Blog do Roberto Moraes
65 anos, professor titular "sênior" do IFF (ex-CEFET-Campos, RJ) e engenheiro. Pesquisador atuante nos temas: Capitalismo de Plataformas; Espaço-Economia e Financeirização no Capitalismo Contemporâneo; Circuito Econômico Petróleo-Porto; Geopolítica da Energia. Membro da Rede Latinoamericana de Investigadores em Espaço-Economia: Geografia Econômica e Economia Política (ReLAEE). Espaço para apresentar e debater questões e opiniões sobre política e economia. Blog criado em 10 agosto de 2004.
domingo, abril 07, 2024
Musk quer com seu estado-plataforma X (Twitter) a mesma liberdade que buscou Hitler
sexta-feira, março 29, 2024
Resultados da Globo S.A. em 2023: lucros salvos mais uma vez pelas receitas financeiras
quarta-feira, março 20, 2024
IA da Google no futebol: humano como base, mas com avanço da dominação tecnológica
Quem pensou que a tecnologia no futebol ficaria restrita ao VAR e às estatísticas de desempenhos isoladas dos jogadores, apostou na Best errada (sic). O Google, já passou a utilizar uma potente, volumosa e extraordinária base de dados de várias jogadores, partidas e campeonatos que trabalhadas com tecnologia IA podem definir táticas para times de futebol.
O TacTicAI do Google sugere táticas, em especial, em jogadas de bolas paradas. Os seguidos casos de usos ampliados da economia de dados em variados setores, demonstra como é difícil mensurar seu tamanho ou extensão que são cada vez mais utilizados em extensa e enorme cadeia. Jogadores se transformarão em extensões das máquinas? Não. Até porque todos nós já somos ciborgues (ou cyborg – organismo que mistura partes orgânicos e cibernéticas ou digitais) quando não nos desgrudamos (olhos, mentes e dedos) de nossos celulares.
Não deve demorar, para que os
clubes de maiores investimentos, passem a destinar mais dinheiro para aquisição
de softwares e aplicativos desses dados, do que, exatamente, em bons jogadores.
O humano continuará a ser e sempre a base dos dados capturados para serem
depois algoritmizados. O humano prevalece e por isso esse jogo (futebol) vem atraindo
tanto dinheiro.
Assim, os recursos disponíveis
para clubes de grandes fundos investidores ficarão ainda mais fortes, embora o
imponderável possa ainda prevalecer. Nos outros esportes coletivos como
basquete e vôlei, as chances de um clube pequeno (hoje chamado de menor
investimento) ganhar de uma equipe poderosa e com muito recursos é quase nula.
No futebol, ainda não.
Observe na matéria do jornalista
Rafael Garcia, em O Globo (20/03/2024, p.28) que as primeiras táticas sugeridas
pelo aplicativo TacTic do Google são para ações e jogadas mais fáceis de serem programadas,
com estratégias que podem ser treinadas para bolas paradas como faltas,
escanteios, etc. e contra times específicos já mapeados. A tendência é que os
grandes clubes de futebol, ou aqueles de maiores investimentos, fiquem ainda
mais fortes. O que também tende a ampliar a financeirização no futebol, já
grande entre SAF e FC S.A.
Porém, mais que o esporte futebol
em si, a notícia deve despertar nossa observação para o tamanho da economia
digital e para a sua atuação transversal, com fortes impactos sobre praticamente
todos os demais setores econômicos e da vida em sociedade. O que ajuda a
explicar o gigantismo das Big Techs, os maiores oligopólios da história da
humanidade.
Oito a nove (8/9) das dez
empresas de maior valor de mercado mundo são do setor de tecnologia, de onde faço
a leitura sobre a “dominação tecnológica imbricada à hegemonia financeira”,
ambos baseados na racionalidade neoliberal que redundam na interpretação sobre
a estrutura desse fenômeno, que venho denominado, com outros
pesquisadores, como o “tripé do capitalismo contemporâneo”.
PS.: Texto com colaboração de comentários a partir de postagem sobre o tema no perfil nas redes sociais (FB; Instagram e Twitter).
terça-feira, março 05, 2024
Dominação tecnológica no capitalismo contemporâneo
Atualizando dados para uma mesa de debates que envolve a dominação tecnológica no capitalismo contemporâneo, observei que a soma de valores de mercado das 10 maiores corporações de tecnologia já equivale a 4 vezes à soma das 10 maiores petroleiras no mundo.
Há menos de um ano (nove meses) essa relação entre as dez
maiores companhias de tecnologia e as dez maiores petroleiras do mundo era de três vezes.
Observa-se ainda que a maior corporação de tecnologia hoje,
a Microsoft, vale 3,089 trilhões. 50% a mais que a maior petroleira, a Saudi
Aramco que vale 2,023 trilhões. Só a Microsoft vale, ainda, 19% mais que a soma
do valor de mercado das demais nove petroleiras.
Hoje, três das maiores corporações de tecnologia (Microsoft,
Apple e Nvidia) valem, individualmente, mais que a petroleira saudita, Saudi Aramco. E oito das
dez maiores corporações em valor de mercado do mundo são do setor de
tecnologia. Tudo isso, num momento em que a Inteligência Artificial (IA) ainda dá os primeiros passos, em termos de captura e/ou geração de valor na economia em sua totalidade.
Processo que venho chamando de “dominação tecnológica”,
profundamente imbricado à “hegemonia financeira” no capitalismo contemporâneo
com liderança do oligopólio das Big Techs que lutam e disputam dia-a-dia para avançar
para monopólios que já se tornaram reais em alguns subsetores.
