O objetivo é chamar a atenção para a questão que tem várias dimensões, mas também para ampliar a interlocução sobre o assunto, com parceiro(a)s quem também observam esse fenômeno com diferentes dimensões de análise.
A plataformização ou o capitalismo de plataformas, para efeito de descrição e também do desenvolvimento analítico, pode ser observado em diversas dimensões.
Uma delas é a observação do fenômeno em sua superestrutura e sua relação com as seguidas e cumulativas reestruturações produtivas. Outra é a observação sobre o imbricamento desse fenômeno a que chamo de “plataformização” com a financeirização, as inovações tecnológicas (startups) e os interesses de todos os setores econômicos que envolve a produção material, os serviços e o comércio.
De forma magistral as tecnologias da informação através das redes, produziram meios extremamente potentes e eficazes de intermediação de interesses e demandas com quem as atende num mundo de intensa, progressiva (e eu diria com a pandemia explosiva) da digitalização da vida social.
O processo de plataformização dos negócios vai bem além da uberização e do uso de plataformas de intermediação como Amazon, Ifood, AirBnb, Google Store, Appe Store, Gmail, Youtube, Instagram, Facebook, Spotify, Zoom, Twitter, NetFlix, Rapi, Wazer, 99, QuintoAndar, Mercado Livre, Open banking, etc. A plataformização se trata, em síntese de uma nova forma de intermediação entre produção e serviços para atender as demandas e o consumo, no processo de acumulação ainda mais ampliada do capital.
A expansão do teletrabalho
Uma outra dimensão incrementada pelo capitalismo de plataformas que tenho abordado aqui e em outros textos (e que aqui vou apenas fazer alguns comentário iniciais) é sobre a repercussão sobre o trabalho sim. O teletrabalho com a ampliação do trabalho em casa (ou home office). Neste aspecto vale observar que esse processo de levar o trabalho para ser feito em casa, se dá para além do teletrabalho via internet.
A reestruturação produtiva com terceirizações e quarteirizações, já tinha mandado o trabalho de costureiras e outras profissões para as suas casas, transformando os seus lares em meios de produção. Um trabalho sem direitos e extremamente e cada vez mais precarizado, como mostra, brilhantemente, o filme “Estou me guardando para quando o carnaval chegar” de Marcelo Gomes.
O teletrabalho é o fenômeno iniciado ainda na última década do século passado que vive uma ampliação e diversificação exponencial. Um trabalho exercido remotamente, para atividades profissionais, que são especialmente (e não mais exclusivamente) aquelas consideradas atividades-meio, como aquelas de planejamento, vendas, contabilidade, call-center (SAC), marketing, seleção e treinamento de trabalhadores, etc.
Hoje, ainda mais que antes, as corporações estão se deliciando com essa modalidade de trabalho. Elas estão observando agora em detalhes, coo estão capturando ainda mais valor do trabalho humano.
As empresas estão calculando os extraordinários aumentos da produtividade dos trabalhadores que, distantes e inseguros, querem mostrar ainda mais resultados e assim, se mostrarem necessários no quadro de empregados da empresa, para os patrões. Aumentando também a bajulação fruto da dependência, num cenário, em que as demissões, não exigem mais o cara a cara.
As corporações ampliam os seus lucros com a redução de custos fixos (aluguel, condomínios, recepcionistas e serventes de limpeza, energia elétrica, telefonia, etc.), com a redução das estruturas hierárquicas (com revisões e enxugamento de organogramas), além de outros vários ganhos. As companhias já estão planejando novas e mais ágeis plataformas digitais (por gente da TI- os únicos novos contratados) que vão sendo organizadas e implantadas para melhorar os resultados dos seus negócios.
Ainda neste campo, vou apenas apontar uma outra questão que estou, inicialmente, chamando de uma nova etapa de “re-taylorização” do trabalho, com a volta do conceito sobre o “trabalho prescrito” e “trabalho real”.
As empresas estão avançando para repensar os seus reais processos de trabalho (seus protocolos). Qual trabalho seria realmente necessário diante desta nova realidade? O que seria supérfluo? Quais os novos procedimentos com a digitalização quase total do trabalho, em especial, de tudo que não é fabril que exigiria os equipamentos e as instalações industriais?
