atividades que foram se desagregando da produção industrial e mesmo agrícola e avançando para além de saúde e educação.
Também por isso essas atividades e suas receitas passaram a crescer mais na esfera da União, Estados e municípios. Estes, por direito constitucional, passaram a monitorá-los e regulamentá-los mais de perto, visando maior arrecadação diante do aumento das despesas derivadas dos direitos dos cidadãos.
Numa sociedade mais complexa e sofisticada os serviços se multiplicam. Um exemplo: no passado, não existia a ideia de logística e nem a informática como instrumento da chamada transformação digital. A intermediação de serviços de RH, contabilidade, marketing, TI, etc. para além de saúde e educação eram departamentos das companhias. Os serviços são atividades ligadas à densidade populacional e/ou negócios e mesmo das cadeias de produção.
É nesse contexto que se deve observar as variações deste tipo de receita nos últimos anos nesses dois municípios do Norte Fluminense. Campos dos Goytacazes–RJ, como município de médio porte que é polo regional há muitas décadas e São João da Barra, após separado do município de São Francisco do Itabapoana em 1995, do início da construção do Porto do Açu em 2008 e do início de suas operações e movimentação portuária que se dá a partir do 2º semestre de 2014.
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Atividades de serviços portuários no Açu, SJB, só impactam ISS |
Em 2014, com o início das operações de exportações no Porto do Açu, a receita de ISS em SJB somou R$ 63 milhões. Em 2017 caiu para R$ 42 milhões. O fato se deveu a um acidente ocorrido no mineroduto entre o município que liga a mina de minério de ferro da Anglo American no Quadrilátero Ferrífero em Minas Gerais e o Porto do Açu (PdA) em São João da Barra, litoral norte do ERJ.
Em 2016 o ISS de Campos foi de R$ 89 milhões enquanto o ISS de SJB foi de R$ 43 milhões. Em 2020 (1º ano da pandemia) a receita de ISS em Campos foi de 81,5 milhões e o de SJB já tinha subido para R$ 86 milhões, ano é que começa a haver um distanciamento da receita de ISS entre esses dois municípios.
Em 2023 as receitas do imposto ISS nesses dois municípios foram:
São João da Barra - R$ 174 milhões;
Campos dos Goytacazes - 152 milhões.
Ou seja, em 2023, SJB arrecadou 14% a mais com o imposto de ISS do que Campos, RJ.
Nas Leis Orgânicas Anuais (LOAs) desses dois municípios, a previsão de receita para 2024 é de R$ 123,4 milhões para Campos, RJ e de R$ 184,0 milhões para SJB, RJ. A maior arrecadação de Imposto Sobre Serviços (ISS) em SJB está diretamente vinculada aos serviços e atividades portuárias nos dez terminais do complexo do Porto do Açu licenciados junto à Antaq.
Em SJB, a receita de ISS já é quase dez vezes maior do que a receita sobre propriedade, o IPTU. Já em Campos dos Goytacazes, essa relação entre ISS (maior) e IPTU é de cerca de 15% a mais. Em Campos dos Goytacazes, foi em 2020 que a receita de ISS ultrapassou a receita do imposto IPTU.
No caso município de SJB, a receita do ISS, basicamente oriunda das atividades e obras no complexo portuário. Dessa forma, não é um exagero a afirmação que venho efetuando de se tratar, basicamente, de um “território de passagem” para a riqueza mineral que é por ali exportada, em especial minério de ferro e petróleo, após transbordo em navios no terminal 1 do Porto do Açu.
Vale lembrar que o ISS é um imposto municipal e que tem uma alíquota que varia até 5% conforme os serviços prestados. No caso de SJB na fase de instalação e implantação do porto, essa alíquota para os serviços portuários foi reduzida pela Câmara de 5% para 2,5%.
Movimentação portuária nos dez terminais portuários licenciados pela Antaq no Açu em 2023
Enquanto isso, a movimentação portuária (exportações + importações) nos dez terminais portuários do Complexo do Porto do Açu, através de mais de 6 mil embarcações circulando em 2023 teve como destino e/ou origem mais de 30 diferentes países.
A movimentação de cargas no ano de 2023, segundo dados da Comex-Mdic, em valores FOB US$, chegou a (US$ 4,210 bilhões (US$ 3,617 de exportações e US$ 592 milhões de importações). Uma movimentação com valor, 89% maior do que em 2022, quando essa cifra foi de US$ 2,25 bilhões. A maioria das exportações são dos produtos minerais como petróleo, minério de ferro e também cobre (vindo de Goiás e mesmo o lítio vindo do Vale do Jequitinhonha).
Em valores na moeda brasileira, essa movimentação de cargas de 2023 em SJB, significa cerca de R$ 21 bilhões. Se estimarmos, um percentual de 10% de receita para o conjunto dos serviços portuários, é possível chegar a um valor de cerca de R$ 2,1 bilhões para a holding Prumo Logística Global, dona do Porto do Açu controlada pelo fundo americano EIG Global Energy Partners
Diante desses números, pode-se dizer que o aumento da receita de ISS para o município de SJB em 2024 de R$ 184 milhões é ainda muito pequena para o município que não a fiscaliza, aceitando as autodeclarações das companhias que atuam nas movimentações de carga no Porto do Açu.
Assim, é também possível reafirmar que as atividades de logística servem mais aos objetivos do extrativismo e o uso do “território como de passagem”, do que, propriamente, à noção de desenvolvimento regional. Até aqui as únicas exceções são a geração de energia elétrica na usina termelétrica, GNA e à produção de tubos flexíveis pela FMC Technip.
Adiante, detalharemos um pouco mais sobre os dados do MDIC a respeito do volume de exportações e importações realizadas pelo Porto do Açu (PdA) em SJB no ano de 2023, seja em valores FOB US$, em toneladas e tipos de cargas.
Essa movimentação de cargas no PdA em SJB se relaciona a mais de três dezenas de países, sendo que a maior parte das exportações continua a ser para a China 42% e depois EUA e Índia. E as importações, em bem menor valor e peso, vêm especialmente da Alemanha, Reino Unido e EUA e depois são reencaminhadas aos clientes dessas cargas.
PS.: Atualizado às 09:50 de 07/02/2024: para corrigir o valor da movimentação em US$ do Porto do Açu em 2023, quando citamos apenas as exportações sem considerar as importações. Junto, esse volume chegou a US$ 4,2 bilhões, ou R$ 21 bilhões, 89% superior à movimentação de 2022. Foram acrescentadas outras informações no texto como a maioria das exportações para petróleo e minério de ferro e referente à alíquota de ISS dos serviços portuários cobrada pelo município de SJB de 2,5%.