Vale ainda observar que se trata de dois setores
transversais com enorme capacidade de atravessar todos os outros setores da
economia e da vida em sociedade.
O setor de tecnologia digital como etapa contemporânea da
reestruturação produtiva possui características multidimensionais e transescalares.
Além disso, tem o predicado de se espalhar e penetrar muito
facilmente em rede nas diversas atividades humanas, seja como meio de produção (negócios
e logística) ou como meio de comunicação, caso das conhecidas mídias digitais onde
exerce a capacidade de influenciar nas potentes relações de poder e política,
para além da economia.
Ou seja, no plano da superestrutura, mediado pela noção de
totalidade, há ainda muito a ser analisado sobre o fenômeno contemporâneo da
digitalização de quase tudo que vem transformando o capitalismo enquanto
sistema nos diferentes espaços do mundo.
sábado, fevereiro 17, 2024
Por que os R$ 21 bilhões da movimentação de 2023 do Porto do Açu são tão pouco comentados?
Eu fiz uma postagem (aqui) no meu blog, no dia 6 de fevereiro de 2024 repercutido também no meu perfil no FB e no Instagram sobre a movimentação (exportações e importações) do Porto do Açu no ano de 2023 com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC).
Repito o valor FOB (US$) dessa movimentação em 2023: US$ 4,219 bilhões ou aproximadamente R$ 21 bilhões. Este valor, 70% maior do que a movimentação do Porto do Açu em 2023.
Na movimentação de 2023, 86% são referentes às exportações que totalizaram (US$ 3.626) e apenas 14% o valor das importações (US$ 592 milhões).
Atividades de serviços portuários no Açu, SJB em 2023. |
É interessante que uma informação desse tipo (divulgada aqui, repito, no dia 6 de fevereiro de 2024) não tenha sido repercutida, porque imagino que fosse de interesse ao nível regional e nacional.
Os dados são públicos e podem ser acessados por qualquer pessoa, jornalista ou a mídia corporativa. O fato me chama a atenção. Evidente que muitas hipóteses podem ser levantadas para essa questão. Porém, destaco uma delas. As informações corporativas e financeiras são em sua grande maioria fruto de releases produzidos pelas próprias corporações e sob a ótica dos seus interesses. E como a própria companhia, grupo ou o seu fundo controlador não divulgou, ela não saiu divulgada mais amplamente.
Então caberia outra pergunta enquanto hipótese: por que os proprietários e controladores do Porto do Açu não teriam interesse nessa divulgação específica sobre valores da movimentação portuária (já que o mesmo aconteceu em 2023 sobre a movimentação do ano de 2022), diante de tantos releases e posteriores matérias sobre tipos de movimentação portuária, exportação, contratos, empregos, obras e possibilidades de novos negócios naquele empreendimento?
Vou citar apenas uma hipótese: não interessa divulgar o volume de riqueza que passa pelo Porto do Açu e pela região deixando tão pouco em impostos e mesmo empregos, proporcionalmente, aos negócios que acabam, usando, especialmente, a região como "território de passagem" num empreendimento até aqui como um enclave com pouquíssima conexão com a região, reforçando a caracterização de um porto como base logística transescalar, mais ligada ao extrativismo.
Evidente que há outros argumentos, hipóteses e explicações. Porém, se trata de um fato. O volume em valores FOB da movimentação portuária do Porto do Açu é um assunto a ser deixado de lado.
Uma riqueza que pela região apenas circula, como característica principal de um porto de 5ª geração com conexões na escala global e até aqui muito pouco de agregação de valor em indústria (porto-indústria, Zona Industrial Portuária - ZIP ou MIDAs, Maritime Industrial Development Area) na enorme retroárea de mais de 90 Km², fruto, em boa parte, de centenas de desapropriações de pequenos produtores rurais. As exceções são a unidade de geração de energia elétrica da GNA (UTE) e a FMC-Technip com a produção de tubos flexíveis para uso nas instalações offshore das petroleiras para extração de petróleo.
O assunto demandaria mais uma série de outros comentários que esse autor e seu blog vêm fazendo e comentando desde o início das intenções do projeto de instalação do empreendimento ainda no ano de 2005 e 2006, porém para não misturar muitos os assuntos ficaremos por aqui.
terça-feira, fevereiro 06, 2024
Movimentação de cargas no Porto do Açu e receitas de ISS em SJB e Campos, RJ, em 2023 reafirmam a condição principal de “território de passagem”
Nesses últimos vinte e três anos as receitas dos serviços seguiram se ampliando. Logo adiante, o mesmo fenômeno passou para as cidades de médio porte e agora até mesmo em alguns municípios de menor porte.
Nessa transição foi sendo superada a antiga classificação da economia entre de atividades do setor primários, secundário e terciário. Os serviços se ampliaram como atividades que foram se desagregando da produção industrial e mesmo agrícola e avançando para além de saúde e educação.
Numa sociedade mais complexa e sofisticada os serviços se multiplicam. Um exemplo: no passado, não existia a ideia de logística e nem a informática como instrumento da chamada transformação digital. A intermediação de serviços de RH, contabilidade, marketing, TI, etc. para além de saúde e educação eram departamentos das companhias. Os serviços são atividades ligadas à densidade populacional e/ou negócios e mesmo das cadeias de produção.
