quinta-feira, dezembro 12, 2024

Os movimentos já em curso na profundeza das articulações Trump, Big Techs e Wall Street

A rede social X (ex-Twitter) se transformou numa arma de manipulação e propaganda da extrema-direita global através do seu dono, Elon "Moska" (a alteração do sobrenome é para disfarçar o algoritmo, mais bobo e inocente, rs).

O que estou falando não é nenhuma novidade para a maioria, porém o processo e como isso vem se ampliando e se consolidando, merece ser melhor observado.
 
Não sou e nunca fui um usuário assíduo dessa mídia social, mas acompanho com interesse de pesquisa e como forma de me informar e relacionar com alguns pares, como faço também aqui e no meu blog.

A mudança que vinha sendo sútil vem se alterando agora mais rapidamente. Os perfis a que se tem acesso mostram e indicam formas de manipulação que não são grosseiras, mas perceptíveis. 

Esses perfis são, muitas vezes, falsos, se propõem a usar algum humor, ironia e alguma relação com o seu modo de pensar, mas redirecionando-o, o que indica uma organização e uma articulação bastante mais elaborada.

Isso se dá tanto em perfis nacionais quanto de fora do país e em outras línguas.

O que se parece estar sendo planejado e já em curso não é algo pequeno e nem superficial.

Talvez, não seja coincidência que isso se amplie, nesse momento em que o personagem citado foi escolhido e já atua como um dos principais assessores do Trump na Casa Branca e com intenções de articulações globais. Sua função ganhou um "novo departamento" chamado de Eficiência Governamental e que teria como objetivo "desmantelar a burocracia governamental, impulsionar uma reforma estrutural em larga escala e cortar gastos". Mas, será mais que isso com atuação transversal sobre relações internacionais.

Logo no pós-eleição dos EUA, houve um claro realinhamento de todas as Big Techs (e seus CEOs) ao presidente eleito e seu partido. Antes, algumas dessa Big techs eram mais próximas dos Democratas.do que dos Republicanos. A partir daí, a orientação do Trump tem sido a de conceder toda liberdade e poder às Big Techs americanas. 

Assim, já estão pressionando o Departamento de Justiça e outros órgãos governamentais que, nos últimos anos, vinham tentando ampliar a regulação e ações antitruste sobre a oligopolização das Big Techs. Ou seja, Trump e "Moska" preveem a ampliação da articulação entre Wall Street e as gestoras dos fundos do mercado de capital (em especial os Venture Capital) que já investem pesado nas corporações digitais e startups.
 
A ideia é ampliar mercado dessas Big Techs em todo o Ocidente, trazendo mais capital para os EUA. Porém, o maior interesse é o de também evitar que essas gigantes corporações continuem sendo reguladas nos demais países (UE, Brasil, entre outros).

Pretendem atuar ainda impedindo cobranças de impostos sobre essas gigantes corporações americanas do universo digital e de telecomunicações. Querem assim garantir recursos para a expansão da infraestrutura digital controlada diretamente pelos EUA (e Big Techs), para a pesquisa e inserção no mundo real da Inteligência Artificial, tudo isso com total liberdade e sem nenhum controle e restrição dos demais países, usuários dos serviços das Big Techs americanas.
 
Nessa linha, os EUA vão pressionar governos e perseguir (formal e informalmente) seus governantes, fomentando reações internas nesses países. As mídias sociais, não apenas o X (Twitter) serão instrumentos dessas pressões. Ou melhor, já são. Vão ampliar enormemente esses métodos que misturam guerra híbrida, cibernética e comercial. O intuito é manter o império nas relações de poder externa e internamente, ganhando com a melhoria da economia a partir do dólar vias essas grandes corporações digitais (GCDs).

Ou seja, o que se desenha na profundeza das articulações do novo governo americano e donos das Big Techs, controladores da Economia Digital no Ocidente, é muito maior e preocupante do que aquilo que aparece na superfície das postagens em uma dessas mídias sociais como o X, ou das nossas inocentes e pueris mensagens e fotos expostas no Instagram, Facebook e outras.

Há mudanças profundas em curso em todo o mundo. Como estamos vendo, a "digitalização de quase tudo" tem enorme potência para produzir colossais mudanças nas sociedades que estão sendo profundamente impactadas. O avanço da tecnologia digital como atual etapa da reestruturação produtiva surge e se acelera junto da ampliação da globalização, impondo movimentos que abalam a forma de fazer política nos países-nação e na relação entre si na geopolítica. Não só observar, mas acima de tudo, é preciso ação política! 


PS.: Atualização às 11:06 e 12:26 de 13/12/2024 para breves correções e inclusões.

terça-feira, dezembro 10, 2024

Divulgação científica: textos para dois livros, após período de afastamento

Levei cerca de 4/5 meses afastado das redes sociais. Tempo usado para cuidar da saúde. Nesse período, tive que recusar convites para mesas-redondas de congressos e seminários e algumas bancas de mestrado e doutorado. Nesse período o blog também completou (em 10 de agosto) 20 anos de funcionamento.