Os trabalhadores já percebem esse movimento e pensam em como se proteger do que está vindo pela frente. A porosidade do trabalho, o “trabalho morto” fica, quase que completamente, exposto diante desta nova realidade que surge com a digitalização dos processos de trabalho.
As consequências do avanço do Teletrabalho num cenário de recessão
Porém, vamos saltar para outra observação, sobre a nova realidade que se junta ao cenário econômico recessivo, que já se instala e vai se agravar durante e no pós pandemia.
Esse processo da plataformização vai alijando do mercado muitas pequenas empresas. Os negócios tende a fazer com que os grandes canibalizem os pequenas negócios, através de incorporações, fusões e aquisições. Tudo isso levando a uma maior concentração e oligopolização de vários setores econômicos de uma forma espantosa.
No mundo, tanto no centro do capitalismo quanto na periferia as consequências deste incremento da reestruturação produtiva é avassaladora. No caso do Brasil que já vive uma recessão há cinco anos, tudo isso significará um desemprego ainda maior. Inclusive de trabalhadores mais qualificados, que consequentemente, vem acompanhada da redução de médias salariais decorrentes da tal reforma trabalhista, quanto do aumento do exército de reserva de mão de obra, que atingem também e até as atividades superespecializadas. Além de remeter uma boa parte deste contingente de trabalhadores para a informalidade.
O resultado disso é que deveremos saltar de 12 milhões para 20 milhões, ou 25 milhões de desempregados até o final de 2021. Na economia informal não devemos nos surpreender que o número de trabalhadores saltem de 40 milhões para 50 milhões, ou 60 milhões de brasileiros.
É bom lembrar que isso é um processo que já está em curso e, aparentemente, busca um “novo normal” para mais um rodada do neoliberalismo que tende a levar um esgarçamento ainda mais grave do chamado tecido social, apenas com algumas diferenças sobre as consequências no centro ou na periferia do capitalismo contemporâneo.
Antes de fechar... um pouco de dados empíricos
Vale trazer mais alguns dados empíricos que mostram a velocidade e as áreas em que se tem o aumento da informalidade na economia do país, a partir do uso expandido da plataformização dos negócios no contexto da pandemia do Covid-19:
1) Nº de downloads de aplicativos para quem quer trabalhar como empregador de produtos (delivery) cresceu na média, em 200%, apenas nos meses de março e abril, segundo a empresa de pesquisa de dados e marketing, RankMyAPP.
2) Segundo a mesma fonte, em abril aconteceu a maior adesão dos últimos seis meses, com aplicativos de delivery instalados em mais de 22 milhões de celulares. Vale lembrar que esses downloads são para quem usa o App para o trabalho e não para o consumo. Porque, no meio do mês de março deste ano, portanto, ainda no início da pandemia, o número total de apps instalados para consumo, já representava mais de 60% do total de vezes que esses aplicativos de entrega, tinham sido baixados, durante todo o ano passado.
3) Um outro exemplo da Appficação dos serviços pode ser visto com o caso da startup colombiana de aplicativos Picap. Essa empresa entrou no Brasil há um ano, com aplicativos de transporte de passageiros por moto e hoje já possui 20 mil motociclistas cadastrados. A Colômbia já é sede de outra empresa (startup) de delivery bem conhecida que é a Rappi. Assim, vale observar que esse serviço de transporte dos conhecidos motoboys, que há muito eram feitos entre comunidades de baixa renda nas regiões metropolitanas, agora, esse trabalho de transporte tem um pedaço de sua renda capturado, por um aplicativo que atua como vampiro, aspirando renda de um trabalho local e retrata as consequências da Appficação do trabalho.
4) Um total de 2,5 quintilhões de dados são gerados todos os dias, incluindo milhões de e-mails, tuites, horas de Netflix e pesquisas no Google. Nesta dimensão é ainda importante identificar que a vigilância e captura de dados é parte do capitalismo de plataformas. O Big Data (BD) e Inteligência Artificial (IA) fazem parte da etapa de vigilância, mas são operados pelas plataformas digitais.
Enfim, é incrível e dramático perceber como a tragédia de uma pandemia que mata milhares de pessoas também reforça esse processo que amplia a vampirização da renda do trabalho, aumenta os ganhos dos donos do capital e fragmenta as relações de trabalho imposta por uma nova forma societal do trabalho. A imposição dessa sociedade digital assusta. Enquanto isso, nos distraímos nos bate-papos das redes sociais, das lives e dos streams, entre filmes e shows num mundo canibal e ainda mais desigual e injusto.