É nesse contexto que se deve observar as variações deste tipo de receita nos últimos anos nesses dois municípios do Norte Fluminense. Campos dos Goytacazes–RJ, como município de médio porte que é polo regional há muitas décadas e São João da Barra, após separado do município de São Francisco do Itabapoana em 1995, do início da construção do Porto do Açu em 2008 e do início de suas operações e movimentação portuária que se dá a partir do 2º semestre de 2014.
Atividades de serviços portuários no Açu, SJB, só impactam ISS |
Em 2016 o ISS de Campos foi de R$ 89 milhões enquanto o ISS de SJB foi de R$ 43 milhões. Em 2020 (1º ano da pandemia) a receita de ISS em Campos foi de 81,5 milhões e o de SJB já tinha subido para R$ 86 milhões, ano é que começa a haver um distanciamento da receita de ISS entre esses dois municípios.
Em 2023 as receitas do imposto ISS nesses dois municípios foram:
São João da Barra - R$ 174 milhões;
Campos dos Goytacazes - 152 milhões.
Ou seja, em 2023, SJB arrecadou 14% a mais com o imposto de ISS do que Campos, RJ.
Nas Leis Orgânicas Anuais (LOAs) desses dois municípios, a previsão de receita para 2024 é de R$ 123,4 milhões para Campos, RJ e de R$ 184,0 milhões para SJB, RJ. A maior arrecadação de Imposto Sobre Serviços (ISS) em SJB está diretamente vinculada aos serviços e atividades portuárias nos dez terminais do complexo do Porto do Açu licenciados junto à Antaq.
Em SJB, a receita de ISS já é quase dez vezes maior do que a receita sobre propriedade, o IPTU. Já em Campos dos Goytacazes, essa relação entre ISS (maior) e IPTU é de cerca de 15% a mais. Em Campos dos Goytacazes, foi em 2020 que a receita de ISS ultrapassou a receita do imposto IPTU.
No caso município de SJB, a receita do ISS, basicamente oriunda das atividades e obras no complexo portuário. Dessa forma, não é um exagero a afirmação que venho efetuando de se tratar, basicamente, de um “território de passagem” para a riqueza mineral que é por ali exportada, em especial minério de ferro e petróleo, após transbordo em navios no terminal 1 do Porto do Açu.
Movimentação portuária nos dez terminais portuários licenciados pela Antaq no Açu em 2023
Enquanto isso, a movimentação portuária (exportações + importações) nos dez terminais portuários do Complexo do Porto do Açu, através de mais de 6 mil embarcações circulando em 2023 teve como destino e/ou origem mais de 30 diferentes países.
Em valores na moeda brasileira, essa movimentação de cargas de 2023 em SJB, significa cerca de R$ 21 bilhões. Se estimarmos, um percentual de 10% de receita para o conjunto dos serviços portuários, é possível chegar a um valor de cerca de R$ 2,1 bilhões para a holding Prumo Logística Global, dona do Porto do Açu controlada pelo fundo americano EIG Global Energy Partners
Diante desses números, pode-se dizer que o aumento da receita de ISS para o município de SJB em 2024 de R$ 184 milhões é ainda muito pequena para o município que não a fiscaliza, aceitando as autodeclarações das companhias que atuam nas movimentações de carga no Porto do Açu.
Assim, é também possível reafirmar que as atividades de logística servem mais aos objetivos do extrativismo e o uso do “território como de passagem”, do que, propriamente, à noção de desenvolvimento regional. Até aqui as únicas exceções são a geração de energia elétrica na usina termelétrica, GNA e à produção de tubos flexíveis pela FMC Technip.
Adiante, detalharemos um pouco mais sobre os dados do MDIC a respeito do volume de exportações e importações realizadas pelo Porto do Açu (PdA) em SJB no ano de 2023, seja em valores FOB US$, em toneladas e tipos de cargas.
Essa movimentação de cargas no PdA em SJB se relaciona a mais de três dezenas de países, sendo que a maior parte das exportações continua a ser para a China 42% e depois EUA e Índia. E as importações, em bem menor valor e peso, vêm especialmente da Alemanha, Reino Unido e EUA e depois são reencaminhadas aos clientes dessas cargas.
sexta-feira, fevereiro 02, 2024
IBGE: Brasil tem mais igrejas que escolas somadas. Campos, RJ índice chega a mais 52%
Vale ainda observar que dos dez municípios com mais estabelecimentos religiosos por habitantes do Brasil, oito são do ERJ, a maioria da Baixada Fluminense.
Mesmo que os estabelecimentos religiosos estejam agrupados pelas diferentes frações, é sabido que o avanço das dezenas de religiões evangélicas deve ter fator de peso, nesse indicador, divulgado hoje pelo IBGE, por conta das pequenas igrejas e cultos instalados nos bairros da periferia e junto à população mais pobre e carente de todo tipo de apoio do material, ao apoio pessoal, psicológico e espiritual.
Nessa linha, voltou a sugerir a leitura de dois livros que me impactaram e me deram uma interpretação que não tinha sobre o assunto: "A fé e o fuzil: crime e religião no Brasil do século XXI" do jornalista e pesquisador Bruno Paes Manso e o livro "Traficantes do evangelho: quem são e a quem servem os novos bandidos de Deus" da pastora e pesquisadora Viviane Costa. Breves resenhas destes dois livros podem ser vistas na postagem abaixo desse blog em 27 de dezembro de 2023:
A fé, o fuzil, os traficantes evangélicos, o crime e os bandidos de Deus no Brasil contemporâneo
As duas publicações oferecem dados empíricos e análises sobre a relação entre algumas igrejas e líderes religiosos com o crime e com a política, mas de forma nenhuma, pretenderam atribuir ao conjunto dos seus seguidores e líderes essa acusação, o que seria uma aberração, além de um desvairado e inconcebível preconceito, que só atrapalha na compreensão desse fenômeno social em nosso país.
