Refiro-me ao projeto de mini-refinaria anunciado há poucos dias pelo Oil Group e sua subsidiária no Brasil para instalação numa área do Porto do Açu, controlado pela Prumo Logística Global, holding do fundo financeiro americano EIG Energy Partners.
Mini-refinaria é uma unidade de beneficiamento de petróleo
de pequeno porte, ou menor capacidade de processamento que ocupa menor área
para suas instalações que são projetadas com alto grau de automação e baixa
complexidade exigindo menor número de operadores.
Neste projeto do Açu, seria
uma unidade industrial que exigiria apenas 80 operadores, numa unidade modular
que está sendo projetada para uma capacidade de processar 20 mil com possibilidades
de ser expandida para 50 mil barris por dia, para a produção de diesel e
gasolina. A empresa Oil Group que desenvolve este projeto com investimentos iniciais previstos em US$ 300 milhões, espera captar dinheiro também para outras cinco unidades, a serem montadas ao longo
de uma década até 2030.
Neste contexto, a pergunta que naturalmente surge é? Trata-se de mais um anúncio
real, um power-point, ou há possibilidades do projeto seguir em frente? Para
responder a essa pergunta é necessário fazer um conjunto de considerações.
No mundo dos fundos financeiros espalham-se projetos
vinculados à produção material. O objetivo é atrair capital para suas frações
com promessas de maiores rentabilidades que significam, em última instância,
maior captura de mais valia e maior espoliação. Assim, na atualidade os
projetos concorrem entre si na fração e entre frações no que chamamos de uma disputa
intercapitalista.
Para melhor compreender esses projetos (fenômenos) foi fundamental interpretar as estratégias políticas, econômicas e espaciais sobre os movimentos no capitalismo contemporâneo na sua estrutura, as articulações políticas e entre as suas frações (setores econômicos) e os espaços (as
regiões).
A partir desse olhar para a superestrutura tem sido possível
observar com maior apuro e detalhes, os fatos divulgados, assim como agentes
envolvidos nos vários projetos. Eles guardam muita relação e similaridade entre si. Desta forma se pode analisar melhor cada um dos projetos. Neste caso específico da mini-refinaria, mesmo que diante ainda de informações e dados ainda iniciais, algumas questões e hipóteses já são possíveis de serem observadas, tentando separar o que seriam intenções e marketing e o que pode vir a ser real.
Seis considerações
sobre o projeto da mini-refinaria no atual contexto do circuito econômico do petróleo
Desta forma, observemos os projetos das mini-refinarias da empresa Oil
Group. Para isso, eu listarei seis considerações iniciais mais relevantes, para
se compreender o contexto destes projetos vinculados ao circuito econômico do
petróleo.
Em boa parte, eles são projetos que dependem da captação de financiamento
para a sua viabilização, conforme promessas de lucros e rendimentos. Depois
farei alguns comentários sobre o empreendedor idealizador deste projeto, a empresa Oil Group:
1) Há atualmente boa liquidez de capital no mundo. Sobra dinheiro em fundos
financeiros que vão se movimentando saindo das frações que entraram em colapso
com as crises sucessivas e cumulativas (como camadas da cebola) e também oferta
de ativos desvalorizados e novos projetos que, a partir de agora, serão olhados
com o viés pós-pandemia, já de olho numa nova rodada do neoliberalismo.
2) Os projetos de refinarias de pequeno porte já funcionam
(e bem) no mundo para atender economias regionais e são muito rentáveis quando
próximo do insumo (petróleo). Com a lógica neoliberal, o funcionamento desse
esquema no Brasil dependia do desmanche feito pela atual diretoria da Petrobras
e ANP na parte de distribuição (já feita) e de refino (em curso). Ou seja, a
desintegração da empresa nacional. Feito isso, esse projeto, com essas
características, tendem a produzir mais lucros na proporção da escala e dos
riscos.
3) É mais interessante fazer seis mini-refinarias (com
capacidade de 20 mil barris por dia (bpd), que já nem seria mini) do que
comprar ou montar uma de porte maior, como as que estão sendo vendidas pela
Petrobras. As refinarias de menor porte possuem custos fixos baixos. A operação
80/100 empregos, apenas. Os ganhos com economia de logística para receber
insumos e distribuir os derivados é colossal, em relação ao enorme aparato de
distribuição por áreas maiores. Além da refinaria ser sempre mais barata
próxima ao posto do que ao poço. Quando se junta as duas coisas é um colosso em
termos de rentabilidade.