Agora, já bem, venho retornando às mídias sociais aos poucos, porque só no afastamento, se observa como elas nos tomam tempo útil, embora sirvam também de comunicação. A "digitalização de quase tudo" como costumo falar, é sempre, simultaneamente, atrativa e perigosa. Assim, como os remédios, os riscos estão na dose.

Nesse período, dois livros que contribuí com textos (capítulos), ambos surgidos após debates e seminários, foram lançados e também não pude participar diretamente. As duas publicações tratam de assuntos que estão relacionados diretamente às minhas atuais pesquisas, ligadas à digitalização como etapa atual da reestruturação produtiva imbricada à hegemonia do capital financeiro, sob a racionalidade neoliberal.

O 1º dos livros-coletânea tem o apoio do CNPQ, foi lançado em julho na UnB e foi organizado pelos companheiros professores Ricardo Toledo Neves (UnB) e Flávio Chedid Henriques (UFRJ) e seu título é "Um horizonte de lutas para a Autogestão: O trabalho organizado por plataforma digital". Meu texto é o capítulo 1: Plataformismo: uma nova etapa do modo de produção capitalista? [O sumário de toda a publicação seguirá abaixo]
 

O 2º livro-coletânea é "Geografia da Economia Política na América Latina" lançado na última semana na UFF, foi organizado pelos companheiros pesquisadores da ReLAEE (Rede Latinoamericana de Investigadores em Espaço e Economia): Edilson Pereira Jr. (UEC); Denis Castilhos (UFG); Luciana Buffalo (UN Córdoba); Cláudio Zanotelli (UFES) e Naomi Fratini (UN Córdoba). Editora Consequência. O meu texto está na 2ª Parte "Economia de Plataforma, Produção, Circulação e Geografia de investimentos". Capítulo 6: "Infraestrutura digital, extrativismo Hi-Tech e capitalismo de plataformas. Artérias digitais escancaradas da América Latina - uma homenagem a Galeano". [O sumário de toda a publicação seguirá abaixo].

Sigamos em frente!





 





sexta-feira, dezembro 06, 2024

"Açu 2017-2024" Fotolivro do Mateus Gomes

O fotógrafo, artista e pesquisador Mateus Gomes Almeida lançou agora em 2024, o seu fotolivro: Açu. O livro contém imagens que expõe um olhar que se pode chamar de arte-resistência sobre as consequências pessoais, sociais e ambientais da população do território hoje ocupado pelo complexo portuário do Açu, instalado no Norte Fluminense, município de São João da Barra.



Mateus Gomes nasceu em 1993 em Campos dos Goytacazes, RJ é graduado em Direito pela UCAM Campos, foi pesquisador colaborador no Laboratório de Estudos do Espaço Antrópico do Centro de Ciências do Homem (LEAA) da UENF. Atualmente é graduando em Artes Plásticas pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e atua como pesquisador, fotógrafo e artista independente. Suas pesquisas investigam em especial "temas relacionados a geografia humana, geopolítica, globalização e ao território como matriz da vida social, econômica e política, produzindo trabalhos em fotografia, vídeo e desenho".

Esse é o segundo fotolivro sobre o tema do Açu. Outro lançado em 2023 se chama Escombros e foi lançado pela Editora Photothings e também retrata o desmonte do habitar dos pequenos agricultores expulsos de suas terras no Açu.

O livro “Açu” participou da Convocatória de Fotolivros Festival Zum, do Instituto Moreira Sales, São Paulo (2024), foi escolhido para exposição coletiva (em curso até fevereiro de 2025 no IMS) e também passou a integrar o acervo da biblioteca do IMS paulista.

O fotolivro "Açu" tem 208 páginas, 110 imagens, é dividido em três capítulos e oferece uma análise crítica do extrativismo em sua fase contemporânea e articulada às cadeias de valor global (CVG), articuladas aos sistemas portuários que tratei na postagem anterior.

Nas palavras do autor (Mateus Gomes) "o fotolivro foi desenvolvido entre os anos de 2017 e 2024, a partir da perspectiva territorial e pessoal do autor, o livro apresenta imagens que contrastam dois mundos distintos – o industrial e o rural –, cujas coexistências são forçadas por interesses econômicos e políticos. O foco recai sobre os agricultores familiares, principais vítimas da atividade extrativista, que testemunham a supressão de suas comunidades em nome do capitalismo predatório".

Por conta de minhas pesquisas sobre a implantação do projeto do Porto do Açu, (holding EBX e depois Prumo), expostas em centenas de postagens no meu blog, tese de doutoramento e capítulos de livro, Mateus Gomes me solicitou e tive a honra de publicar o texto “Porto para quê e para quem” que encerra o referido livro.

Vale conferir um pouco sobre a arte-resistência do Mateus Gomes em seu site que também reproduz algumas das imagens publicadas em seu livro:

Sistema portuário da região Sudeste: instalações, potencial e impactos

Chama-se de porto um complexo de logística que abarca diferentes e variados terminais. Raramente um porto é especializado em um tipo único de carga e uso de apenas um terminal. O(s) tipo(s) do terminal(is) e suas características físicas determinam os tipos de navios que movimentam cargas importadas ou exportadas, ou em navegação de cabotagem, dentro do país. São navios graneleiros (entre eles o petroleiro, gaseiro, etc.), conteineiros, etc. 