Seguimos observando o que está em curso.
PS.: Atualizado às 23:16: Para inclusão de dois parágrafos ao texto origina.
De forma magistral as tecnologias da informação através das redes, produziram meios extremamente potentes e eficazes de intermediação de interesses e demandas com quem as atende num mundo de intensa, progressiva (e eu diria com a pandemia explosiva) da digitalização da vida social.
O processo de plataformização dos negócios vai bem além da uberização e do uso de plataformas de intermediação como Amazon, Ifood, AirBnb, Google Store, Appe Store, Gmail, Youtube, Instagram, Facebook, Spotify, Zoom, Twitter, NetFlix, Rapi, Wazer, 99, QuintoAndar, Mercado Livre, Open banking, etc. A plataformização se trata, em síntese de uma nova forma de intermediação entre produção e serviços para atender as demandas e o consumo, no processo de acumulação ainda mais ampliada do capital.
A expansão do teletrabalho
Uma outra dimensão incrementada pelo capitalismo de plataformas que tenho abordado aqui e em outros textos (e que aqui vou apenas fazer alguns comentário iniciais) é sobre a repercussão sobre o trabalho sim. O teletrabalho com a ampliação do trabalho em casa (ou home office). Neste aspecto vale observar que esse processo de levar o trabalho para ser feito em casa, se dá para além do teletrabalho via internet.
A reestruturação produtiva com terceirizações e quarteirizações, já tinha mandado o trabalho de costureiras e outras profissões para as suas casas, transformando os seus lares em meios de produção. Um trabalho sem direitos e extremamente e cada vez mais precarizado, como mostra, brilhantemente, o filme “Estou me guardando para quando o carnaval chegar” de Marcelo Gomes.
O teletrabalho é o fenômeno iniciado ainda na última década do século passado que vive uma ampliação e diversificação exponencial. Um trabalho exercido remotamente, para atividades profissionais, que são especialmente (e não mais exclusivamente) aquelas consideradas atividades-meio, como aquelas de planejamento, vendas, contabilidade, call-center (SAC), marketing, seleção e treinamento de trabalhadores, etc.
Hoje, ainda mais que antes, as corporações estão se deliciando com essa modalidade de trabalho. Elas estão observando agora em detalhes, coo estão capturando ainda mais valor do trabalho humano.
As empresas estão calculando os extraordinários aumentos da produtividade dos trabalhadores que, distantes e inseguros, querem mostrar ainda mais resultados e assim, se mostrarem necessários no quadro de empregados da empresa, para os patrões. Aumentando também a bajulação fruto da dependência, num cenário, em que as demissões, não exigem mais o cara a cara.
As corporações ampliam os seus lucros com a redução de custos fixos (aluguel, condomínios, recepcionistas e serventes de limpeza, energia elétrica, telefonia, etc.), com a redução das estruturas hierárquicas (com revisões e enxugamento de organogramas), além de outros vários ganhos. As companhias já estão planejando novas e mais ágeis plataformas digitais (por gente da TI- os únicos novos contratados) que vão sendo organizadas e implantadas para melhorar os resultados dos seus negócios.
Ainda neste campo, vou apenas apontar uma outra questão que estou, inicialmente, chamando de uma nova etapa de “re-taylorização” do trabalho, com a volta do conceito sobre o “trabalho prescrito” e “trabalho real”.
As empresas estão avançando para repensar os seus reais processos de trabalho (seus protocolos). Qual trabalho seria realmente necessário diante desta nova realidade? O que seria supérfluo? Quais os novos procedimentos com a digitalização quase total do trabalho, em especial, de tudo que não é fabril que exigiria os equipamentos e as instalações industriais?
Os trabalhadores já percebem esse movimento e pensam em como se proteger do que está vindo pela frente. A porosidade do trabalho, o “trabalho morto” fica, quase que completamente, exposto diante desta nova realidade que surge com a digitalização dos processos de trabalho.
As consequências do avanço do Teletrabalho num cenário de recessão
Porém, vamos saltar para outra observação, sobre a nova realidade que se junta ao cenário econômico recessivo, que já se instala e vai se agravar durante e no pós pandemia.