Desenho esquemático de uma mini-refinaria |
4) Os empreendedores destas mini-refinarias vendem ainda a
ideia de que possuem um Capex baixo (pequena demanda de investimentos em
equipamento e instalações para seu funcionamento). Partes das instalações industriais já chegam fabricadas. São pré-montadas e se estruturam por módulos que exigem menor tempo de implantação que as
grandes refinarias que chegam a levar 6 anos para serem montadas. Tende a ter um
menor impacto ambiental e mobilizar menos áreas. Baixos custos de operação e
manutenção. Com uma capacidade de processamento de 20 mil bpd é possível
estimar uma movimentação anual de cerca de 1,5 milhão de toneladas de petróleo
por ano, exigindo uma área de cerca de 250 mil a 300 mil m² (ou 30 hectares)
que seria equivalente a menos de 0,5%, de toda a área disponível no DISJB,
junto ao Porto do Açu.
5) Esses projetos vem sendo desenhados para o Brasil desde o
final da 1ª década, lá por volta de 2010, no auge do boom do ciclo petro-econômmico.
O Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras, tinha um projeto similar que
pensava em iniciar com parte do dinheiro que havia desviado da empresa e em
sociedade com aqueles em que atuava em conluio. Outros grupos estão
desenvolvendo projetos similares de mini-refinarias no país de olho em
transformações decorrentes de uma nova lógica de distribuição de combustíveis no
Brasil, o sexto maior consumidor do mundo.
6) Depois da crise de 2015/2016, dos baixos preços, a
discussão desses projetos voltaram ao cenário nacional. No Nordeste, a empresa
Noxis Energy tem projeto de uma mini-refinaria, já licenciado no litoral de
Sergipe, onde o estado liberou área para a sua implantação. É um projeto de uma
pequena refinaria com capacidade para processar entre 25 mil e 35 mil barris
por dia de petróleo. O mesmo grupo tem ainda projeto para outras mini-refinarias
no Espírito Santo e Amapá. A Oil Group, além do projeto do Açu e no litoral
capixaba tem projetos no Nordeste e Centro-Oeste, onde há demanda e se importa
combustíveis. A ideia é sempre de fornecer
e atender um mercado regional. A questão
é que se trata também de um projeto que depois de montado e licenciado é que se
vai atrás da captação dinheiro, quase sempre junto aos fundos financeiros e/ou
em articulação com os bancos. Os fundos possuem analistas financeiros que
investigam os vários projetos para escolher os mais rentáveis e de menor risco,
o que inclui as várias garantias oferecidas, entre as quais estão as vantagens
comparativas e isenções de impostos, áreas obtidas e as chamadas condições gerais
de produção que vão deste estradas, acesso à energia elétrica e telecomunicações,
até à formação de mão de obra e outras, obtidas a partir das articulações com o
poder político que em troca ganha o discurso do emprego e do “progresso”.
Sobre a empresa Oil Group
que apresenta a ideia (projeto ainda está em execução) no Açu
A Oil Group é uma empresa de pequeno porte criada em 2013, mas que começou a
atuar de fato, só em 2014, com profissionais que conhecem o setor de petróleo
onde pretendem atuar, em especial nos segmentos de up-stream (exploração e
produção) e down-stream (beneficiamento) e serviços.
A ideia geral e o
planejamento inicial da Oil Group foi a de atuar em diferentes segmentos da cadeia de valor de petróleo e gás. Hoje a
Oil Group possui cerca de 20/30 funcionários que atuam num escritório no Rio e
outro no Texas, EUA. Tem pretensões de atuar no mercado da América do Sul e Caribe,
incluindo além do Brasil, na Colômbia, Equador, Peru e Uruguai.
No
Brasil, antes deste projetos de pequenas refinarias, a Oil Group, através da SeaSeep, passou a atuar no setor de E&P no Brasil ao adquirir três blocos terrestres
na bacia do Recôncavo Baiano (em áreas adjacente aos ativos já existentes), ocasião em que passou
a ser credenciada pela ANP para as ofertas permanentes de exploração de petróleo
em terra da agência.
O protocolo de
intenções entre a Prumo Logísitca e Oil Group para atuar no Porto do Açu
Como se pode depreender do que foi até aqui exposto, há um tendência de
projeto de mini-refinarias ganharem potencial com o desmonte gradual do parque
de refino da Petrobras e com a privatização já realizada da BR-Distribuidora.
O momento de crise e redução de demanda gerada pela crise econômica e
pela pandemia tende a ser ultrapassada num horizonte redução até 2024 prazo
projetado em que o projeto poderia ser concluído no Porto do Açu.
A Oil Group diz já ter contrato com a empresa Biodinâmica para elaborar
o EIA-Rima e cuidar do licenciamento ambiental junto ao Estado (SEA/Ceca) e a
duas construtoras que poderiam atuar na construção e montagem, a Intech Entrepose
e Tridimensional Engenharia. Porém, para isso se realizar será necessário ainda
o capital. O financiamento.