Tenho insistido que mais que dados e indicadores, temos necessidade (não apenas os pesquisadores, mas gestores e a população em geral) de ligar as pontas entre eles, para se tentar construir interpretações mais potentes sobre a conjuntura que possam se desdobrar em melhores planejamentos e planos de ação. Esse indicador permite e sugere uma enormidade de estudos que podem ser realizados.
Complementando a nota anterior sobre o indicador que a´pontou que hoje no Brasil há mais estabelecimentos religiosos que escolas e unidades de saúde somadas. Vale conferir.
Aqui exponho os dados de dois municípios do Norte Fluminense (ERJ) Campos dos Goytacazes e São João da Barra, usando uma ferramenta automática criada pelo G1 com esses dados do IBGE que lista o nº de habitantes, residências, escolas, unidades de saúde e estabelecimentos religiosos.
Em Campos dos Goytacazes, RJ são 1.727 estabelecimentos religiosos x 643 escolas x 488 unidades de saúde =1.132. Ou seja, 52% mais estabelecimentos religiosos, e olhe que o índice de escolas em Campos, RJ é alto quando comparado à população. É o sétimo melhor índice do país, o que reforça o que já falávamos há mais de uma década. O enfrentamento das questões do ensino em Campos são as qualidades das instalações das escolas e a qualidade do ensino e em especial, o estímulo a maior capacitação docente e melhor política salarial. Porém, aqui o enfoque é na questão do número proporcionais de igrejas em relação a estes dois principais equipamentos públicos, como já comentei na nota anterior.
Esses dados e indicadores merecem uma análise mais apurada para leituras mais potentes.
quarta-feira, dezembro 27, 2023
A fé, o fuzil, os traficantes evangélicos, o crime e os bandidos de Deus no Brasil contemporâneo
Nessa virada de ano ofereço a sugestão de dois livros que merecem ser lidos, para se tentar compreender um pouco mais o fenômeno da fé e da religião evangélica - que não para crescer em todo o país - e sua relação com o crime, o tráfico e as milícias no Rio, São Paulo e em todo o Brasil.
São duas publicações editadas nesse ano de 2023. O autor do
livro “A Fé e a Religião: Crime e religião no Brasil do Século XXI” é o
jornalista Bruno Paes Manso que é quem indica e prefacia o segundo livro “Traficantes
evangélicos: Quem são e a que servem os novos bandidos de Deus” de autoria da
Viviane Costa.
Bruno Manso tem doutorado pela USP, mas se apresenta apenas como jornalista e pesquisa o assunto da violência urbana há mais de duas décadas. Ele é também o autor do livro (que ainda não li) “República das Milícias”. Já a Viviane Costa é licenciada em história, mestra em Ciências da Religião e pastora da Assembleia de Deus.
O primeiro livro, o do Manso, trata mais do fenômeno do PCC e da
expansão dos evangélicos na região metropolitana de São Paulo, mas não unicamente.
Já o segundo livro da Viviane trata mais do que autora chama de “narcoreligiosidade
carioca” que envolve ainda a periferia da região metropolitana que inclui a Baixada Fluminense. A
abrangência geográfica das duas publicações permite uma análise mais profunda,
assim como suas ligações com outras regiões do país e mesmo o interior dos
estados RJ e SP.
De cara digo, que os dois livros me impactaram profundamente
e percebi com a visão que temos desse fenômeno é superficial, preconceituoso e
quase invisível diante do todo, seja da política, da economia e/ou da vida em
sociedade no Brasil contemporâneo.
A religião evangélica está por meses ou anos para se tornar
a religião hegemônica no Brasil, embora a estimativa tenha sido feita até o ano
do 2030.
O livro “A fé e o fuzil” de 301 páginas do Manso vai além da
análise das milícias do seu livro anterior, tratando também do tráfico, mas
foca nas razões que podem explicar o crescimento da igreja evangélica pentecostal,
a partir da rede de proteção material e de solidariedade humana oferecida por
essas organizações entranhadas nas comunidades, em especial, as periféricas e de
sua a relação, quase automática, com os grupos criminosos com os quais seguem
ambiguamente convivendo e se retroalimentando.
Como bom jornalista e pesquisador, Bruno Manso ouviu muitos
assassinos, pastores e gente convertida. Muitas vezes, exatamente os mesmos
personagens, apenas em lapsos de tempo distintos. Com texto perfeito, direto,
contextualizado e que fui facilmente, o relato descortina um mar de questões e
indagações sobre a sociedade brasileira e periférica contemporânea. Penso que
se trata do relato de uma pesquisa com forte poder de contribuir com explicações
para a questão do peso dos evangélicos na ascensão da extrema-direita no
Brasil.
Manso descreve também como se dá a montagem dos “exércitos
da fé” e sua preparação para o que chama de “batalhas espirituais” da salvação
do apocalipse. A guerra do bem contra o mal aliada à teologia da prosperidade
(empreendedorismo de si próprio) que, de certa forma, ajuda na explicação (para
muitos, contraditória) sobre as razões da defesa pelos evangélicos para o uso
das armas para sua “guerra santa”.
Assim, a periferia está cada vez mergulhada nessa
alternativa, desacreditada daqueles que defendem a política, as políticas
públicas e o aperfeiçoamento do Estado que muitas dessas organizações enxergam
como problema e inimigos do seu bem-estar e da sua forma de ver o mundo.
