Na quarta-feira (29/07), tratei do tema do capitalismo de
plataformas em entrevista na TV 247 sob o título dado pelo entrevistador como a
“economia dos apps” (Acesso aqui). Na ocasião
comentei que o assunto que envolve “as veias digitais”, deve ser abordado em
pelo menos seis dimensões, para a além da precarização e exploração repugnante
sobre do trabalhador de entregas a domicílio que o esquema “delivery”
escancarou com a chegada da pandemia. No Brasil, hoje, cerca de 5 milhões de trabalhadores
trabalham sob o controle das plataformas digitais, entre eles os entregadores.
Além da dimensão do trabalho, da individualização, da falsa
suposição do sujeito-empresário (Dardot & Laval, 2016), a do trabalhador
por demanda da “GIG Economy” ou “Economia sob Demanda”, devemos observar a
dimensão econômica da hiperconcentração (e centralização espacial das
plataformas-raiz); dimensão da financeirização, das startups e da appfifcação;
dimensão cultural das redes (societal e comunitário); dimensão espacial,
geoeconômica dos lugares escolhidos e dos lugares abandonados e a dimensão da
política e da tecnopolítica que avança assassinando a democracia liberal
ocidental.
Mais que uma plataforma de intermediação entre demandas,
produção e circulação (material, imaterial e financeira), o processo de
plataformização transforma a política e nos trouxe à realidade da
tecnopolítica.
Entre extasiados e espantados diante da explosão de dados e
informações a que somos expostas o tempo todo, essa arquitetura tecnológica das
chamadas Plataformas Digitais, agora descortinam também a enorme concentração do
poder político.
Com essa “hiperconcentraçaõ” se tem a formação e a oferta de
mais poder político para minorias endinheiradas, contra maiorias expressivas,
que são sufocadas e sofrem com o sequestro do esquema eleitoral fakenizado das
democracias liberais ocidentais.
Brexit, Salvini, Orban e Bolsonaro são exemplos desta
estratégia planejada pelo americano Steve Bannon. Bolsonaro chegou ao poder com
os conhecidos esquemas de pirâmide de robôs nas eleições de 2018. No cargo, a família
Bolsonaro transformou essa pirâmide de robôos eleitorais no “Gabinete do Ódio”,
com ligação direta com a Secom, no próprio Palácio do Planalto.
Assim, através das plataformas digitais das redes sociais, o
“Gabinete do Ódio” comandada por youtubers e blogueiros bolsonaristas têm
acesso às gordas verbas publicitárias, oriundas de fundos públicos, que
constituem a máquina de propaganda do BolsoMilitarismo.
Esse é um exemplo de como a tecnopolítica foi criando as
condições para para instituir uma democracia - que tenta se consolidar em que
minorias controlam a maioria que se volta, quase exclusivamente, para uma vaga
de ideia de liberdade individual como se vivêssemos sozinhos no mundo.
As democracias não morrem, elas são assassinadas pelo poder econômico cada vez mais empoderada
Ao contrário do que levantava Steven Levitsky em seu livro ao
afirmar “que as democracias morrem, a partir da leitura da tecnopolítica, já é
possível afirmar que as democracias liberais ocidentais, estão sim, sendo assassinadas.
Na verdade trucidadas pelas milícias digitais sustentadas pelo mesmo poder
econômico que organizou o capitalismo de plataformas que trouxe à essa enorme
concentração econômica.
Uma oligopolização do uso das veias digitais controladas
pelas plataformas-raiz (5 Big Techs: Apple, Google, Facebook, Amazon e
Microsoft) com vínculos com o “Deep State” (estado-profundo) estadudinense, que
vão bem além dos trustes e dumpings econômicos.
Sugiro que leiam o livro “Engenheiros do caos” editado em
2019 no Brasil, do francês Giuliano Da Empoli que atua num grupo de pesquisa
“Volta” em Milão sobre o qual fiz brevíssima resenha no blog (acesso aqui), já estimulando a leitura sobre o que vem a ser a
tecnopolítica com descrição detalhada de seu avanço sobre até então algumas
democracias liberais no Ocidente.
A política e suas instituições eram espaços (de certa forma
também plataformas) nas democracias liberais, onde os conflitos e interesses de
classes eram confrontados e, a partir de maioria direta (eleições) ou indireta
(por representações nos três poderes organizados sob a forma de Estado)
definiam rumos de partes (estados-nacionais) dos cidadãos.
Só que entre a dimensão digital e a dimensão física da
política real, a plataformização dos negócios transforma a política num
problema e não numa forma de intermediação de diferentes interesses na
sociedade.
A tecnopolítica nos jogou nos guetos dos grupos isolados em
bolhas que não dialogam entre si e que repulsam o contrário que era,
exatamente, o espaço da mediação, da busca de acordos ou da disputa pela
maioria, através da ideia dos “campos” na concepção do sociólogo francês Pierre
Bourdieu.
Nesse vácuo que reduz e aniquila as instituições democráticas
se cria o caldo onde a tecnopolítica produz a figura do antistableshiment. Com
ela se controla o poder político e assim amplia os tentáculos da plutocracia,
com governo dos ricos e para os ricos.
A tecnopolítica vetou a política agora chamada de
tradicional para susbstituí-la pelos algoritmos que disputam a maioria, alimentam
os guetos (zumbificação) e definem os rumos pelas novas maiorias obtidas
diretamente pelo poder econômico da técnica dos robôs, na superficialidade da “memificação
da política”. Fenômeno que pode ser facilmente percebido com a formação e
atuação da rede digital bolsomilitar no Brasil.
A ilusão da “ágora digital” que nos reaproximaria de uma
democracia direta, mediada pela internet e pelas plataformas, está sendo
exposta como inviável. Os controles exercidos pelos oligopólios gigantes da
tecnologia do ocidente (Big Techs), dominam as veias digitais, hoje de forma
escancarada (e não mais escamoteada), exercendo o poder político por cima de
partidos e instituições, que no mundo real se fragmenta cada vez mais entre
guetos e bolhas, onde as massas ampliam sua raiva, seu ódio e sua revolta.
A dimensão da política não cabe nessa “arquitetura modular
de negócios” entre demanda e produção do capitalismo de plataformas. A política
é o coração da vida civilizada em sociedade. Fora daí continuaremos a caminhar a
passos largos, para uma nova rodada de fascismo (já em curso), em direção à
barbárie, em que pese os bárbaros terem sido menos bárbaros, do que aquilo que hoje
já nos ameaça, sem que a maioria se aperceba.
Compreender essa realidade pode nos ajudar a transformar o
caminho que a tecnopolítica está induzindo a civilização ocidental central no
norte e também a do capitalismo periférico tardio, em sua maioria localizada no
sul global.
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