Eu tenho insistido nas razões dos motivos porque tantos
projetos aparecem e somem sem se viabilizarem. Para compreendê-los é preciso
entender essa lógica do capital vinculado aos fundo financeiros que controlam
os ativos (projetos) e corporações.
Muitas vezes, os donos destes dinheiros
estimulam até projetos concorrenciais sabendo que apenas um deles se
viabilizará, mas a disputa entre os mesmos, para acesso ao capital, criam as
condições para que seus idealizadores possam negociar com o poder político
(estado) buscando mais vantagens que garanta em última instância, maior
rentabilidade e lucros aos acionistas.
O projeto da mini- refinaria ainda está sendo concluído e
terá que passar por licenciamento ambiental, embora o Oil Group já tenha anunciado
acordo com o Porto do Açu e além da empresa para o licenciamento e as
construtoras, anunciou também que o fornecimento de insumo (óleo) para a
mini-refinaria viria da Shell Trading. A previsão é de que as obras comecem no
último trimestre do ano que vem (2021) e a operação se inicie entre 2023/2024 e prevê que
durante as obras pode ter entre 500 e 1000 trabalhadores atuando na construção
civil e nas montagens industriais.
A lógica financeira dos
fundos determinam a chegada de novos empreendimentos é a mesma que constituiu o
próprio Porto do Açu
Enfim, este artigo tem a função de contribuir para que se
tenha uma visão melhor, mais analítica e crítica sobre as matérias e marketings
que acompanham as notícias sobre os projetos anunciados para a região. Para
isso é preciso, sempre reunir e alinhavar algumas informações soltas e
dispersas.
Ou seja, investigar melhor este circuito econômico com características
globais que é o setor de petróleo e sua relação com os complexos
portuários-industriais como o do Porto do Açu.
Esse tipo de método de análise que os meus amigos
pesquisadores chamarão de uma investigação no campo espaço-economia, busca identificar
a forma como o capital se movimenta em busca de sua reprodução ampliada no
território, sob a forma que os economistas chamam de capital-fixo, no caso
através de uma mini-refinaria.
Esse tipo de análise facilita a interpretação sobre as estratégias entre “fixos e fluxos” utilizadas pelos donos dos dinheiros no capitalismo contemporâneo, permitindo assim, tornar mais compreensível a análise sobre tudo aquilo que se anuncia nos dias atuais, em termos de novos empreendimentos na região.
Esse tipo de análise facilita a interpretação sobre as estratégias entre “fixos e fluxos” utilizadas pelos donos dos dinheiros no capitalismo contemporâneo, permitindo assim, tornar mais compreensível a análise sobre tudo aquilo que se anuncia nos dias atuais, em termos de novos empreendimentos na região.
Como já foi descrito no artigo publicado abaixo sobre a sua
gênese e o processo-histórico do Porto do Açu (veja aqui), o mesmo de trata de
um enclave econômico com pouca relação com a região, mesmo se apropriando de
enorme área do litoral do Norte Fluminense. [1]
O projeto da mini-refinaria da Oil Group, mesmo
que se viabilize, a grosso modo, ele irá na mesma linha do caso da usina
termelétrica da GNA, com poucos empregos na fase de operação, embora, com uma
maior oferta de postos de trabalho na fase de construção e montagem.
Assim, o capital produz o território e a região para os seus
interesses. Assim, quando necessário se articulam com o poder político (Estado
nas suas três esferas) para obter as licenças, os subsídios e isenções tributárias
que garantirão melhores margens de lucros.
Os empreendimentos e as corporações fechadas e isoladas em
suas cercas e portarias, exercem o controle sobre as instalações que produzem
os lucros e os rendimentos que alimentarão os donos dos dinheiros que são os
gestores dos fundos financeiros.
Essa mesma lógica foi a que originou o complexo
logístico-portuário do Açu e segue propiciando o seu paulatino adensamento, sem
que mudanças significativas tenham sido promovidas a favor da população que
habita a região do seu entorno.
Referência:
[1] Postagem no blog em 13 de junho de 2020. Revendo alguns detalhes da gênese e do processo histórico-político da implantação do Porto do Açu. Disponível em: https://www.robertomoraes.com.br/2020/06/revendo-alguns-detalhes-da-genese-e-do.html
Referência:
[1] Postagem no blog em 13 de junho de 2020. Revendo alguns detalhes da gênese e do processo histórico-político da implantação do Porto do Açu. Disponível em: https://www.robertomoraes.com.br/2020/06/revendo-alguns-detalhes-da-genese-e-do.html
Um comentário:
Obrigado por compartilhar sua análise sobre o empreendimento.
Ao ler uma matéria sobre o projeto da refinaria no Açu, fiquei pensando sobre a viabilidade do empreendimento. Infelizmente, nos sites de notícias, fatos como esse são relatados com euforia sem reflexões e contrapontos.
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