O segundo livro “Traficantes Evangélicos: Quem são os novos bandidos de Deus” da Viviane Costa é outro relato de pesquisa que nos auxilia na compreensão sobre o fenômeno ligado às relações do narcotráfico com o pentecostalismo que compõe o que autora chama de “narcoreligiosidade carioca”. Um fenômeno que se integra à dimensão da política e da disputa pelo poder no Rio ligado ao surgimento da facção bolsonarista e da guerra urbana dos territórios pentecostalizados (a autora não separa a fração do neopetencostalismo).
Viviane em sua publicação de densas 170 páginas, expõe um pentecostalismo
fluido do “espírito santo” que protege a todos que se associam contra o mal,
seja quem for: o Estado, ou os grupos rivais na disputa pelo território que tem
levado a um “Jesus dono desse lugar” a partir da narcoreligiosidade.
É importante registrar que a autora não apenas dá crédito,
mas utiliza de uma forma inteligente, resgatando e contextualizando, em ótima síntese,
fontes anteriores que pesquisara e trataram do tema como Marcos Alvito, Cristina
Vital da Cunha, Patrícia Birman, o próprio Bruno Manso e dezenas de outros autores citados nas referências), indo
bem além, numa pesquisa empírica de quem vê e vem de dentro do fenômeno e no território
onde o mesmo se desenvolve.
Viviane Costa explica em boa parte essa guerra do bem (guerra
das divindades ou guerra santa) que envolve as disputas pelo domínio do território.
Em que pastor pode ser também chefe do tráfico (TCP), frequenta cultos e se
mistura nessa ambiguidade (para nós estranha), mas que dá direção ao seu grupo,
ao território, constitui novas lideranças, define estratégias, etc. tudo (ou
quase) sob “a orientação de Deus”.
Viviane atualiza dados sobre a colossal expansão da religião
evangélica que se sustenta numa potente rede de proteção material e espiritual
onde o Estado é ausente. Assim, falam de manuais, dão orientações de táticas de
guerra, de expansão do credo e informam sobre novas batalhas santas (“proibidões”)
quando e onde formam novos ídolos e personalidades (gospel e influenciadores),
estilos culturais, etc.
Ambos os relatos permitem ver, por boas frestas, como a religião
evangélica se torna uma chave interpretativa das dinâmicas de violências
facciosas no Rio de Janeiro para domínio do território, visto como espécie de “reconstrução
dos muros da Cidade Santa” que obedeceria a ordens divinas em territórios em
que “Jesus passa a ser o dono do lugar”, como o Complexo de Israel
(Parada de Lucas e Vigário Geral), da mesma forma que se entende a hegemonia
política da extrema-direita na periferia do Rio de Janeiro.
Fica claro com o livro, as identificações econômicas e
neoliberais comuns às teologias pentecostais que aparecem não por acaso nas
estruturas dessas organizações narcoreligiosas.
Trata-se de um fenômeno complexo, amplo, mais que ambíguo,
multifacetado e para nós (outros, quase em minoria), ainda quase que invisível.
Um fenômeno que, segundo a autora “se entrelaça em nome de Deus, por disputas
espirituais e por território, nas fronteiras de uma guerra que não tem fim no
horizonte”.
Penso que é preciso sair da superficialidade das leituras
preconceituosas e da ideia apenas das diferenças entre pentecostais e neopentecostais
como base da extrema-direita nas periferias de nossas metrópoles. Há que se
oferecer alternativas e isso não é simples, porque se enfrenta uma enorme base
instalada de organizações que fazem a mistura do divino com o material e a
junção da concepção de mundo que junta o neoliberalismo e a divindade.
Vale muito a leitura de ambos os livros. Peço desculpas pela
extensa e humilde resenha, mas ela tem a finalidade de não apenas sugerir, mas
insistir que vale a pena a leitura de ambos os livros.
Mesmo que as perspectivas nas fronteiras dessa guerra (dissimulada)
pareça não ter fim, haveremos de prosseguir tentando entendê-la como parte de
uma disputa de classes e interesses no ambiente do capitalismo hegemonicamente financeiro
e neoliberal.
Não haverá saídas sem a participação direta da população
periférica e marginalizada que foi capturada pela esperança vendida com
enorme rede de proteção que ofereceu solidariedade e novos horizontes. São
essas crenças e ações que seguem em disputa.
domingo, novembro 19, 2023
BlackRock: estratégias e ampliação da participação em negócios financeiros e corporações no Brasil
O fundo financeiro americano BlackRock é a maior gestora de fundos do mundo, controlando um patrimônio líquido que não para de aumentar e chega, hoje, a cerca de US$ 10 trilhões ou R$ 50 trilhões no mundo. No Brasil, a BlackRock atua tanto na capitalização para seus fundos, quanto nos investimentos em valorização de ativos da economia real.
Esse valor de patrimônio sob gestão do BlackRock no mundo de US$ 10 trilhões é equivalente a 6X o PIB de todo o Brasil, embora essa comparação seja para ter ideia dos volumes de capital, mas um se trata do valor de patrimônio em valor de mercado - incluindo capital fictício - e outro estoque de riqueza real do país. No Brasil, não se tem o número exato do volume de patrimônio e participações da BlackRock entre investimentos em inovações financeiras (ações, outros fundos, etc.) e nas participações de corporações da economia real.
