Hoje, atendendo a um amigo sobre informações a respeito do setor petróleo, porto, gestão pública e desenvolvimento regional, eu relembrei de algumas questões sobre a gênese do Porto do Açu, sobre o qual já escrevi bastante nesse blog, que está no ar há quase 16 anos.
Hoje, conversando com o amigo Wellington Abreu de SJB sobre petróleo e porto, relembrei de algumas questões sobre a gênese do Porto do Açu, sobre o qual já escrevi bastante nesse blog que está no ar há quase 16 anos.
Na conversa, eu relembrei de uma reportagem sobre a ideia de ter um porto no Açu. O jornal antigo eu recebi de uma pessoa que não sei quem foi, ela deixou na portaria do meu prédio guardado num envelope solicitando que me fosse entregue. Certamente, por alguém que acompanhava o blog e minhas publicações, mostravam o interesse no tema.
Por diferentes razões, eu não utilizei antes, nem no blog, nem artigos acadêmicos e nem no texto final de minha tese. Apenas, utilizei em apresentações e debates e mesas-redondas e seminário sobre o tema. Assim, como é muito comum ainda ser abordado por questões sobre o porto e sua relação com a região Norte Fluminense e o ERJ, eu resolvi expor essas reportagens.
Trata-se de matéria de capa e página inteira do extinto jornal A Cidade (Campos dos Goytacazes, RJ), da jornalista Joyce Trindade, em 14 de março de 1999. Abaixo as imagens da matéria. Para ver em tamanho maior clique sobre elas.
Naquela data, o terminal portuário ou o Porto Açu ainda era uma ideia vaga, embora alguns grupos já estudassem aquela área em frente ao mar e técnicos já fizessem inclusive pesquisas de batimetria naquele ponto do mar/praia.
Tudo que descrevo resumidamente abaixo, eu detalhei no meu texto de doutoramento (março de 2017) no PPFH-UERJ.
Foi só em 2000, que um estudo de viabilidade econômico-financeira foi feito pelo governo estadual. Na ocasião, o estudos faziam prospecção de que o mesmo poderia ter uma participação financeira da Petrobras e da Construtora Andrade Gutierres, além do Governo do ERJ, já na gestão Garotinho. Seria um terminal oceânico para apoio às atividades offshore. O projeto foi apresentado em setembro de 2000, no auditório da ACIC em Campos, pelo secretário Wagner Victer.
Como comentado na ocasião, o projeto não foi adiante porque a Petrobras, sobre o domínio de FHC e Philipe Reitschull estava ainda pensando na privatização da empresa e transformando a gerência da Bacia de Campos em várias Unidades de Negócio (UN).
Pois bem, entre 2003 e 2004, esse mesmo estudo de viabilidade econômico-financeiro foi alterado para servir de base à exportação de minério e ofertado à Vale do Rio Doce já privatizada. A Vale não sei interessou, por conta de um projeto que tinha em Anchieta, ES.
No final de 2004, esse mesmo projeto, no qual o governo estadual já tinha gasto quase R$ 1 milhão em consultorias e serviços foi entregue ao Eike Batista depois do assunto ter sido tratado numa reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico do ERJ.
Eike que já tinha adquirido uma mina no Quadrilátero Ferrífero de Minas Gerais, identificou a possibilidade de fazer no Açu, um projeto similar ao da Samarco, que foi instalado na década de 70, no município capixaba de Anchieta. Um mineroduto desde à mina ao litoral para exportar o minério para o sedente mercado chinês.
Veja abaixo a terceira imagem que é de uma matéria do Jornal do Commercio, do jornalista Bruno Villas Bôas, de 27 de outubro de 2005, p. B-5. (Para ver a matéria em tamanho maior clique sobre ela)
Com o desenho do projeto ganhando corpo e após o estudo de Viabilidade Técnico-Econômica, o empresário Eike Batista, decidiu realizar a compra de duas grandes fazendas, Saco Dantas e Caruara, em praticamente, única área extensa, contígua e “livre” do litoral fluminense para viabilizar os seus empreendimentos.