Esse processo da plataformização vai alijando do mercado muitas pequenas empresas. Os negócios tende a fazer com que os grandes canibalizem os pequenas negócios, através de incorporações, fusões e aquisições. Tudo isso levando a uma maior concentração e oligopolização de vários setores econômicos de uma forma espantosa.
No mundo, tanto no centro do capitalismo quanto na periferia as consequências deste incremento da reestruturação produtiva é avassaladora. No caso do Brasil que já vive uma recessão há cinco anos, tudo isso significará um desemprego ainda maior. Inclusive de trabalhadores mais qualificados, que consequentemente, vem acompanhada da redução de médias salariais decorrentes da tal reforma trabalhista, quanto do aumento do exército de reserva de mão de obra, que atingem também e até as atividades superespecializadas. Além de remeter uma boa parte deste contingente de trabalhadores para a informalidade.
O resultado disso é que deveremos saltar de 12 milhões para 20 milhões, ou 25 milhões de desempregados até o final de 2021. Na economia informal não devemos nos surpreender que o número de trabalhadores saltem de 40 milhões para 50 milhões, ou 60 milhões de brasileiros.
É bom lembrar que isso é um processo que já está em curso e, aparentemente, busca um “novo normal” para mais um rodada do neoliberalismo que tende a levar um esgarçamento ainda mais grave do chamado tecido social, apenas com algumas diferenças sobre as consequências no centro ou na periferia do capitalismo contemporâneo.
Antes de fechar... um pouco de dados empíricos
Vale trazer mais alguns dados empíricos que mostram a velocidade e as áreas em que se tem o aumento da informalidade na economia do país, a partir do uso expandido da plataformização dos negócios no contexto da pandemia do Covid-19:
1) Nº de downloads de aplicativos para quem quer trabalhar como empregador de produtos (delivery) cresceu na média, em 200%, apenas nos meses de março e abril, segundo a empresa de pesquisa de dados e marketing, RankMyAPP.
2) Segundo a mesma fonte, em abril aconteceu a maior adesão dos últimos seis meses, com aplicativos de delivery instalados em mais de 22 milhões de celulares. Vale lembrar que esses downloads são para quem usa o App para o trabalho e não para o consumo. Porque, no meio do mês de março deste ano, portanto, ainda no início da pandemia, o número total de apps instalados para consumo, já representava mais de 60% do total de vezes que esses aplicativos de entrega, tinham sido baixados, durante todo o ano passado.
3) Um outro exemplo da Appficação dos serviços pode ser visto com o caso da startup colombiana de aplicativos Picap. Essa empresa entrou no Brasil há um ano, com aplicativos de transporte de passageiros por moto e hoje já possui 20 mil motociclistas cadastrados. A Colômbia já é sede de outra empresa (startup) de delivery bem conhecida que é a Rappi. Assim, vale observar que esse serviço de transporte dos conhecidos motoboys, que há muito eram feitos entre comunidades de baixa renda nas regiões metropolitanas, agora, esse trabalho de transporte tem um pedaço de sua renda capturado, por um aplicativo que atua como vampiro, aspirando renda de um trabalho local e retrata as consequências da Appficação do trabalho.
4) Um total de 2,5 quintilhões de dados são gerados todos os dias, incluindo milhões de e-mails, tuites, horas de Netflix e pesquisas no Google. Nesta dimensão é ainda importante identificar que a vigilância e captura de dados é parte do capitalismo de plataformas. O Big Data (BD) e Inteligência Artificial (IA) fazem parte da etapa de vigilância, mas são operados pelas plataformas digitais.
Enfim, é incrível e dramático perceber como a tragédia de uma pandemia que mata milhares de pessoas também reforça esse processo que amplia a vampirização da renda do trabalho, aumenta os ganhos dos donos do capital e fragmenta as relações de trabalho imposta por uma nova forma societal do trabalho. A imposição dessa sociedade digital assusta. Enquanto isso, nos distraímos nos bate-papos das redes sociais, das lives e dos streams, entre filmes e shows num mundo canibal e ainda mais desigual e injusto.
Seguimos observando o que está em curso.
PS.: Atualizado às 23:16: Para inclusão de dois parágrafos ao texto origina.
Nenhum comentário:
Postar um comentário