Porém, é vasta e impressiona a quantidade os investimentos e participações do fundo financeiro BlackRock em grandes corporações no Brasil. Em geral, são participações que oscilam entre 1% e 10%. Ex: Petrobras, Eletrobras, Bradesco, Light, Equatoral Energia, Embraer, JBS, Suzano Celulose, BRF, Marfrig, Minerva, Klabin, Fibria, Vale, Itaú, Bradesco, BTG, PRio, 3R Petroleum, Gerdau, Usiminas, Energisa, Cemig, Copasa, Via Varejo (Casas Bahia), Renner, Ambev, WEG, Grupo Soma (Hering, Animale e Farm), Arezo, Drogasil, Localiza, Assaí, Iguatemi, Cyrela, Qualicorp, etc. Vale observar que essas participações são muito dinâmicas e se alteram muito rapidamente no tempo conforme busca de maior rentabilidade.É essencial entender e debater esse fenômeno sobre as cadeias de valor global, a atuação transversal e transfronteiriça dos fundos, sobre a geoeconomia, a geopolítica, a disputa pelo poder político nos países e a formulação das estratégias dos projetos nacionais de desenvolvimento.
segunda-feira, novembro 06, 2023
O Brasil precisa de mais - e eficiente - Estado social
Só para se ter uma ideia na escala local. Em Campos dos Goytacazes, município de médio porte com 474 mil habitantes, o INSS pagou no ano passado (2022) cerca de R$ 1 bilhão a 87 mil beneficiários. Ou seja, 18,5% da população recebe algum benefício, seja aposentadoria (a maioria), pensão e auxílio de diversas naturezas. Valor equivalente a mais de 1/3 do orçamento previsto para o município em 2023.
Uma potente rede de proteção social que alimenta o circuito da economia local e que acaba por garantir emprego e renda em setores como comércio e os serviços, hoje, o maior empregador no município de Campos dos Goytacazes. Esse dinheiro pago pelo INSS é fonte de emprego, geração de renda, salário e proteção social.
Essa conversa de menos Estado é um engodo.
segunda-feira, outubro 23, 2023
Nº de matrículas no ensino superior presencial se estabiliza em cerca de 17 mil, em 2022 em Campos, RJ. Somado à EaD chega a 27 mil graduandos.
[3] Postagem do blog em 22 de setembro de 2019. Nº de matrículas no ensino superior presencial se estabiliza em Campos nos últimos 4 anos: percentual aumenta nas públicas. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2019/09/n-de-matriculas-no-ensino-superior.html
[4] Postagem do blog em 23 de setembro de 2018. Apesar da crise, as matrículas no ensino superior em Campos se estabilizam em 20 mil graduandos. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2018/09/apesar-da-crise-as-matriculas-no-ensino.html
[5] Postagem do blog em 11 de novembro de 2017. Censo do Ensino Superior 2016: Campos com 19,8 mil universitários. E a qualidade? Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2017/11/censo-do-ensino-superior-2016-campos.html
[6] Postagem do blog em 8 de dezembro de 2017. Entre 2003 e 2016, as matrículas no ensino superior no ERJ cresceram 36%. Nas instituições públicas cresceram (82%). Mais de três vezes que (25%) o crescimento nas instituições privadas. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2017/12/entre-2003-e-2016-as-matriculas-no.html
[7] Postagem do blog sobre o Censo no anos anteriores. Em 23 nov. 2016.
Campos aumenta nº estudantes no Ensino Superior para 19,3 mil matrículas. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2016/11/campos-aumenta-n-estudantes-no-ensino.html
[8] Postagem do blog em 1 de mar. 2016. Campos possui 18 mil alunos no Ensino Superior. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2016/03/campos-possui-18-mil-alunos-no-ensino.html
[9] Postagem do blog em 18 de ago. de 2015. Ensino superior em Campos perde 4 mil matrículas em 5 anos. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2015/08/ensino-superior-em-campos-perde-4-mil.html?m=1
[10] Postagem do blog em 31 jul 2015. Campos tem 17,1 mil alunos matriculados no Ensino Superior. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2015/07/campos-tem-171-mil-alunos-matriculados.html
quinta-feira, outubro 19, 2023
Ensino à distância (EaD) em Campos dos Goytacazes cresceu mais que o dobro do Brasil
Já as matrículas no ensino superior presencial no município de Campos dos Goytacazes tem se mantido relativamente estável na última década, em torno de 17 mil estudantes, embora com variação do n.º de universitários por instituição. Porém, esses dados publicaremos adiante no blog, como fazemos há muito tempo. Não há o que comemorar, mas muito a ser analisado e em várias dimensões.
Essas informações foram estratificadas dos microdados do Censo do Ensino Superior Inep/Mec e foi divulgado há poucos dias. A tabulação é do professor do IFF, Jose Carlos Salomão, que realiza esse levantamento há quase duas décadas.
quinta-feira, setembro 07, 2023
Kopenhagen & Nestlé: um negócio entre fundos financeiros
Entre processos de capitalização e valorização, essencialmente a gestora de fundos serviu de intermediadora.
Na ocasião informou que teria comprado a Kopenhagen para abrir capital em IPO, mas era jogo de cena, para entregar o mercado à gigante Nestlé.
Como destinatário final dos negócios, a Nestlé objetivou manter o controle sobre mercado de chocolates no Brasil, numa estratégia que se segue à compra de outra fabricante brasileira tradicional, a Garoto.
Antes de terminar uma parte dos bastidores que não aparece na mídia financeira e corporativa, vale dizer que a Nestlé, há algum tempo deixou de ser apenas aquela grande corporação suíça e hoje é um ativo controlado por grandes fundos, entre eles o também americano, Vanguard Group.