A partir daí o empresário fez algumas captações de dinheiro no Brasil e no exterior para começar a construção não mais apenas de um terminal portuário para exportação de minério de ferro, mas de um conjunto de outros negócios como geração de energia e adiante projetos vinculados à cadeia produtiva do petróleo, que significou a sua saída formal dos empreendimentos do entorno do Porto do Açu que passou ao fundo de investimentos americanos, EIG.
Só que antes, ao longo do processo de legalização das empresas e licenciamentos ambientais, Eike, ao ter a informação que a área da Fazenda Caruara tinha tido o seu uso proibido, para receber as termoelétricas (a carvão e à gás) e ser exigida que fosse nela implementado uma área de conservação ambiental como compensação pelos impactos (que depois passou a ser uma RPPN), o empresário saiu em busca de outras áreas para montagem de um distrito industrial (DISJB) para receber novas as empresas, seu estaleiro (OSX), etc. que iriam desde o litoral a uma área mais interior em direção a Campos.
Neste momento Eike e o governo do ERJ montaram um grave e criminoso, hoje conhecido esquema das desapropriações de terras dos pequenos agricultores, através da Codin. Desapropriações que ficaram com milhares de terrenos e terras de centenas de pequenos agricultores, com extensão total de mais de 70 km², além das outras adquiridas diretamente por Eike. Até hoje, nem 10% desse latifúndio, equivalente a quase ¼ de todo o município de SJB, é utilizado, enquanto muitos pequenos produtores, até hoje, estão sem receber, sem acesso às terras desapropriadas pelo Estado e entregue a uma empresa privada, que na ocasião era a LLX e, depois da derrocada de Eike passou a ser a Prumo Logística Global que controla o Porto do Açu e é controlada pelo fundo financeiro americano, EIG Energy Partners.
Por conta dos debates comunitários e do movimento de resistência dos agricultores desapropriados do Açu, um relatório foi elaborado e entregue à Comissão de Direitos Humanos da Alerj em 2017. Dele, consta um mapa foi elaborado pelo professor Eduardo Barcelos, na condição de membro do grupo de agrária da AGB (Associação de Geógrafos, seção Niterói-Rio).
Tudo que descrevo resumidamente abaixo, eu detalhei no meu texto de doutoramento (março de 2017) no PPFH-UERJ.
Foi só em 2000, que um estudo de viabilidade econômico-financeira foi feito pelo governo estadual. Na ocasião, o estudos faziam prospecção de que o mesmo poderia ter uma participação financeira da Petrobras e da Construtora Andrade Gutierres, além do Governo do ERJ, já na gestão Garotinho. Seria um terminal oceânico para apoio às atividades offshore. O projeto foi apresentado em setembro de 2000, no auditório da ACIC em Campos, pelo secretário Wagner Victer.
Como comentado na ocasião, o projeto não foi adiante porque a Petrobras, sobre o domínio de FHC e Philipe Reitschull estava ainda pensando na privatização da empresa e transformando a gerência da Bacia de Campos em várias Unidades de Negócio (UN).
Pois bem, entre 2003 e 2004, esse mesmo estudo de viabilidade econômico-financeiro foi alterado para servir de base à exportação de minério e ofertado à Vale do Rio Doce já privatizada. A Vale não sei interessou, por conta de um projeto que tinha em Anchieta, ES.
No final de 2004, esse mesmo projeto, no qual o governo estadual já tinha gasto quase R$ 1 milhão em consultorias e serviços foi entregue ao Eike Batista depois do assunto ter sido tratado numa reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico do ERJ.
Eike que já tinha adquirido uma mina no Quadrilátero Ferrífero de Minas Gerais, identificou a possibilidade de fazer no Açu, um projeto similar ao da Samarco, que foi instalado na década de 70, no município capixaba de Anchieta. Um mineroduto desde à mina ao litoral para exportar o minério para o sedente mercado chinês.
