A China em seu socialismo de mercado (outros chamam de capitalismo de Estado) abriu espaços para o setor privado no setor imobiliário e de alta tecnologia e assim produziu um colossal crescimento econômico, em meio ao aumento da especulação, enlaces e cruzamentos desses setores com o mundo das finanças que também fez surgir muitos enriquecimentos pessoais.
O projeto chinês desembocou em processos de expansão da
economia para dentro (reduzindo pobreza) e para fora que gerou uma potente e
crescente integração global. A propriedade (imóveis e dinheiro) e a tecnologia,
desenvolvidas a partir de políticas do Estado, foram de maneira paulatina e
consciente, entregues à iniciativa privada através de empresas que adiante se
transformaram e ganharam a condição de conglomerados e gigantes corporações.
Essa estratégia gerou um cenário de colossal crescimento
econômico, mas também produziu muitos riscos, decorrentes das inovações financeiros
(papeis) e lançou ao mercado dezenas (talvez centenas) de bilionários
individuais. Casos do Jack Ma (Alibaba), Xu Jiain (Evergrande Real Estate Group)
e Ren Zhengfei (Huawei) entre outras dezenas
ou centenas. Junto, tudo isso agora se apresenta como ameaças e como desafios.
Não é uma tarefa simples regular estes setores da economia
que ajudaram a China a crescer neste século, acima de 10% ao ano na primeira década
e quase 8% (em média) na 2ª década. Hoje, o setor imobiliário responde por algo
em torno de 29% do PIB da China. Já o setor de alta tecnologia de internet, redes
e plataformas digitais, através de suas Big Techs - em alguns casos maiores que
suas congêneres americanas – transversalmente, se tornou meio (condições gerais
de produção) indispensável, a todos os demais setores da economia chinesa em
suas múltiplas conexões intranacionais e global.
Também transversalmente, mas de forma potente, foi exatamente
no interior destes dois setores (imobiliário-urbano e tecnologia), que a
financeirização se imbricou desde os últimos anos dos anos 90. Sofisticadas inovações
ajudaram a produzir uma “expansão desordenada do capital”, vinculada à ideia-mãe
de transformar quase tudo em gestão de ativos, com a lógica majoritária do
valor de troca (especulação), mesmo que enlaçada ao desenvolvimento da economia
real e da produção com valor de uso que atrais massas enormes dos vilarejos do
interior para as grandes cidades.
No processo de desenvolvimento da China há ainda que se
observar a realidade do seu federalismo e relações com o planejamento e a
gestão estatal. Assim como em outras nações, trata-se de uma complexa distribuição
de responsabilidades entre o governos central, os provinciais e os locais,
tanto em termos de arrecadação de tributos, composição de fundos públicos,
orçamentos e investimentos, quanto na provisão dos gastos para manutenção da
infraestrutura e equipamentos públicos.
Essa questão federativa tem, aliás, profunda relação com as
questões que atualmente emergem no setor imobiliário-urbano (construção
habitacional e comercial) na China, em que pese o fato de que hoje, as
questões-chaves da China pareçam, em boa medida, mais setoriais e
intersetoriais (órbita da nação), embora com profundas conexões matriciais com
o território e com o desenvolvimento regional e locais, onde vivem as pessoas e
se desenvolvem os problemas da sociedade chinesa, em seus locais de trabalho,
moradia e vida
Porém, também é real, o fato de que o governo chinês dispõe,
como nenhuma outra nação no mundo contemporâneo, de recursos, instrumentos e
capacidades institucionais estatais e políticas para superar as ameaças e os
desafios expostos. Será necessário ainda mais planejamento para enfrentar a conhecida
crise cíclica do capitalismo, hoje hegemonicamente financeiro, que alcançou os
meandros e interstícios da economia chinesa, mas também é certo que isso demandará
poupança interna que antes tinham sido planejados para uso em vários
megaprojetos dentro e fora da China.
A história seguirá seu curso diante das ações e dos
movimentos dos agentes na sociedade. O mundo acompanhará a implantação, já é
curso, da denominada “transição para a prosperidade comum”, política (mais que
programa e projeto) do governo chinês (e PCC), observando como serão
administrados os interesses nacional e geopolíticos em suas dimensões e escalas.
Em síntese, o esforço da China é o de construir uma ponte que salte sobre o pântano da armadilha da financeirização - fortemente imbricada nos setores imobiliários e de alta tecnologia - para um desenvolvimento que mantenha as atividades econômicas, mas continue a garantir a elevação do bem-estar da população chinesa. Um baita desafio, muito além do debate ideológico.
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