As indústrias são de chocolate (alimento) na economia real, mas os negócios são de natureza financeira e oligopólica. Por isso, nossa referência, aos negócios quase simultâneos que misturam capitalização, valorização e oligopolização que são atualmente sustentados pela hipermobilidade dos fundos financeiros globais.
sexta-feira, agosto 25, 2023
Empresas do Porto do Açu querem reduzir ainda mais a alíquota de ISS paga à PMSJB
Há cerca de dez dias, eu escrevi um texto (aqui no meu blog e no FB), que é uma síntese de uma análise mais ampla e aprofundada, sustentando com alguns dados e argumentos, que o Porto do Açu, quinze anos depois do início de sua construção e quase dez do início de sua operação, se estabelece muito mais como um negócio de base - em especial - extrativista, de enclave e como um território de passagem do que como um projeto de desenvolvimento.
Não vou repetir o texto e nem os argumentos. Quem desejar volte ao mesmo. Porém, o mesmo suscitou algumas conversas, debates e informações, mas a maioria fora do ambiente da internet.Algumas pessoas (nem muito e nem poucas) me procuraram para concordar no todo, ou em parte, ou com o desejo de aprofundar o diálogo sobre o tema e tudo que o mesmo acabava por provocar, na medida em que o assunto tende quase sempre a suscitar mais discursos vagos e difusos sobre progresso, do que análises, pelo menos, um pouco mais profundas.
Terminal Onshore T2 do Porto do Açu. Fonte: Petróleo Hoje. |
Uma das informações que me chegaram é que representantes de empresas instaladas no Porto do Açu, estão "sugerindo" à Prefeitura de São João da Barra, reduzir ainda mais a alíquota do Imposto sobre Serviços (ISSQN) de 2,5% para 2% que pagam ao município.
A informação/intenção não pública, mas confirmada por outra fonte, corrobora boa parte dos argumentos apresentados no texto anterior, e merece alguns outros comentários.
A infraestrutura de circulação do projeto portuário, visa atender o fluxo de minerais extraídos do que a projetos de desenvolvimento locais e/ou regionais. Como já disse antes, o Porto quer fluidez de suas cargas, custos reduzidos na movimentação de cargas, maior produtividade e pouco, ou nenhum enlace, ou integração com a região.
O ISS é - e tem sido - uma das poucas rendas que fica no município, entre todos os fluxos que pelo Porto do Açu passam e que, no ano passado, superou o valor de R$ 12 bilhões e deve chegar esse a próximo de R$ 20 bilhões.
Vale lembrar que a PMSJB, no final do ano de 2004, já sabendo dos negócios que apontavam para a implantação de um porto no Açu, apresentou à Câmara de Vereadores, o projeto de lei do ISS com mudança da alíquota do tipo de serviços portuários reduzindo-o de 5% para 2,5%. Sim, metade como "incentivo fiscal municipal".
Desde 2004 até hoje, a lei revista anualmente, vem mantendo essa alíquota de 2,5%, mesmo que em outros municípios também com bases portuárias, essa alíquota esteja sendo corrigida para valores até 5%.
Evidente que com as construções do Porto do Açu a receita municipal de ISS em SJB foi se ampliando: R$37 milhões em 2012; R$ 63 milhões em 2014, ano do início das operações do porto com exportações de minério de ferro; R$ 81 milhões em 2019 e R$ 119 milhões em 2022.
É uma boa receita para o município, ainda mais que é própria, embora ainda inferior às receitas petrorrentistas municipais com os royalties do petróleo que, em 2022, chegou a R$ 174 milhões.
Porém, é absurda a sugestão dos vários negócios instalados junto do Porto do Açu, desejarem outro incentivo fiscal dessa ordem de 0,5%.
Em termos percentuais é uma redução que parece mínima, mas em valores absolutos e referentes ao ano de 2022 equivaleriam a uma perda de receita de R$ 24 milhões, em apenas um ano.
Imagina se a alíquota tivesse sido mantida em 5%. Em 2022, o município de SJB teria tido uma receita de ISS de cerca de R$ 240 milhões.
O porto não é uma dádiva para o município ou região. É um negócio que se utiliza e produz o território segundo seus interesses, e nesse caso com quase nenhum enlace e com desejo de fluidez na movimentação das cargas e pouca interação ou enlaces com a comunidade que oferece a base territorial, onde foi instalada uma enorme infraestrutura logística-portuária para corredores de exportação e num grau menor de importação.
Para fechar, a reflexão que complementa o artigo anterior, é interessante ainda perceber que desde 2013, quando os donos dos Porto do Açu mudou de mãos, saindo da LLX, subsidiária do grupo EBX do Eike Batista, para controle do fundo americano EIG Global Energy Partners (76%) e fundo soberano Mubadala de Abu Dhabi nos Emirados Árabe Unido (EAU) com 24%, os questionamentos sobre os negócios e interesses avantajados do novo controlador se reduziram.