Veja abaixo a terceira imagem que é de uma matéria do Jornal do Commercio, do jornalista Bruno Villas Bôas, de 27 de outubro de 2005, p. B-5. (Para ver a matéria em tamanho maior clique sobre ela)
Com o desenho do projeto ganhando corpo e após o estudo de Viabilidade Técnico-Econômica, o empresário Eike Batista, decidiu realizar a compra de duas grandes fazendas, Saco Dantas e Caruara, em praticamente, única área extensa, contígua e “livre” do litoral fluminense para viabilizar os seus empreendimentos.
A partir daí o empresário fez algumas captações de dinheiro no Brasil e no exterior para começar a construção não mais apenas de um terminal portuário para exportação de minério de ferro, mas de um conjunto de outros negócios como geração de energia e adiante projetos vinculados à cadeia produtiva do petróleo, que significou a sua saída formal dos empreendimentos do entorno do Porto do Açu que passou ao fundo de investimentos americanos, EIG.
Só que antes, ao longo do processo de legalização das empresas e licenciamentos ambientais, Eike, ao ter a informação que a área da Fazenda Caruara tinha tido o seu uso proibido, para receber as termoelétricas (a carvão e à gás) e ser exigida que fosse nela implementado uma área de conservação ambiental como compensação pelos impactos (que depois passou a ser uma RPPN), o empresário saiu em busca de outras áreas para montagem de um distrito industrial (DISJB) para receber novas as empresas, seu estaleiro (OSX), etc. que iriam desde o litoral a uma área mais interior em direção a Campos.
Neste momento Eike e o governo do ERJ montaram um grave e criminoso, hoje conhecido esquema das desapropriações de terras dos pequenos agricultores, através da Codin. Desapropriações que ficaram com milhares de terrenos e terras de centenas de pequenos agricultores, com extensão total de mais de 70 km², além das outras adquiridas diretamente por Eike. Até hoje, nem 10% desse latifúndio, equivalente a quase ¼ de todo o município de SJB, é utilizado, enquanto muitos pequenos produtores, até hoje, estão sem receber, sem acesso às terras desapropriadas pelo Estado e entregue a uma empresa privada, que na ocasião era a LLX e, depois da derrocada de Eike passou a ser a Prumo Logística Global que controla o Porto do Açu e é controlada pelo fundo financeiro americano, EIG Energy Partners.
Por conta dos debates comunitários e do movimento de resistência dos agricultores desapropriados do Açu, um relatório foi elaborado e entregue à Comissão de Direitos Humanos da Alerj em 2017. Dele, consta um mapa foi elaborado pelo professor Eduardo Barcelos, na condição de membro do grupo de agrária da AGB (Associação de Geógrafos, seção Niterói-Rio).
O mapa da esquerda apresenta os projetos do DISJB que foram amplamente divulgados entre 2008-2010. E o mapa da esquerda mostra, na área que tem verde de 62 km², a localização das terras que foram desapropriadas e que hoje estão abandonadas em sem nenhuma função. Tudo isso demonstra o que era previsto em termos de empreendimentos para o DISJB e o que efetivamente existe construído e implantado no Porto do Açu.
Por conta do fim do uso rural destas e outras terras de SJB, a produção agrícola em SJB caiu de cerca de 185 mil toneladas em 2009, para 30 mil toneladas em 2015, como uma redução de 84%. A área colhida caiu de 3.755 hectares para 1001 hectares, com uma redução de 73%. (Para ver a imagem do mapa em tamanho maior clique sobre ela).
Por conta do fim do uso rural destas e outras terras de SJB, a produção agrícola em SJB caiu de cerca de 185 mil toneladas em 2009, para 30 mil toneladas em 2015, como uma redução de 84%. A área colhida caiu de 3.755 hectares para 1001 hectares, com uma redução de 73%. (Para ver a imagem do mapa em tamanho maior clique sobre ela).
Hoje, o Porto do Açu exporta minério e se transformou, parcialmente (mesmo sem o estaleiro), num porto de 5ª geração (MIDAs ou ZIP, porto-indústria) com projetos de geração de energia e empresas de apoio às atividades de exploração de petróleo offshore.
