quinta-feira, junho 27, 2024

Big Techs articuladas com o complexo militar dos EUA

Essa matéria ao lado (e neste link) de um jornalista brasileiro, Pedro Teixeira da FSP, que por ironia do destino viajou aos EUA a convite da AWS (subsidiária da Amazon), traz importantes elementos para se avaliar como as Big Techs americanas já atuam junto e articuladas com o complexo militar dos EUA.

A breve reportagem (publicada no online ontem e hoje na versão impressa p.12, seção Mercado) detalha a reação de trabalhadores da Big Tech Amazon contra a direção da companhia no acordo (contrato) em curso com Israel para fornecimento de infraestrutura digital com uso dos datacenters, nuvens, Big Datas e IA que estão servindo ao genocídio de Israel em Gaza contra os palestinos.

O caso reforça a interpretação de que a AWS (subsidiária Amazon que atua na armazenagem de dados com data centers já trabalha para a Defesa, FA, CIA e segurança interna dos EUA e em articulação com os exércitos de Israel e Ucrânia e confirmam uso não apenas dos Big datas e nuvens, mas softwares de reconhecimento facial, espionagem e IA na localização de palestinos e das minas na guerra Ucrânia com a Rússia.

Portanto, se percebe que a guerra cibernética não é coisa de futuro, ela já é real e vai muito para além do uso dos drones para transportar armas e jogar bombas. Esse caso da Amazon reafirma o poder das Big Techs como braços e mente das FAs e do Deep States dos EUA. Israel x Gaza e Ucrânia x Rússia parecem laboratórios para algo maior.

O aprofundamento dessas questões nos levam à interpretação sobre como acaba sendo limitada a discussão sobre a regulação sem uma infraestrutura digital própria e um projeto de IA estatal que nos dê um mínimo de soberania. Aparenta aquilo que antes era uma conjectura: o Deep State, FA, Wall Street e Big Techs são agentes e instrumentos únicos de poder na disputa geoeconômica e geopolítica por parte dos EUA no esforço de manutenção da sua soberania.

terça-feira, junho 11, 2024

Datacenters, IA, consumo de energia e as contradições da dominação técnico-digital no Brasil e no mundo

Os datacenters, coração e pulmão da chamada Inteligência Artificial (IA), têm previsão de consumir até 21% de toda a energia elétrica gerada no planeta em 2030, portanto, daqui a menos de seis anos, segundo previsão do Lincoln Laboratory, do MIT, EUA.

Fonte: da imagem: Olhar Digital (gerado com IA: +contradição.
As previsões de aumento de demanda exclusivas para o Brasil também são muito expressivas. Informações de estudos realizados e coletados pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) do Ministério das Minas e Energia (MME) mostram a tendência de evolução da carga elétrica prevista para os datacenters no Brasil com crescimento que pode chegar a 2,5 GW até 2037 (cerca de 5% do consumo nacional de energia elétrica em 2023), só considerando novos projetos nos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Ceará. Atualmente, existem, em trâmite processual no ministério, 12 projetos de datacenters relacionados ao acesso desses consumidores à rede de transmissão de energia elétrica do Brasil. Sete deles já estão com portarias emitidas e cinco seguem em análise.

Ou seja, o uso da IA que inclui as guerras e soa muitas vezes como ideal de progresso e como atratividade, mas significa uma enorme expansão da demanda de energia elétrica e água usada também para refrigeração destas gigantes instalações de infraestrutura digital que acabam também ampliando a emissão de gases do efeito estufa que se pretende reduzir.

Tudo isso vai na direção contrária do que chamam de transição energética. Nesse caso não caberia falar em transição no uso de energia e sim, num uso cada vez maior de energia, seja de que tipo for, que estiver à disposição da demanda gerada pela "digitalização de quase tudo" e o que vem acompanhada em sua cadeia de negócios que não estão nas nuvens, mas fincadas nos territórios.

Maior utilização de "Inteligência artificial" (IA); "aprendizagem" de máquina (ML) e "aprendizagem" profunda (DL) e IA generativa e Super IA, significam maior demanda de datacenters que já estamos vendo, e, consequentemente, uma maior consumo de energia elétrica, num mundo que ainda não a levou à todas as pessoas e comunidades.

Aliás, o geógrafo e professor Cláudio Zanotelli da UFES, tem ampliado o conhecimento e a divulgação do livro "Une nouvelle histoire de l’énergie" (Uma nova história da energia) do historiador francês Jean-Baptiste Fressoz que vem questionando o termo "transição energética" e outros, como energia verde e limpa, à luz da própria história da sua produção e do seu consumo em todo o mundo.


O mundo com a "digitalização de quase tudo" como etapa da reestruturação produtiva contemporânea e com os cálculos e estatísticas que exigem mais capacidade computacional para definir os padrões que a tal IA utiliza, significa muito mais consumo e produção de energia do que se tem hoje, globalmente. Daí que se começa a perceber que não parece conveniente falar, necessariamente, em transição energética, como questiona Fressoz.

O que impressiona ainda mais é que tudo isso está cada vez mais centralizado nas mãos de poucas e gigantes corporações, em boa parte controladas pelo capital e fundos financeiros que vão explicando aquilo que venho sempre repetindo: dominação tecnológica alinhada à hegemonia financeira e sob a lógica da racionalidade neoliberal.

terça-feira, junho 04, 2024

Digitalização e financeirização sempre juntas e misturadas na espiral de acumulação infindável

A matéria da revista Exame: "A estratégia por trás do fundo tokenizado da Blackrock : O primeiro fundo tokenizado público da BlackRock não é apenas um marco financeiro, mas um testemunho de seu compromisso em revolucionar as finanças tradicionais", é, na verdade, mais uma propaganda do maior fundo financeiro global, o americano BlackRock que tem patrimônio líquido de mais de US$ 10 trilhões.

Vale registrar que atualmente a revista Exame está nas mãos do grupo financeiro BTG Pactual, assim como quase todos os demais portais que tratam de notícias financeiras no Brasil.

Nessa propaganda se vê que além da já conhecida plataforma tecnológica Aladdin, o BlackRock já está utilizando para a sua capitalização e para modelar seus movimentos financeiros atrás de maiores lucros em curtos prazos, outra plataforma financeira: o "BUIDL, Fundo de Liquidez Digital Institucional" que opera ETFs na rede Ethereum, com bitcoins, tochenização e outros com uso da tecnologia blockchain em negócios com ativos digitais.

Assim, imbricados e enlaçados, a digitalização vai lubrificando a acumulação entre ativos reais (tradicionais) e financeiros, garantindo aos seus investidores liquidez 24/7 (transferibilidade em 24 horas e 7 dias por semana) - fluidez total - com "conexão perfeita entre as finanças digitais e tradicionais" e "pagamentos de dividendos diários dos investimentos".

Tudo isso reafirma o que temos chamado de "tripé do capitalismo contemporâneo" sustentado pela digitalização de quase tudo como etapa atual da reestruturação produtiva; a hegemonia financeira; e a racionalidade neoliberal do mercado.
 
Capitalização e valorização juntas e misturadas, constituindo a "espiral de acumulação infindável" denominada por David Harvey, ou o que chamo de capital helicoidal no meu livro "A 'indústria' dos fundos financeiros: potência, estratégia e mobilidade no capitalismo contemporâneo" (Consequência, 2019).

Capital helicoidal como movimentos do capital em torno de um eixo que jamais passa por um mesmo ponto, não constrói círculos e nem elipses que se fecham em si, mas trajetórias helicoidais em que o plano seguinte do movimento se situa num outro patamar de extração.