Creio que não exista outro argumento que não seja, o quase total desconhecimento sobre as práticas (processos, modus operandi e estratégias) utilizadas pelas gestoras dos fundos financeiros em seus negócios na gestão do que chamam de ativos, para diferentes setores e lugares no mundo.
segunda-feira, agosto 14, 2023
Porto do Açu mais enclave e território de passagem do que desenvolvimento teve R$ 12 bi de movimentação em 2022
Vista de parte das instalações do Porto do Açu, a partir da estrada de acesso à portaria principal em 12/08/2023. |
A riqueza extraída passa por esses dez terminais portuários com pouca ou nenhuma conexão (rugosidade) com a região. Passa minério de ferro pelo mineroduto, petróleo em transbordo entre navios, cobre vindo de grandes caminhões de Goiás, bauxita de Minas Gerais para serem exportados. Fertilizantes são importados e direcionados ao agronegócio, assim como subprodutos siderúrgicos atendem fornos no vizinho território mineiro.
As usinas termelétricas representam uma atividade que gera emprego, mas de forma mais efetiva, apenas na construção. Já na operação, a empregabilidade é pequena com a UTE só funcionando quando há redução do nível de água nos reservatórios das hidrelétricas do sistema nacional. O número de empregos na operação das UTEs fica entre 80 e 100 funcionários apenas.
O restante das atividades são exportações extraídas no litoral com apoio à exploração offshore ou no interior no Quadrilátero Ferrífero mineiro, e que, chega ao Açu através do mineroduto, circulando pelos territórios de passagem ou cobre vindo de Goiás.
Sim, a condição de território de circulação gera um imposto local de serviço de movimentação de cargas (ISS) que até hoje é pouco fiscalizado e pago de forma autodeclaratória pelo operador portuário.
Exportações e importações em 2022 no Porto do Açu somam R$ 12 bilhões.
Para se ter uma ideia do volume de riquezas que tem passado pelos dez terminais portuários do Açu e que se destinam às exportações, vamos olhar os números de exportações e importações do ano passado, 2022, e nos primeiros sete meses (até 31/07) do ano de 2023.
Em 2022 o Porto do Açu movimentou US$ 2,480 bilhões (R$ 12,1 bilhões), sendo US$ 1,965 bilhão (R$ 9,6 bilhões) em exportações e US$ 515 milhões (R$ 2,5 bilhões) em importações de cargas.
As exportações são especialmente fruto do extrativismo do petróleo e minério de ferro. Em 2022, o destino das exportações, em valores FOB e em dólares, foram em especial para: 1) Índia US$ 669 milhões; 2) EUA US$ 567 milhões; 3) Espanha US$ 283 milhões; 4) China US$ 281 milhões e 5) Uruguai R$ 65 milhões.
Na apresentação e debates da mesa-redonda, realizada em setembro de 2002 e no texto para o livro, eu comento sobre o longo percurso do NF, entre continuidades e descontinuidades, desde agroindústria canavieira, o extrativismo, enclaves, a logística portuária visto como Grande Projeto de Investimento (GPI), as gestoras de fundos de investimentos e a hegemonia financeira no capitalismo contemporâneo no qual a região se insere de forma subordinada como uma espécie de rota da internacionalização.
Nesse processo e diante das estratégias de um capitalismo sob a hegemonia financeira e com a lógica da gestão de ativos, o Estado (em seus diferentes níveis) tem atuado mais como despachante de luxo do capital. Ao contrário do que se diz, não se trata de um Estado mínimo e sim um Estado potente, só que para fortalecer o mercado, e não um Estado-social que pudesse levar ao desenvolvimento da economia real em suas condições materiais, mas para atender à maioria da população do NF e do ERJ.
quinta-feira, agosto 10, 2023
19 anos de blog!
Quando iniciei em 2004 nem de longe imaginava que as plataformas digitais caminhassem para onde hoje estão e o que representam em termos de extrativismo e colonialismo de dados e máquina do ódio. O que demonstra como erramos em muitas de nossas estimativas de cenário. Assim, já observando o que estava vindo e o tempo retirado de outros afazeres, eu fugi das sugestões de montar canal no YouTube e mantive apenas no texto estendido aos perfis das redes sociais.
A contagem do número de postagens e visitas que são feitas ao blog, foram se alterando com o tempo e com os robôs de acesso. Assim, eu não sei se são confiáveis, porém me espanta que mesmo com muito menos atualizações, as visitas diárias ainda oscilem na média entre 2 mil e 2,5 mil. Nos 19 anos, o Google me informa que foram 9,5 milhões de visitantes em 19.304 postagens, incluindo essa.
Interessante ainda observar, vez por outra, que várias postagens antigas ainda geram interesse e acessos, certamente, após serem localizadas em buscas, mesmo que estes mecanismos e sua programação algorítmica, tenham se alterado tanto ao longo desse tempo e tornando algumas postagens mais difíceis de serem localizadas no Google que é a Big Tech (sic) que guarda (e extrai, sic) esse arquivo de 19 mil postagens e 46,3 mil comentários.
Lembro que um dos motivos de ainda manter o blog, é que o mesmo me serviria de arquivo de informações levantadas e de leituras conjunturais, aos quais recorro com alguma frequência. Pelos números de visitas a postagens antigas, vejo que esse arquivo deve estar também servindo ainda a um amplo público expressivo e que só o Google pode saber quem são (sic, e seguem as contradições, sic).
Por tudo isso é evidente que o blog já passou e muito do que seria um tempo de vida útil razoável, estando assim muito perto do fim, mas enquanto ainda pensamos criticamente e tendo alguma disposição para escrever, seguimos no caminho, lembrando do grande poeta espanhol que afirmou que o caminho se faz ao caminhar...
Agradeço por esse trabalho aos amigos colaboradores, incentivadores e críticos do blog, que se estenderam também aos nossos perfis do FB, Instagram e Twitter. Eles também fazem o caminho. Os seus e o nosso. Valeu e sigamos em frente!