O Brasil dispõe atualmente de 36 portos públicos organizados com 170 terminais concedidos e 210 Terminais de Uso Privado (TUPs). Em todo o país, a maior parte das cargas movimentadas (em especial para exportações) são pela ordem: minério de ferro, petróleo - derivados e combustíveis - e agronegócio, puxado especialmente pela soja. Essa ordem é alterada conforme o critério por volume, peso ou valor em US$ FOB.

Os estados litorâneos aproveitam a geografia física para ampliar a obtenção de projetos de infraestrutura logística (integração modal) e assim avançar na conquista de movimentação de cargas. No Brasil, o período dos últimos 25 anos foram importantes para o desenrolar deste processo.

Agentes do setor pressionaram o Estado para a adoção de novos marcos legais (Lei dos Portos de 1993 e Lei 12.815/2013 (ex-MP dos Portos) e institucionais para reestruturar o sistema portuário nacional. Ambas estabeleceram regras e condições jurídicas que levaram à ampliação da participação do setor privado nos portos.

Os portos e seus terminais podem ainda serem analisados e classificados sobre a evolução da geração de usos, muito vinculados às instalações e às tecnologias. No mundo, conforme a classificação, se fala em 4 ou 5 gerações. A conteinerização é um desses marcos, porque o seu uso multimodal deu enorme celeridade às cargas, num momento em que o contêiner passou a ser chamado de espinha dorsal (back-bone) do transporte. Outra mais recente geração é o porto-indústria (ZIP - Zona Industrial Portuária) ou MIDAs (Maritime Industrial Development Areas - ou Área de Desenvolvimento Industrial Marítimo), normalmente instalados fora dos núcleos urbanos, com objetivo de ampliar a fluidez das cargas, e tendem a gerar espaço tipo enclaves econômicos.

Essa última geração de portos (ZIP ou MIDAs) também é responsável pelo que chamo de "gigantismo naval" que puxou o "gigantismo portuário". Navios cada vez maiores, que transportam volumes colossais a granel (óleo, soja, minérios, etc.) ou em contêineres que passam a demandar imensos terminais portuários com enorme profundidade para receber a atracação desses navios gigantes de enorme calado e que armazenam e transportam, hoje, até 25 mil contêineres. [1]

A Região Sudeste do Brasil tem três dos seus quatro estados litorâneos com uma extensão de 1.668 km dos 7491 km de litoral de todo o país. Outro fato que contribui para a instalação de tantos portos e terminais nessa região é a concentração econômica nessa região, que detém cerca de 53% de todo o PIB do Brasil. 

O estado de Minas Gerais é o único estado da região Sudeste sem litoral e que se serve dos portos dos outros três estados litorâneos, em especial RJ e ES, que hoje disputam a oferta de logística portuária para a movimentação de cargas oriundas ou recebidas pelos mineiros. 

Vale ainda registrar que a região Sudeste tem o porto com a maior movimentação de cargas da América Latina: Porto de Santos que hoje possui 53 diferentes terminais (nem todos listados no mapa abaixo da Antaq). Já o Estado do Rio de Janeiro, chamados por alguns pela alcunha de "Estado-porto" é de toda a região Sudeste, aquele que possui mais instalações portuárias ao longo do seu litoral. 

São 7 municípios com instalações portuários no ERJ: Rio de Janeiro (capital); Niterói; Itaguaí; Angra dos Reis; Arraial do Cabo; Macaé (não aparece no mapa da Antaq) e São João da Barra. Esse fato em si é ainda pouco lembrado quando se estuda a economia fluminense, suas potencialidades e desafios. A infraestrutura logística movimenta grande volume de recursos, embora, muitas vezes, se sirva dos municípios e de suas regiões apenas como "territórios de passagem" das cadeias de valor global (CVG).

Os sistemas portuários são cada vez mais importantes no capitalismo globalizado contemporâneo que se utiliza de imenso fluxo materiais entre as nações e intranacionais. As instalações portuárias são utilizadas, na maioria das vezes, para o fluxo de maior distância, superior a 2 mil km, mas quase sempre integrado a outros modais de transporte como o rodoviário, ferroviário e mesmo o aeroviário. 

Suas instalações têm provocado, ao longo do tempo, desapropriações e expulsões violentas de populações originárias (caiçaras, pescadores e pequenos agricultores) e a produção de enorme impacto ambiental, quase sempre não compensadas ou mitigadas pelos controladores e proprietários desses sistemas que alimentam cadeias de valor global por todo o mundo.


Nota: 
[1] Artigo publicado em 26 de dezembro de 2012 na revista GeocritiQ [Plataforma digital ibero-americana para la difusión del trabajo científico] da Faculdade de Geografia da Universidade de Barcelona: "Portos demandam regulação". Disponível em: https://primeraepoca.geocritiq.org/portos-demandam-regulacao/

PS.: Atualização em 07 de dezembro de 2024 às 22:24 para acrescentar um parágrafo e uma nota com a referência.