Na realidade, um enclave econômico (uma espécie de Condado Americano) com empreendimentos que, praticamente, não dialogam com o município de SJB e nem com a região, a não ser em ações pontuais. O porto quer apenas fluidez e usa o território para os seus interesses.
O restante já foi muito comentado por aqui. Assim, essas matérias ajudam a relembrar a gênese político-econômico do projeto que socialmente tem mais traumas que benefícios.
Se houver interesse, eu posso colocar nos comentários alguns dos links para artigos, a tese e alguns eventos de que participei que também trataram do tema, inclusive audiências públicas na Alerj.
Referências:
[1] Tese do autor defendida em mar. 2017, no PPFH-UERJ: “A relação transescalar e multidimensional “Petróleo-porto” como produtora de novas territorialidades”. Disponível no Banco de Teses do PPFH-UERJ: http://ppfh.com.br/tese/?arg=roberto+moraes+pessanha&tp=autor_a [2] Entrevista do blogueiro ao Instituto Humanitas Unisinos, Revista IHU On-line em 11 dez. 2015.
Infraestrutura logística portuária: O Estado cooptado pelo setor privado e a população à mercê do capital. Entrevista especial com Roberto Moraes Pessanha. FACHIN, Patricia e CHAVES, Leslie. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/550047-infraestrutura-logistica-portuaria-o-estado-cooptado-pelo-setor-privado-e-a-populacao-a-merce-do-capital-entrevista-especial-com-roberto-moraes-pessanha
[3] Artigo "O MIDAs numa conjuntura de crescimento do Brasil e crise econômica mundial: os portos transformados em complexos logísticos-industriais. Apresentado no 2º CONINTER – Congresso Internacional Interdisciplinar em Sociais e Humanidades, de 8 a 11 out. 2013 e publicado nos anais ISBN: 978-85-99703-74-8. Belo Horizonte, 2013. Autores: Roberto Moraes Pessanha - PESSANHA, R. M. et. ali. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/310107114/MIDAS-como-oportunidade-e-ameacas-para-os-impasses-da-logistica-numa-conjuntura-de-paradoxal-crescimento-do-Brasil-e-crise-economica-mundial-O-caso
[4] Postagem no blog em 23 out. 2017. Porto do Açu reforça-se cada vez mais como um enclave econômico. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2017/10/porto-do-acu-reforca-se-cada-vez-mais.html
[5] Postagem no blog em 10 de dezembro de 2017.
ISS das atividades portuárias: o caso de Santos e do Porto do Açu em SJB. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2017/12/iss-das-atividades-portuarias-o-caso-de.html
[6] Postagem no blog em 20 de abril de 2017.
A luta contra a desapropriação no Açu é Justa e vem desde 2009. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2017/04/a-luta-contra-desapropriacao-no-acu-e.html
[7] Postagem no blog em 8 de junho de 2017.
Agricultores do Açu conquistam em Audiência Pública, hoje na Alerj, forte apoio de deputados para suspender as desapropriações. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2017/06/agricultores-do-acu-conquistam-em.html
[8] Vídeo da Audiência Pública na Comissão de Direitos Humanos da Alerj sobre as desapropriações no Açu em 8 de junho de 2017: https://www.youtube.com/watch?v=XE8Csloh5zc
3 comentários:
Sempre em prol do fortalecimento da infraestrutura do interior fluminense e do Brasil! Excelente artigo, Roberto. Estou lendo os posts do blog com bastante frequência nesses últimos (assombrosos) dias de escárnio e quarentena que rondam nosso país. Seguimos!
Parabéns, professor! Seu blog é uma importante referência para a região Norte Fluminense. Em meio a tanta desinformação, como é bom ter um espaço assim na rede.
E já se prepara empreendimento semelhante do outro lado da divisa entre os estados, em Presidente Kennedy. É o projeto Porto Central (https://portocentral.com.br/pb/), que ocupará uma área de 20 km² e abrigará um complexo porto-termelétrica-manufatura-serviços. Os tempos não estão tão favoráveis a empreendimentos como esses, mas sabe-se quando a maré muda. Há que se estar preparado para fazer a devida crítica aos abusos. Marco A., Rio de Janeiro
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